Maria e Adelaide tagarelavam na cozinha da mansão.
 -Dona Andira tá demorando pra mandar servir a mesa do café.
-Verdade já passa das 9... A essas horas ela até já terminou o desjejum.
_E o Dr. Fernando? Também não desceu, será que os patrões resolveram
 “fugir às regras” como diz a patroa?
Ambas riram.
-Bom, vou fazer meu trabalho... Até Maria...
-Bom trabalho.
Adelaide seguiu em direção a escadaria que levava aos inúmeros quartos da mansão.
Parou por uns instantes diante do imenso aquário, paixão do Dr. Fernando.
Ouviu um barulho estranho vindo da escadaria, voltou o olhar e deparou com Dr. Fernando, d escendo as escadas como um sonâmbulo.
Olhar inexpressivo, braços caídos ao longo do corpo esbelto, andar trôpego.
- Dr. Fernando, o senhor tá bem?
Não obteve resposta.
Com olhar apreensivo viu seu patrão chegar até a mesa do telefone.
-Alo? É da policia? Minha esposa ...
Um soluço até então preso em sua garganta fez-se ouvir em um choro compulsivo.
O telefone fugiu de suas mãos, aquele homem  assim exposto, parecia um menino
Frágil e indefeso.
Adelaide, não sabia o que fazer.
Socorrer o patrão?
Subir a escadaria?
Chamar o resto dos serviçais?
-Meu Deus, Maria, corre aqui...
-Que foi mulher, parece que viu um fantasma....
_Fique aqui com o Dr. Vou ver o que aconteceu com a patroa.
-Mas o que está acontecendo Sto. Deus.
Subindo os degraus de dois em dois, Adelaide ofegante, chegou ao quarto do casal,
Bateu de leve na porta, não obtendo resposta entrou.
A cena que deparou nunca mais vai sair de sua lembrança.
Dona Andira, olhos fechados como se estivesse dormindo, jazia no leito do casal.
Ao redor da cabeça, uma imensa mancha de sangue já coagulado se destacava
Nos travesseiros alvos de cetim.
Adelaide abafou um grito, levando as mãos na boca.
-Meu Deus, murmurou... Correu em direção ao corpo inerte tocou os cabelos de Dona Andira,
No desespero de ter sujado as mão de sangue, limpou-as no avental de linho.
Voltou-se para sair do quarto quando deparou com Marcio o filho do casal.
_Que está acontecendo aqui?
Adelaide... o que fez com mamãe?
-Eu? Nada, nada, não fui eu pelo amor de Deus.
-E suas mãos sujas de sangue, sua roupa, como explicam?
- Você não tá pensando que eu...
- Assassina!
Adelaide, atônita, sentiu o frio aço das algemas em seus pulsos.
-Não fui eu juro. Pergunte pro Dr. Fernando.
-A senhora tem direito a uma ligação para seu advogado.
Ao descer as escadas, Adelaide pode ouvir o choro doloroso de Maisa
 abraçada ao seu pai.

-Não me deixe paizinho, não...
 Dr. Fernando não resistira a tamanho sofrimento.
Mal sabia Maisa que também perdera sua mãe.
- Ninguem sai e ninguém entra, por favor, disse o inspetor de policia.
Diante dos fatos, todos são suspeitos.
Marcio amparou a irmã, procurando a maneira mais amena
 Para lhe falar sobre a mãe.

Foram dias de terror.
Adelaide foi presa,  as investigações continuavam lentas, varias
Impressões digitais foram encontradas no local do crime.
Dona Andira recebia frequentemente seus filhos ali
nos aposentos do casal e Adelaide era a serviçal.
Os valores da casa, permaneciam em seus lugares assim como o cofre intacto,
Levando a policia a descartar a possibilidade de roubo.
As investigações duraram dois anos.
Por falta de provas Adelaide foi liberta, mas como era de se esperar
Não mais foi aceita na casa dos antigos patrões.

