Já se conheciam, mas não eram amigos, não ainda. Acho até que havia algum grau de parentesco entre eles, talvez primos de último grau.
Amy tinha apenas sete anos, era uma menina muito simples e sem traços marcantes, mas isso lhe dava uma beleza natural e ao mesmo tempo exuberante. Sua mãe estava sempre muito ocupada e seu pai estava sempre viajando a trabalho, ela nunca sabia pra onde, mas sabia que isso lhe dava mais liberdade para brincar lá fora, apesar de não ter muitas amigas.
Zady estava perto de completar dez, era esperto pra sua idade, mas era sempre acompanhado do olhar atento de sua mãe, que sempre o deixava brincar lá fora, mas com pessoas e horários pré determinados. Ele, que já frequentava a escola a mais tempo, tinha muitos amigos, mas sua mãe não gostava de vê-lo brincando com meninas.
Encontraram-se numa festa onde todos comiam, dançavam e falavam muito alto. Então sentaram-se num canto da sala e começaram a conversar, não sei sobre o que falavam, deveria ser sobre coisas de crianças. Os olhos dele a fitavam com grande admiração, mas Amy apesar de ser uma menina inteligente não percebeu o jeito que Zady a olhava. Nesse dia, nenhum adulto se atentou aos dois, tampouco a amizade que ali se iniciara.
Moravam no mesmo condomínio, suas casas eram um pouco distantes uma da outra, mas passaram a frequentar o mesmo playground, que ficava no meio do caminho entre a casa dos dois e longe da vista de seus pais.
Certo dia, a mãe dele passou e viu os dois brincando juntos em um dos brinquedos do parque e o mandou pra casa dizendo:
- Filho, o que os pais dela ou as pessoas do condomínio diriam se vissem a menina brincando a sós com um menino e ainda por cima mais velho que ela!
Ele despediu-se de sua amiga com um rápido aceno de mão e foi embora com sua mãe e Amy ficou brincando sozinha, afinal, seu pai estava viajando e ela tinha mais liberdade. Zady ao deitar-se pensava nela, tentava não fazê-lo, mas nesse dia não conseguiu tirá-la do pensamento, porém logo adormeceu.
No dia seguinte, na escola, pegou-se pensando nela novamente e então resolveu escrever-lhe uma carta, na qual dizia quanto a amizade entre os dois era importante pra ele. Quando terminou de escrever a carta, guardou-a no bolso e ao chegar em casa foi logo andar de bicicleta pelas ruas do condomínio, ao passar pela rua da casa de sua amiga avistou-a brincando na calçada de sua casa, então parou a bicicleta e entregou a carta rápida e discretamente e foi embora.
Amy não respondeu a carta, mas ficou imensamente feliz ao descobrir que tão boa amizade era importante pra ele também. As correspondências tornaram-se cada vez mais frequentes e apesar dela nunca responder, agradecia e elogiava-o sempre que se encontravam pra brincar no parque, longe dos olhos da mãe dele.
Quando estavam juntos, ele sempre a abraçava com carinho e mais frequentemente do que o necessário, pegava em sua mão com firmeza como se quisesse prendê-la a seu lado.
Um dia ele disse à Amy que gostaria de passar mais tempo a seu lado e ela, que apesar de ser mais jovem que ele, explicou-lhe inteligentemente que não era possível, pois de manhã cada um ia pra sua escola, ao chegar faziam os deveres de casa e que não podiam sair à noite pra brincar, então só lhes restavam aquele horário vespertino para estarem juntos.
Amy também desejara poder passar mais tempo ao lado dele. O tempo parecia parar quando estavam juntos a brincar de bicicleta ou quando deitados na relva verde esmeralda contemplavam o céu e suas nuvens com formatos malucos que fertilizavam a imaginação.
Mas no fim, os dois sabiam que o prazer da companhia ia-se embora no fim da tarde, assim como o Sol que insistia em pôr-se no final de cada tarde. Então iam embora pra suas casas, mas não se distanciavam, pois seus pensamentos continuavam conectados.
Amy era carente de atenção e afeto, pois não tinha muitas amigas e nem irmãos, seu pai estava sempre viajando e a mãe estava sempre muito ocupada para dar-lhe atenção.
Crianças nessa idade não costumam ter preocupações, mesmo assim, quando os dois estavam juntos, pareciam se desligar do mundo à sua volta, parecia que o tempo realmente parava. Eles conversavam sobre os passeios de bicicleta, sobre a vida dos insetos ou sobre o vôo das aves gigantes... e quando davam por si, já era hora de irem pra suas casas.
Amy sempre temia que a mãe de Zady os visse juntos novamente, aliás, ela temia isso muito mais do que ele mesmo. Se ele levasse uma bronca ou ficasse de castigo por sua causa, ela não se perdoaria e isso fez com que ela repensasse essa amizade proibida e decidisse por distanciar-se de Zady, deixou de ir ao playground no mesmo horário que ele e evitava os encontros de modo a não receber mais suas cartas.
Ao perceber a mudança de comportamento, Zady a procurou e questionou acerca de sua mudança, queria saber o porquê dela se afastar daquela forma repentina, mas teve que se contentar com a simples resposta de que “era melhor assim”.
Ele não a via mais no playground nos fins de tarde, que agora tornaram-se frios, devido a chegada do inverno, ele passou a andar de bicicleta sozinho pelas ruas do condomínio enquanto Amy brincava também só, hora em sua calçada, hora no parque em que outrora compartilharam ótimos momentos.
Zady nunca entendera muito bem o que a levou a agir assim, mas em respeito ao grande carinho que tinha por Amy, aceitou sua decisão. Mas guardou em sua mente e em seu coração as lembranças das tardes de verão que passou ao lado daquela amiga que tão bem lhe fez. Pois como sua avó lhe ensinara: a vida é feita de lembranças e relembrar é viver. Ele sempre ouvia uma música que dizia: “todo sopro que apaga uma chama, reacende o que for pra ficar...”
Certo dia, enquanto lia um dicionário de nomes, ele descobriu que o significado de seu nome era sorte e de sua saudosa amiga Amy era amor. E assim, como Amy ficou sem Zady, creio que dessa vez, o amor não teve sorte.
Hoje, Zady sabe que muitas pessoas passam anos e anos ao nosso lado e não nos deixam nada, enquanto algumas pessoas passam muito rapidamente, mas deixam lembranças insubstituíveis e que jamais poderão ser apagadas.