CHIC DEMAIS GENTE...

CHIC DEMAIS GENTE..

Na Vila de São João do Espinheiro, a vida era mais do que devagar, era parada mesmo, mas o povo do lugar era feliz e alegre, qualquer coisa servia de divertimento e geralmente riam e faziam gozações uns dos outros, tudo sem maldade, com bom humor e amizade, durante décadas foi assim e era bom.

Mas nesse mundo maluco nada permanece igual para sempre, os anos passam, as coisas mudam e até lá naquele cantinho perdido no meio do mundo, as mudanças chegaram e chegaram bruscamente, porque a modesta vila passou para cidade e de cidade para cabeça de comarca, ai a vaidade subiu a cabeça do povo.

E as tolices aconteceram aos montes, era cada dia uma novidade e sempre coisas bobas, como a vitrine da venda de secos e molhados do Zeferino, que colocou uma parede de vidro na frente da venda, colocou um pouco de tudo que vendia e aquilo ficou parecendo um mercado de pulgas e escreveu, assim: Ex venda, agora Loja.

Uma cidade tem a obrigação de ter um clube e mais que depressa fundaram o Clube Toatoa de Diversões Diversas, mas era apenas uma sala pintada de verde com cortinas amarelas, onde os jovens dançavam aos sábados ao som da sanfona do Cegueta Zé, bebendo limonada cor de rosa e os velhos jogavam cartas

Progresso que era bom não se via nenhum, mas a comunidade enchia a boca para dizer: Cidade de São João do Espinheiro, mas além disso aconteceu o grande evento, que foi a inauguração do primeiro cinema da região; o Cine Espinheirense era um luxo só, tinha até uma cortina de veludo que cobria a tela.

Na noite da inauguração, o povo vestiu suas melhores roupas e compareceu em peso, mas faltou energia elétrica e falhou, só dois dias depois a energia foi restabelecida e o cinema foi inaugurado com a exibição do filme O sheik, com Rodolfo Valentino; foi lindo quando a cortina se abriu ao som de uma valsa.

Sem outra novidade as pessoas se ocupavam o tempo todo do cinema, como só duas vezes por semana eram exibidos filmes, todos assistiam e passavam o tempo comentando o enredo, até a hora de ver o próximo e assim por diante, mas para Seu Bento isso era pouco, ele queria aparecer.

E conseguiu, quando procurou a dona do Cine Espinheirense e exigiu uma cadeira cativa, para seu uso exclusivo; Dona Vina disse que não era possível uma coisa dessas, porque ia ofender os demais expectadores e todos iam querer a mesma regalia, mas Seu Bento não desistiu e tanto atormentou que ela cedeu.

Mas para evitar reclamações, dona Vina lançou a noticia que seu Bento estava com uma doença contagiosa e que ia ter uma cadeira separada só para ele no cinema, mas o boato se espalhou e o povo passou a correr para longe do infeliz, todos com medo da tal doença e quando ele soube do boato, foi as contas com a dona.

E ela se justificou dizendo: o senhor queria uma cadeira cativa e eu tive que me defender, porque não posso perder os freqüentadores por causa de uma exigência sua, agora agüenta o mau jeito, tem sua cadeira com nome gravado, não tem? O velhote levou meses, para provar que não tinha doença nenhuma, mas conservou a cadeira reservada e achava muito chic.

Maria Aparecida Felicori{Vó Fia}

Texto registrado no EDA

Vó Fia
Enviado por Vó Fia em 19/02/2011
Código do texto: T2801621
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.