Fundo da América do Sul Parte 5
CONTATO COM O VIZINHO
...Em uma manhã de dezembro de 1978
Havia um vizinho na frente de casa que era um tanto diferente, ele era uns dez anos mais velho que eu; todos falavam que ele era subversivo! Não tinha a menor idéia do que aquilo queria dizer! Achava bonita aquela palavra!
Sabia que ele era contrario ao regime militar que imperava na época, que estava sempre fazendo discursos notáveis em praças públicas, distribuindo panfletos alegando que queria clarear a mente das pessoas! Não entendia o seu propósito, foi quando um dia ele estava saindo com muita preça e todo espiado de sua casa, tomei coragem e fui conversar com ele...
- E ai Vitor, tudo bem?
- Olá Marcus como tu estas?
- Tudo bem comigo, queria conversar contigo, pode ser?
- É que estou saindo de viagem, mas, em que posso te ajudar?
- Bem, todos falam que tu és diferente, não me entenda mal, é que acho estranha tua maneira de encarar os problemas sociais, não vejo ninguém se preocupando como tu! Parece que tua bandeira é diferente de todo mundo! Ninguém gosta de falar tão abertamente sobre assuntos que parece tão proibido, gostaria de saber o que se passa pelo País que estou começando a querer entender!
- É difícil alguém na tua idade já se preocupar com esses assuntos! Mas estamos passando por um período bem conturbado no País, pega uns informativos para ler e esse decalque aqui, ele era todo preto tinha a palavra “anistia” e ao lado dela um círculo vermelho, hoje não tenho muito tempo para conversar contigo, pois estou indo para o Uruguai, passarei uns dias por lá! Estou um tanto enredado por falar de mais; escuta, tu não quer ficar cuidando da minha casa enquanto ficarei ausente? Assim não me preocuparei com minhas plantas, que gosto tanto, e estarei tranqüilo que ninguém vai invadí-la?
Adorei a idéia, mas tinha que perguntar para meu pai, pois não nos conhecíamos muito bem, mas ele insistiu e disse:
- Marcus, se eu não voltar, pode ficar com meus pertences, e já que queres saber sobre o que esta acontecendo, lê os meus livros e escritos, só os livros irão te abrir a mente e a maneira de pensar correto, não acredita em tudo que passa na televisão e nos jornais, é muito fácil manipular as pessoas através deles; lê, lê muito e depois terás tuas próprias conclusões, os livros te dirão o que tenho em mente e como gostaria de mudar o País, mas no momento estou só e em perigo, o sensato no momento é me retirar da batalha para esperar e poder lutar na guerra quando ela estiver fortalecida com pessoas esclarecidas que queiram mudar as coisas; pega as chaves por favor cuida das minhas plantas, me deu um abraço apertado como se fosse um adeus, pois não tinha ninguém para dá-lo, então resolveu dar em mim!
Saiu olhando para todos os lados deixando cair uma mochila e pegando de novo muito nervoso com o passo acelerado, dobrou a esquina e fiquei olhando para a rua sem entender muito bem tudo aquilo. Olhando as chaves na mão pensei que seria muito legal cuidar da casa dele, principalmente que poderia fazer os ensaios da banda ali, as namoradas, tragos, festas, estava realizado, e meus pais iriam adorar a idéia de não ensaiarmos mais em meu quarto! Aquele maldito rocking roll, como dizia meu pai!
Naquela mesma noite vi um simpala preto, com vidros escuros rondando a casa do Vitor, por horas, passava bem devagar na frente da casa e dava uma parada na esquina um homem descia vinha até a frente da casa bem devagar olhava para ver se via algum movimento lá dentro, acendeu um cigarro agitou a mão para apagar o fósforo e com o polegar e o anelar atirou para dentro do pátio, limpou a garganta e voltou para o carro; escondi-me atrás da cortina, comecei a entender todo aquele temor do Vitor à tarde. Minha mãe chamou-me para jantar, fui bem quietinho como que pisando em ovos!
Na mesa contei para meu pai o acontecido, ele ficou bravo comigo por que não poderia ter ficado com as chaves da casa de um estranho, ainda mais se tratando daquele vizinho, era perigoso de mais.
Minha mãe disse:
- Não dê bola filho, daqui a alguns dias ele esquece!