O Raposo e os Umbus

Para Leonildo Raposo da Silva," a química " resumia-se ao conhecimento dos elementos que utilizava para fabricar os produtos de limpeza que vendia, e vendia muito bem!, esperto como era ,não tinha dificuldade em fazer a lã de seus fregueses ir parar em seus bolsos , e seus excelentes produtos nas prateleiras de alguns tosquiados.

Leonildo costumava andar com o mostruário de seus produtos até para ir ao médico,de fato, na clínica do doutor A. só usavam os produtos de limpeza trazidos pelo Raposo.Com muita simpatia o raposo já havia feito fregueses entre os pacientes do DR.A. e orgulhava-se de que seus produtos podiam ser encontrados nos melhores Super Mercados em mercados que não eram assim tão SUPER e até em mercearias.

Leonildo Raposo da Silva, com um nome desses ...,achava que seu primeiro nome era feio, por isso raramente se apresentava como Leonildo, não gostava do pai por ter abandonado sua mãezinha ,só lhe restava o Raposo ,um nome assim desgarrado entre dois nomes rejeitados .

SR.Raposo prosperou tanto que vivia de alugar, mas ninguém reclamava por estar sendo alugado,ele costumava pagar adiantado pelo aluguel e não reclamava nunca dos serviços prestados .Alugava a cunhada pra lavar suas roupas e a sobrinha para limpar sua casa, tinha com que pagar uma arrumadeira e uma lavadeira mas não gostava que estranhos tocassem no que era seu ..., podia almoçar em qualquer restaurante que quisesse ,mas preferia alugar sua vizinha, uma antiga amiga de sua mãe ,para fazer sua comida ,porque queria comida caseira pra ter a sensação de que levava uma vida tranquila,as vezes dormia em um hotel no mesmo bairro que morava, só pra ter a sensação de que algo novo estava acontecendo em sua vida linear e previsível de solteirão.

Em uma noite , quando voltava pra casa depois de um bom dia de vendas, viu no telhado o namoro estranho dos gatos ,correndo ,fazendo barulho, sendo enxotados...e resmungou consigo:Bem dizia o poeta..."invejo a sorte que é tua porque nem sorte se chama", e como quem desenrola um macio novelo de lã ,o Raposo foi desenrolando os macios momentos de sua juventude, lembrou-se de quando gostava de poesia ...,agora vivia cercado de mulheres insípidas , que tinham cheiro de sabonete no pescoço pra mostrar que eram limpas , e tinham mãos calejadas para provar que eram trabalhadoras, conheceu muitas assim entre as amigas solteiras que sua cunhada tentou empurrar altar à cima,mas estas mulheres ,com o instinto maternal a tanto tempo apurado, só sabiam fazer carícias de mãe.

O Raposo nem sabe como, mas quando despertou de seus devaneios já estava em seu quarto retirando as meias, olhou para suas pernas e mãos como se fossem estranhos, como se tivessem vida própria , ele não havia dado comando as suas pernas para atravessar ruas, subir escadas, entrar em casa ..., nem falou pra suas mãos qual era a chave, nem como se despir,tão rotineira era sua vida que seu corpo funcionava no piloto automático.

Andou muito devagar no sereno aquela noite, teve febre e delírios diversos, só um piedoso vírus de gripe compadeceu-se do raposo e fez sua temperatura subir, e fez recordar sensações já esquecidas, teve sede , frio ,fome , quis alugar uma enfermeira para cuidar dele ,mas tão debilitado estava que não conseguia chegar ao telefone, neste tempo refletiu muito sobre o que estava fazendo de sua vida..., ao terceiro dia sentiu-se melhor e levantou-se disposto a viver,foi até uma farmácia e pediu vitamina c como quem pede uma bebida forte para ter coragem de fazer algo, o farmacêutico demorou a encontrar ,as coisas estavam um pouco fora de ordem porque Eva havia aproveitado o dia para fazer uma limpeza geral no estabelecimento do tio.

Antes de sair o Raposo viu a menina que no alto da escada esticava-se para tirar todo o pó,era uma pequena de aproximadamente 14 anos ,com os ossos bem revestidos de carne e gordura, alguns diriam que as gordinhas são feias, mas o raposo nunca havia visto mulher mais graciosa...

Quando o farmacêutico percebeu os olhos de predador com que o Raposo mirava sua sobrinha , teve vontade de dar-lhe uma dose de laxante ao invés de ao invés de vitamina C,mas por profissionalismo nada disse ,entretanto apertou com muita força a mão do cliente dizendo que agradecia pela preferência.O Raposo sabia que não seria fácil ,com o tio servindo de muro...mesmo assim ,como um alcoólatra vai diariamente ao bar ,ele ia diariamente à farmácia , cada dia aproximava-se um pouco mais de Evinha, descobriu que ela ficava na farmácia sozinha das 11:30 às 13:30,enquanto o tio ia almoçar, neste horário o Raposo atacava, e a menina não lhe era indiferente, mas aquele muro..., o tio descobriu, expulsou o atrevido de lá e deixou de ir almoçar em casa, preferia comer marmita a ver a pobrezinha da menina ser levada pela lábia de um homem experiente.

Em frente a farmácia havia uma banquinha de frutas ,e como a rua é pública ,o Raposo logo virou freguês da banca , todos os dias ia comprar umbu,nem gostava tanto assim Da fruta , o que queria mesmo era vender sua imagem de sujeito bem sucedido para menina. O umbu custava só uns trocados, mas ele fazia questão de tirar a maior nota do bolso, sempre dando um jeito do farmacêutico ver o bolo de dinheiro, também dava trocados aos moleques da rua,para que percebessem o quanto era generoso.

Cumpriu seu ritual diário por dias, mas na quinta Evinha não estava no balcão, nem na sexta, nem no sábado...o farmacêutico o encarava com ares de vitorioso, mas só na segunda o Raposo ficou sabendo que o tio havia mandado Eva de volta para fazenda dos pais ,onde ela não poderia continuar os estudos ,mas já haviam escolhido um bom noivo pra ela...

O Raposo andou cabisbaixo pela avenida, trazia nas mãos uma sacola, dentro dela algo que parecia uvas verdes, eram umbus maduros, jogou a sacola fora , de que valiam?, ...e se fosse roubá-la?

vinha(flavinha)
Enviado por vinha(flavinha) em 12/01/2011
Código do texto: T2723798