A chuva abundante não dava trégua.
Da minha singela moradia, podia ouvir, ao longe,
  gritos desesperados de famílias inteiras que perdiam tudo.
Seus pertences, familiares, bichinhos de estimação.
Deus, para mim, era inexplicável. Como poderia deixar que tantas tragédias acontecessem?
Mas eu não sairia de meu lar, onde com tanto sacrifício eu construira.
Morava com minha esposa Jandira, meu filho Jarbas, Denise minha filha caçula e minha mãe de 60 anos, doentia e franzina.
_Vamos embora daqui pelo amor de Deus Zé.
_Por que Jandira? Nossa casa não corre risco nenhum, é sólida.
 Eu a construí, tijolo por tijolo, não vou sair para os outros invadirem!
Confesso que era “cabeça dura”, como dizia minha mãe
_Peça a teu deus pra proteger a gente!
 Você e a mãe não vivem dizendo, que ele tudo pode? Então!
_Ta bom Zé, mas eu vou levar as crianças e a vó para um lugar seguro, se quiser ficar fique.
 Não vamos esperar que Deus arranje tudo! Mas vou rezar por você.
Eram mais ou menos 13 horas.
A chuva caía torrencialmente. Com pequenas trouxas lá ia minha família implorando para que eu fosse com eles.
_Vem Zé. Não seja turrão.
_Vou nada! Vocês é que vão voltar com os rabinhos entre as pernas.
Todo dia durante 10 dias Jandira vinha, trazia comida pra mim que era um preguiçoso de marca.
Ela sabia que se não trouxesse eu não comeria. O chato eram os conselhos.
_Vamos Zé na casa do teu irmão estamos bem,
É só um tempo até que passe a chuvarada.
_Vou nada...
Num desses dias, Jandira veio e trouxe Denise.
_Ela queria tanto te ver Zé estava agoniada de saudades.
_Fez bem em vir... Ando meio triste sozinho.
De repente fiquei frio... Um estrondo horrível seguido de um raio.
_Eita... Este foi perto. Confesso que senti medo.
Mal tive tempo de olhar pela fresta da janela. Meu coração parou.
Um rio de lama e detritos avançava se agigantando em nossa direção!
_Entrem debaixo da mesa! Rápido.
Não me lembro de ter visto mais nada até que senti meu corpo adormecido.
Quis gritar mas a voz teimava em não sair.
Em tênue luz eu vi Denise sorrindo para mim
_Não fale nada papai... Apenas pense, posso te ouvir.
_Denise??? Como é isso? Pode me ouvir? Eu te ouço também...Estou tão confuso.
_Calma...
_Cadê Jandira? Que aconteceu?
_Calma... Os bombeiros vêm vindo, vão salva-la, ela ficará ainda uns tempos por aqui.
_Denise, filhinha. Não sinto minhas pernas, meus braços.
_Vê essa luz papai..É a bondade de Deus se fazendo presente.
Essas pessoas, com macas são grupos de Espíritos Socorristas, 
Enviados de Deus para
Ampararem os que estão deixando o planeta Terra.
_O que?  Isso não pode estar acontecendo... Deixando a Terra? Mas eu estou vivo. E você também.
_Sim papai, com certeza estamos vivos. Desfizemo-nos de nossos corpos perecíveis, mas nossos espíritos são imortais.
Naquele momento, me senti carregado para uma das macas, sem que ninguém tocasse em mim.
Não vi mais nada.
Não sei quanto tempo passou, quando a lucidez novamente tomou conta de mim.
Ao lado de meu leito, pessoas, que mais tarde vim saber eram espíritos, aplicavam-me passes de refazimento.  Trouxeram-me um caldo reconfortante.
Refeito, avistei minha filhinha que sorria para mim.
Tenho tanto que aprender!
Mas gora sei que nunca estamos sozinhos e que Deus em sua Divina bondade, não desampara seus filhos,
Independente da escala social, cor ou credo.