RECORDAÇÕES

Sentada na cadeira de balanço estava a velha senhora pensativa e solitária.

Balançava suavemente a cadeira sem sentir os movimentos. Seu pensamento estava longe do seu corpo, da sua ação.

Da varanda onde se encontrava tão absorta, parecia ver a doce e meiga menina de longas tranças e sardas no rosto rosado, correndo no vasto campo verde e macio ao lado de seu companheiro de travessuras, um menino moreno de grandes olhos castanhos.

Podia ouvir com nitidez seus gritos de alegria infantil. À sua volta, lindas flores silvestres e o ar puro e saudável, ainda existentes nas fazendas.

Haviam brincado juntos desde a mais tenra idade.

Era uma amizade infantil, mas que podia-se perceber em seus olhares que em breve se transformaria num sentimento mais forte.

Agora via diante de seus olhos cansados, a mesma menina de tranças e sardas transformada em mulher esbelta e delicada em seus dezoito anos.

Seus olhos estavam perdidos na estrada, esperando alguém muito importante para ela. Alguém que há muito tempo não via: o menino moreno de grandes olhos castanhos e ar travesso. Ela sabia que não surgiria diante dela o menino, mas um homem feito que ela nem podia imaginar a sua atual aparência.

Logo ouviu o barulho débil do motor de carro dos anos vinte.

Sentindo o coração acelerar suas batidas, esperou ansiosa.

Ali estava diante dela o rapaz forte e lindo, com o mesmo ar travesso no semblante simpático. Ele tinha agora 22 anos.

Juntos caminharam em silêncio, com os corações repletos de amor.

Pouco tempo depois desse encontro, com a presença apenas de parentes e amigos íntimos, era realizado na capela da fazenda o seu sonho de amor eterno.

Passaram-se os primeiros anos de feliz união. Parecia que toda a felicidade do universo estava naquele lar maravilhoso.

Não tiveram filhos, mas souberam superar esta falta com tanta dignidade que nada mudou entre eles.

Veio a guerra e com ela a destruição inevitável.

Ele partiu para nunca mais voltar.

Ela ficou somente com as mais belas recordações e a tristeza estampada em seu rosto singelo.

Jamais abandonou a fazenda onde viveu com ele tanta felicidade.

Agora estava sentada na sua antiga cadeira de balanço, em movimentos suaves, com o olhar perdido no verde dos campos e o pensamento voltado para o passado tão distante. Um passado que lhe havia deixado tão belas recordações, mas que havia também tirado bruscamente a sua alegria de viver.

Mas após tantos anos aprendeu a conviver com a resignação.

Sentia-se feliz novamente, pois agora sabia que em breve estaria ao lado daquele que tanto amou e que sabia estar esperando por ela em algum lugar do universo, ainda mais maravilhoso que a sua querida fazenda. E então estariam juntos para sempre, para continuarem a felicidade que havia sido interrompida bruscamente um dia.

Julieta Bossois
Enviado por Julieta Bossois em 14/04/2011
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