AFLIÇÃO ETERNA

Uma alma perdida vagava por uma cidade deserta.

- Onde estou? - Continuou, então, a vagar observando o ambiente ao seu redor que além de desertado estava todo destruído. Aquele lugar aparentava ser familiar, mas não conseguia lembrar o porquê deste sentimento. Pois a cada vez que tentava recordar se esquecia ainda mais.

Sentiu então uma angústia, e também não entendia a causa desta. Até que uma voz surgiu, mas não podia reconhecê-la e nem achar o dono seu dono.

- Eu avisei. - Era um tom suave e benévolo, que espalhava, a princípio, bondade e amor.

- Quem é você? - Ele falou com um pouco de medo, pois a voz do dono era forte e segura. - E o que você avisou? - Disse quase miando.

Não houve resposta.

Sua visão estava um pouco turva, andava tropeçando no que um dia veio a ser telhado, parede, janela, porta e etc. Algumas casas estavam completamente destruídas, outras estavam à beira do desabamento. Continuava sem entender tudo aquilo, mas tentava interpretar o que havia acontecido.

- Deve ter ocorrido uma guerra. Há sinais de fogo e tiro. - Quando dobrou uma rua ficou parado por alguns segundos, pois enxergava uma figura que concretizava sua teoria.

- Um Tanque de guerra! Mas o que o houve neste lugar? O que eles queriam a final de contas? - Então acelerou um pouco os passos em direção ao tanque, e chegando perto viu que estava queimado. Tudo reduzido a carbono.

- Quem está aí? Porque estás fazendo isto comigo? - Aquela cena era incomum, quando morresse não tinha certeza do que aconteceria consigo. Sempre ouviu falar de uma diversidade de opções após a morte, mas não queria acreditar em nenhuma, pois se precisava de muitas renúncias e isso era relativo.

Não gostava daquele lugar, ele lhe causava arrepios. Os únicos sentimentos eram de angústia, dor e ódio. Estava ficando furioso por aquilo, se pudesse acabaria com tudo naquele momento.

- Eu te dei todo o direito de vida, mostro-te o melhor caminho, e olha o que tu fizeste contigo e com os teus companheiros - a mesma voz apareceu, mas desta vez ela saiu como um trovão.

- Deus, és tu? - palavras temerosas saltaram da boca daquela alma cinzenta. E de novo não houve resposta. - Mas eu não fiz nada de ruim, não me recordo de ter feito algo abominável. E tu me julgas sem dizer-me meus pecados? Não fostes tu quem morreu na cruz por mim? - Uma dor insuportável, onde antes deveria ter um coração, o fez cair no chão e relembrar dos acontecimentos de sua vida, onde agora aquela alma abatida pelo sofrimento era a espectadora.

Primeiro seu nascimento, um parto difícil, todos emocionados ao ver aquele bebê tão pequeno chorando, um menino. Agora ele já havia crescido e jogava futebol na rua com os garotos da vizinhança. Na adolescência saía de casa escondido para encontrar-se com os amigos. Quando maior de idade estava numa entrevista, de emprego, e havia sido aceito. Algum tempo se passou até o dinheiro tornar-se seu deus. Até que chegou a um alto cargo, ele era quem mandava e desmandava. Pessoas de classe menor protestavam contra a desigualdade, até que começou uma rebelião e logo uma guerra. Todos foram devastados, sem nenhuma exceção. Tudo por dinheiro.

Agora ele encontrava-se no mesmo local, deitado e chorando, lembrava-se de todo o ocorrido que o levou até ali. Agora refletindo que nunca parou para pensar em Deus, no fim de sua vida e muito menos no de outras pessoas.

- Eu avisei - Disse Deus de novo - Todos os dias de suas vidas eu falava com vocês, mas sempre me rejeitaram. Sacrifiquei meu filho por vocês e continuaram a me negar. Hoje vos digo: - Apartem-se de mim malditos, vão para o fogo eterno. – Naquele momento começaram a aparecer várias outras almas, era como se elas estivessem ali durante todo o tempo. Umas estavam deitadas, outras sentadas e algumas cambaleando em pé. Todos começaram a chorar, havia muitos familiares, mas ninguém se reconhecia.

- Este foi o vosso julgamento e começo da segunda vida. - A voz esbravejante desapareceu, e em seu lugar veio outra agonizante que zombava de todos. Começou um vasto desespero. Muitos se precipitaram a correr tentando escapar, mas não conseguiram, pois cada alma foi capturada por no mínimo três vultos pretos que riam e carregavam objetos para causar sofrimentos em todos que ali se encontravam.

Talita Valéria
Enviado por Talita Valéria em 28/03/2011
Reeditado em 25/10/2011
Código do texto: T2875789
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