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Banheiro de luxo
 
Não eram ricos, não tinham casa própria, nem certos confortos.
Viviam o início da década de sessenta. Em casa o necessário para viver bem.
Principalmente a vitrola, os discos de vinil com Mozart, Betthoven, Luiz Gonzaga, Orlando Silva; o rádio, que era a diversão da neta mais velha e o quintal enorme o parque de todos.
Tinham abacateiro, quiabo, milho para o São João , laranjeira, mamoeiro, e uma fonte bem longe, lá no fim, que era para as crianças não chegarem perto.
Tinham flores, muitas flores, de diferentes espécies, coleção de cactos, trepadeiras cor-de-rosa, lilases, espadas de São Jorge, amores perfeitos, violetas, bom-dia, boa-noite; camarás e lírios, tudo enfileirado nos dois lados da casa ou pendurados na copa ou na varanda,  plantados em caqueiros de barro, latas de banha pintadas, diferentes espécies de vasilhas e tamanhos.
Eram quatro crianças e quatro adultos.
O banheiro, ah! Deste ninguém gostava; era o último cômodo da casa, uma extensão; mas fora dela. E enorme. Mas, para quê?faltava tudo. Não havia pia, só um vaso . Lavar o rosto só de "sopapo" Ninguém reclamava; mas não gostavam. Não havia papel higiênico, só pedaços de jornal, revistas ou papel pardo, cortados pelo chefe da casa, todos do mesmo tamanho e pendurados em um gancho ali, perto da “privada”. Mas o lugar do banho era enorme, porém sem chuveiro; a água saía gelada pelo tubo de cobre e, para fechar e abrir os pequenos gritavam:
Tia, mãe, pai! Vem fechar ou: vem abrir; isto no verão, porque no inverno, era uma novelesca. Eu já tomei ontem dizia um; está fazendo frio, falava outro; volto de lá tremendo falava o terceiro. Mas... Criança tem que tomar banho frio, faz bem para a saúde.
Para os adultos, um grande balde que era cheio com água morna para eles. Era o "banho de caneco" ; cedo, para não pegar uma “corrente de ar” na volta para casa.
Reclama daqui, bate pé de lá até que um dia chega à casa uma coisa redonda, feita de algo esbranquiçado parecendo, mas não era alumínio.. Era uma bacia. Enorme, piso de madeira reforçada, folhas de flandres com pinos e tiras de cobre ao redor. Funda para as crianças; tinham medo de se afogarem.
E a despensa, onde eram guardados toicinho, carne de sol, bacalhau, carne de sertão, peixe seco, cordas de cebola e alho, tudo em cestas de palha penduradas, virou banheiro. Com direito a ganchos na parede para as toalhas.
Verão? Todo mundo para o banheiro de fora.
Inverno? Alegria! Toda a criançada para a bacia, um de cada vez, porque menino não toma banho junto com menina. Isso quando Zigue e Zague o casal de gatos sorrateiramente se aproximavam e corriam e repetiam e repetiam.
Depois da maratona do banho era espuma e água por toda a despensa e pingos escorrendo das prateleiras do armário com sacos de açúcar, feijão, fubá, etc. A negrinha ajudante, corria com um pano de prato e enxugava tudo.
Todos agora. limpinhos e enrolados em toalhas; hora de jogar a água fora. Ih... que chateação! todos a encher baldes e jogar no esgoto
Sabe? Era melhor tomar banho no banheiro lá no fundo...
A bacia que tanto agradou, em pouco tempo passou a ser uma aventura, de vez em quando.
Foi para a lateral da casa, parte cimentada, perto do ralo do esgoto de água e virou piscina; quando isto era uma coisa de gente milionária.

 
 


Imagem: apenas parecida. autoria não localizada.