A SANTA

Vinte horas e trinta minutos, subiu ao palco Tereza, acendeu seu cigarro de palha, deu umas tragadas, disse que está trajada de preto e branco não por homenagem corinthiana, por ser santa virgem, do convento Jequitibá, da cidade de Arujá, por lá conhecida como Santa, mas não virgem de Calcutá.

Como toda beata, também é piadista, tendo anedotas na cabeça tanto quanto os cabelos tiriricas. Sou faceira e da mesma forma roqueira, não tenho medo de afrontas, pois resolvo tudo é na peixeira.

No último palco que subi, tinha mais de cinco mil pessoas, foi uma noite muito boa, pois bêbada fiquei e cai da escada, sorte desta que sobre braços d’um rapazote, mas como beata não perco o rebolado, endiabrei-me toda e despi o verbo.

E dentre tantos pessoas que por lá apreciava o show, convidei um senhor, apontando o dedo, venha cá, quero tirar seu couro e se você não subir neste palco cubro-te de taca e sopapo.

Raimundo levantou o braço direito, e a beata disse, é tu mesmo, cabra que quero despeitar, suba cá depressa. Rapidamente subiu ao palco, beijou a mão direita da beata, olhou fixamente aos olhos e disse; madre se você quer um homem, agora tem um a sua disposição, pois comigo é diferente, sou cabra do sertão, terra de compadre Virgulino, sou ferro em brasa, não sou dentista, mas com um murro que dou, arranco até o juízo dos dentes.

Madre Tereza: Convidei-te numa boa, não queiras cantar de galo, tu daqui terás lição, se é compadre de Virgulino, saiba que Maria Bonita é minha irmã do meio, não venha com lorota que te faço virar broca, emboco sua cabeça numa caçarola, dou açoite de vara, faço seu corpo virar peneira com os tiro de minha cartucheira, pois sou mulher pura, santa imaculada.

Raimundo arregalou os olhos, arregaçou as mangas da camisa; madre tu podes dizer o que pensa, mas saiba que em meu couro nada entra, pois sou devoto de padre Cícero do Juazeiro, o qual concede virtude, meu corpo é todo revestido de aço, e aqui sua faca será desfeita, vou te dizer com franqueza, que nesta noite você encontrou um homem, que não só tem gogó, e sabe desatar qualquer nó, pode arrepiar o lombo que hoje vou descobrir, tirar este teu manto preto, socar te sem ter dó, e, se você ainda tiver quaisquer duvida arrio as “carça” e mostro meus dotes que é um só.

Camarada é afoito, sabe melindrar as palavras aqui deixarei seu couro, mostrarei para toda este gente, mesmo que esteja de couraça de aço, inda furo seus olhos com meu “bodoque”, e caído ao chão dou lhe surra de chicote, recomendo sua alma ao Altíssimo e a Ferrabrás, deixando a eles o que fazer, pois você não me engana, credo cruz Ave Maria, arreda-te daqui Satanás.

Ó santa madre, d’onde tiraste tantas maldades, sou trovador como tu, e no Máximo o que faço em ti, é te entupir de angu, sou religioso também, mas d’outra forma vindouro, comigo não tem embaraço, ao chegar ao céu, o altíssimo compreenderá, dará autoridade para no inferno ir buscar, Ferrabrás e a este imputar ir a terra sua procura, mulher de saia escura, colarinho branco de alvura, esta sim ao purgatório levar.

Mas hoje farei engolir as entranhas, não venha você pensar que sou louca, tão pouco mulher atoa, pois vamos mudar logo o assunto, e não deixar o povo encabulado trate apenas de responder o que vou perguntar.

Nisso ouve o murmúrio da platéia, salvas de palmas e risos contagiantes, e o grito lá do fundo, arrasa madre de saia.

Raimundo avistou aquele povão depois retrocedeu o olhar para a beata e disse; com clareza, diga cá santa virgem, faça sua pergunta, responderei a altura, posso ser pobre de repente, mas não sou nenhum descrente, mesmo que em minha terra não haja enchente não vou deixar ninguém aqui descontente.

Camarada tu me enches, mas aprecio a sua coragem, irei te testar se realmente é gente, vamos ver como vai se sair, dizendo para todos aqui ouvir, nomes de pessoas com as iniciais de nosso alfabeto.

Não seja por isso, vou dizer até sorridente, pois comigo não tem embaraço e da cana como até o bagaço e respondo com convicção que com a letra A escrevo; Apolinário, Afonso e Afeganisteu, entre tantos outros me simpatizo com o nome de Arineu, mas não quero deixar-te abalada, vou dizer da letra B, Bartolomeu e Baltazar. Carlito, Carmem e Custódia. Delmiro, Deodato, Diego, e assim sucessivamente, não tenho perrengues para nome, vou partir direto ao Q, que de tão franzino que é estive lá perto da casa da peste onde encontrei um casal; Quirino e Quitéria, me serviram um “xenxém” feito por sua criada, mas vou além, pois não quero ficar por desdém, que por minhas andanças neste país afora, encontrei Xenefone, Xisto e Xerces, cantarolando emboladas no sertão do nordeste, e inda por estadia em Garanhuns passei na casa de Zorobabel, filho de Zaqueu irmão de Zimbaldo e tio de Zacarias e garanto a você, que tudo isso é bonança, garanto-me em mais nomes, se a beata se opuser, mas cá creio que queira outra pergunta fazer, cá então estarei para responder.

Danado este Raimundo, é afoito e sapeca, quer nos deixar sem jeito, aprecio a sua resposta, quero que saiba que na minha santificação, fui condizente com o sagrado, benzida por todos os padres e tida de maestria, sou freira até mimada não tenho desdém por ninguém e nem queira dizer o que não convém. Rezo por todos e pito o meu cigarro faço desgraça alheia quando aborreço, mas não desmaio, mas cá amigo cantador, é chegado o momento de dispor a ti meu saudoso abraço, obrigado por ter tido comigo, ao público presente este é nosso agrado.

Foi um prazer ter tido contigo, não sou leão enjaulado, mas senti-me paróquio onde cá nem ganhei nem perdi, me disponho para ti, convide-me sempre e sempre antes de partir e ao público presente, meu muito obrigado. Desceu do palco, Raimundo da Silva, filho de lavrador, repentista nos arranjos e nobre homem cortejador.

De cima do palco beata conduz com voz firme; vou deixar esta labuta, deixarei as vestimentas cair, e mostrarei a todos os meus bíceps, por meus adereços, talvez um ou outro me tivesse por mulher, que de louca não tem é nada e de mulher mais ainda, na verdade sou Romeu Fialho Pinto. Peço meu muito obrigado e espero sempre tê-los comigo. E para onde fores leve me consigo.

Nisso em um só coro, mil e um aplausos, viva madre Teresa, que suba mais vez para nos alegrar, viva madre Teresa, a qual sabe nos contentar.

Heronildo Vicente
Enviado por Heronildo Vicente em 28/03/2011
Reeditado em 28/07/2011
Código do texto: T2876335
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