Um dia de glória
O goleiro havia se machucado em uma dividida com o adversário. Quando começou a mancar, os jogadores perguntaram - Eai dá pra continuar?
- Nem dá, chama outro cara. O time de ambos os lados estavam contados. A única pessoa que estava próximo da quadra era um garoto franzino, baixinho, todo descabelado; com os joelhos todo sujo de poeira e com luvas enormes para o seu tamanho.
- Chama ele disse André, fixo do time de azul.
- Para mano, o moleque não deve nem ter pelo no saco, disse Beto o capitão do time.
O time de vermelho começou a colocar pressão. - Eai, vão jogar com um a menos ou vão colocar o pimpolho?
O capitão do time de azul apontou para o garoto. O garoto olha para os lados e pergunta se era com ele que estavam falando.
- É com você mesmo, não tem mais ninguém aqui, disse André. O goleiro que ainda estava mancando ao sentar do lado do garoto disse - Vai lá baixinho, entra logo disse o goleiro.
- Qual o seu nome? Pergunta Beto. - Robernilson, diz o garoto olhando pra baixo. - Ei Robernilson é pra ir sem medo, é pra dar o sangue nessa porra. - Be-e-leza, vou tentar, disse o garoto gaguejando.
Alguém do time adversário comenta: - Chuta alto que ele não tem nem tamanho pra agarrar no gol.
E assim a partida recomeçou. Os dois times voltaram mais aguerridos. O time de azul no qual Robernilson defendia estava com uma marcação forte devido ao receio do seu novo goleiro. Por culpa disso esqueceu-se de atacar.
André, bloqueava todos os chutes que chegavam na direção do gol de Robernilson. A partida foi o tempo todo pressão e os chutes que passavam pelo defensor não chegavam até o gol. Teve um chute que tirou tinta da trave. Próximo do fim da partida, uma bola espirrou e por sorte sobrou para Beto que chutou de uma maneira tão desengonçada que a bola foi girando lentamente até entrar no canto esquerdo do goleiro adversário.
- Gooool. Pelo menos vamos ganhar um jogo na vida, gritou o capitão.
Robernilson vibrava como se tivesse ganhado o campeonato. Mas no último lance, Beto passou de herói pra vilão e desceu um pontapé na canela do adversário, fazendo um pênalti infantil.
O capitão revoltado consigo mesmo fala pra Robernilson: - Pode deixar que eu defendo, da essa luva e sai logo do gol. O time adversário não aceitou. Logo, começou um bate boca entre os dois times. Depois de muita discussão o time de azul conformado, deixou a responsabilidade para Robernilson.
André sacudiu o garoto e gritou: - Vai baixinho, pega esse pênalti. Robernilson respirou fundo e se concentrou. O time adversário escolheu "Fininho", um rapaz gordo e forte que tinha quase dois metros de altura. O capitão do time de vermelho gritou. - Vai desce a paulada nesse pimpolho, se ele ficar na frente da bola não vai sobrar nenhum caquinho.
Todos do bairro sabiam da fama do chute do "Fininho". Até mesmo Robernilson tinha presenciado seus gols. As maiorias dos goleiros não arriscavam nem colocar a mão na bola. A lenda cresceu tanto que muitos diziam que o chute do Fininho só era defendido por um goleiro profissional.
Fininho pegou distância... Todos olhavam apreensivos. Agora era a luta de Davi contra Golias.
Beto protesta e diz: - O mano chuta devagar, olha o seu tamanho e olha o do moleque.
"Fininho" fez de conta que não era com ele e chutou de bico, com toda sua força. Robernilson fechou os olhos e pulou com tudo na direção da bola. O tiro acertou direto no seu estomago e após a bola ricochetear foi parar bem longe no mato. O time de azul começou a pular de alegria.
Robernilson caiu com as mãos na barriga e com a cara olhando para o céu, os seus olhos ficaram cheios de lágrimas. Em seguida o garoto começou a perder o ar e acabou desmaiando com um sorriso estampado no rosto.
Quando acordou no hospital, a primeira coisa que fez foi levantar a camisa e mostrar o seu troféu roxo para sua mãe. Era o seu dia de glória.