Cabelinho de espeto
Do nada apareceu essa menina em casa. Minha mãe disse que achou. Meu pai, que era dono da casa e do dinheiro aceitou. Chegou pequena. Não era minha irmã com certeza. Eu branco desse jeito e ela moreninha, narizinho chato, cabelinho de espeto.
De todo modo foi assim, minha mãe sumiu uns dias. Meu pai quase morreu de tristeza e desespero. Ligou pra hospital, corpo de bombeiro, tudo quanto é parente ele falou. Não dava mais pra aguentar aquele desabafo dele. Chorando igual criança no quintal até escurecer. Achei tão feio um homem chorando. Nunca tinha visto. Depois de uma semana minha mãe voltou. Abatida e com essa menininha no colo. Meu pai ficou estranho, rindo de alegre e dando soco no sofá. Mesmo assustada minha mae entrou com aquela trouxinha no colo.
Não foi pro quarto dela. Entrou num outro que tinha nos fundo perto da cozinha. Meu pai não foi atras. Ficou na sala com os olhos marejados e apertando uma mão na outra bem forte. Depos de um tempo de porta fechada ela saiu e me chamou no cantinho. Essa é Estelinha, linda né? Eu achei ela no pátio do colégio, vamos ficar com ela. Tem que gostar dela, tá bom? . Acenei a cabeça que sim. Porque não gostaria? Que maluca minha mãe.
Meu pai chega do trabalho e vai direto pro quarto, fica deitado la, parece doido, sem motivo nenhum. Nem briga teve e nem dorme mais no quarto de minha mãe. Ela fica lá sozinha a noite toda. Passo pela porta do quarto. E vejo ela no canto deitada de bruço perto da parede e o nenezinho no outro lado com as maozinhas pra cima e olhinhos procurando.
Ela deveria estar alegre. Sempre falou que queria uma menina. E conseguiu assim, quase sem esforço. A casa era até alegre, meus tios e meus primos estavam sempre por aqui. Nunca mais ninguém apareceu. Quase todo dia minha mãe me levava pra comer na casa da minha avo, que mora no fim da rua. La ninguém conversava muito com ela. quando sentava a mesa, chorava perto do prato, água molhando o arroz. Parece maluca. Falo pra ela o que está acontecendo e ela me da um sorriso todo amarelo.
Nem falo mais nada. O bebezinho até que é bonitinha. To comecando a gostar dela. só minha mãe pega ela. Meu pai nunca pegou. Deve ser porque tem medo,. Criancianhas assim é fragil. Acho que ele tem medo de pegar em criancinha pequena. Normal, eu também tenho. Um dia pedi minha mãe pra pegar ela no colo. A gente estava indo pra casa da vovó. Comecou chorar. Nossa. Minha mãe é maluca, ou gosta demais do bebê. Pois quer ficar so pra ela.
Nem gosto quando chega a noite. A única pessoa que fala em casa, e do jeito dela, é o bebê. Quando ligo a televisão meu pai grita que quer dormir, e minha mãe nem fala nada. Antigamente quando ele me ralhava ela vinha logo me defender. Agora não.
Ele manda em toda a casa e ela com a cara inchada.
Um dia num final de semana chegou em casa seu Antonio Pedreiro. Construiu uma parede na porta que dava ao corredor. A casa ficou dividida em duas. E abriu uma porta na parede lateral, que dava pro muro. Podia sair pra rua também pela parte dos fundos. Por um lado fiquei feliz. Eu tinha duas casas. Mas de verdade não entedia nada daquilo. Eles nem se falavam mais.
Eu acho, nem tenho certeza, mas creio que meu pai não consegue dormir com barulho de bebê, as vezes até eu me atrapalho. Ele tem o sono leve. Só pode ser isso.
Mas eu vou falar uma coisa pra voces. Sinceramente se eu ver um bebezinho na rua não vou pegar não. Minha vida ficou muito diferente. Eles ficaram muito pertubados só por causa disso. Se não queria deixasse a Estelinha no pátio. Alguém pegaria. Eu acho.