Sem ter para onde ir, logo ficou sem condições de sobrevivência.
Maisa era a única pessoa que acreditava na sua inocência, mas não podia
ajudá-la em nada pois ainda faltavam alguns meses para que ela completasse dezoito anos
Maria  a pouco trabalhava na casa, não conhecia tão bem Adelaide ao ponto de confiar nela.
Os outros serviçais, motoristas, jardineiro, não tinham muito contato com ela.
Sentada no banco da pracinha, Adelaide conformada com a sorte, observava os pombinhos,
Disputando migalhas que o menino jogava.
- Que lindo garoto. Mas será que ele está sozinho aqui? Falou com seus botões.
Os pombos voaram em direção da rua movimentada.
Nisto o menino levantou-se e correu também tentado
Pegar os pombinhos
Por impulso Adelaide tambem correu segurando o garoto com firmeza, impedindo assim que ele fosse atropelado.
Desesperada a mãe do garoto apareceu. O motorista nem sequer parou.
-Rodrigo, meu filho...
-A moça me salvou mãe, tive tanto medo!
-Obrigada, nem sei como agradecer.
-Ora, não fiz mais que minha obrigação.
-Fico-lhe eternamente grata.
Quis dar-lhe algum dinheiro, mas ela não aceitou.
Fabrício dono de uma banca de revistas ali na pracinha olhou a acena comovido.
A mulher arriscara sua vida para valvar a do menino que nem conhecia. E apesar
Da vida humilde que demonstrava ter, não aceitou paga pelo que fizera.
-Vi o que fez moça, parabéns! È corajosa!
 Adelaide riu timidamente .
-Oras, é nossa obrigação ajudar o próximo.
Meses depois Fabrício Veio a tornar-se seu companheiro.
Um dia, voltando do cinema com Fabrício, Adelaide viu Marcio.
Ele também a viu. Parecia estar bêbado.
-Coitado, comentou com Fabrício...
Meu ex patrãozinho, sentiu mesmo a morte dos pais.
No final da semana  os jornais traziam na primeira pagina a manchete:
DESVENDADO O CRIME DA MANSÃO ALBUQUERQUE.
 E seguia.
Apresentou-se nesta Delegacia, o Dr. Marcio Albuquerque engenheiro...
 Filho da Sra Andira Albuquerque,
Assassinada a cinco anos ...
Dr. Marcio, veio acompanhado de seu advogado, para prestar esclarecimentos sobre o crime...
O engenheiro em depoimento, disse estar arrependido por acusar uma pessoa inocente...
Disse também, ter presenciado o crime e que para proteger a família do escândalo acusou a domestica...
Disse ainda, saber que sua mãe Sra. Andira Albuquerque, mantinha um caso amoroso, fora do casamento
E que, na noite do crime, presenciou seu pai Dr. Fernando Albuquerque, ofende-la verbalmente
E goleá-la varias vezes na altura do crânio, com uma estatueta de metal, que ele,
Dr. Marcio Albuquerque, retirou da cena do crime e enterrou no jardim no canteiro de rosas...
Disse também estar a procura do paradeiro da então, serviçal que ele tanto prejudicou,
Para indenizá-la de alguma forma. 
Fabrício tinha certeza que a noticia tinha a ver com sua companheira.
Correu para casa.
-Adelaide olha só isto...
-Que foi?
A medida que lia o jornal, seu rosto adquiria uma expressão angelical.
_Graças a Deus... Dr. Marcio se arrependeu. Não lhe quero mal.
-Como assim? Esse homem arruinou sua vida!
-Será mesmo Fabrício?
 Será que se os acontecimentos fossem diferentes eu conheceria você e seriamos tão felizes?
Naquele momento Fabrício compreendeu que tudo na vida tem uma razão de ser.
Que mesmo não conhecendo os motivos de nossos infortúnios, devemos confiar no Criador da Vida.
Pois tudo passa e nada é por acaso!