Surpresa
Aquela notícia surgiu como uma bomba, estilhaçando vidraças, derrubando paredes. Algo que absolutamente não esperava, algo que se impunha por sua própria força. A partir daquele momento, aquela realidade o acompanharia, aonde quer que fosse.
Acordou tarde, levantou-se depois de um longo espreguiçar, fez um lanche leve e saiu para a academia. Procurou espairecer, contemplar a cidade que se debruçava numa onda de calor, as pessoas que comiam sorvetes, os executivos que passavam apressados. Hora de almoço, pelo menos para a maioria. Seus passos atravessavam as ruas familiares, mas tudo tinha um quê de estranho. Como se carregasse pelo caminho um corpo que não era o seu.
Assim como foi, voltou. Mais cansado, depois de um bom período de exercício. Com a ideia plantada lá no fundo, ideia que por vezes outros pensamentos conseguiam espantar, mas por pouco tempo. Por que não cortar pela raiz? Havia outra vontade que se opunha, e ela era preponderante no caso.
-- Tudo bem? E a faculdade?
Sorriu para o senhor que entrara com ele no elevador do prédio. Sorriu sem resposta, pois já havia abandonado o curso. Aliás, o segundo. Sem motivação para continuar. Assim como acontecera com o primeiro emprego – simplesmente abandonado. Despistou, felizmente chegava ao seu andar.
Precisava de um banho. Foi o que disse ao pai, na curva do corredor. E seguiu sem olhar para a mãe, reto para o banheiro. Logo eles iriam saber. Aquele ente estranho que parecia remoer as suas próprias entranhas. Aquela realidade que ele não conseguia distanciar. Abriu o chuveiro ao máximo e deixou a água escorrer. Reviu Maristela na sua frente. Maristela com uma cara entre preocupada e feliz: “Vamos ter um filho”. E ele, que jamais pensara em ter filhos, tinha ficado olhando-a, abestalhado, sem palavras e sem ação.