Pai e filho no almoço
Pai e filho estão almoçando em um restaurante chique da Capital Paulista. O filho convidou o pai. Há tempos não se falavam. O pai trabalha em uma Empresa Multinacional, em Manaus. O filho ficou com a mãe, morando em São Paulo. Formou-se em engenharia e candidatou-se a uma vaga na mesma empresa. O telegrama de convocação está com ele, mas ele não o mostra ao pai e nem comenta sobre o assunto.
O filho quer entender a razão de tanta dedicação do pai a essa Empresa, que o fez se decidir a sair de São Paulo, anos atrás, sendo transferido para Manaus. Lembra-se do período em que viveram juntos, mãe, pai, filho, filha, naquela cidade tão quente e úmida. A dificuldade de adaptação. A tristeza da mãe em ficar distante da família e dos amigos de São Paulo. A revolta da irmã mais velha, por se ver longe do namorado e a culpa jogada na cara do pai, quando recebeu um email dele terminando o namoro. Lembra-se das poucas conversas do pai, à mesa, contando com orgulho e com o rosto iluminado, sobre as obras que acompanhava. Lembra-se do olhar de orgulho e tristeza no rosto da mãe, feliz com os feitos do marido e triste pela situação em que vivia.
Depois de dois anos, a volta para São Paulo. A mãe e irmã não agüentaram o isolamento. E ele precisava de melhores escolas. No começo a família ainda estava unida, mas logo os pais se decidiram pela separação. Continuaram amigos.
Mas a distância não permitiu a participação do pai em vários momentos. Ele não esteve presente na doença da mãe, no noivado da irmã (pelo menos veio ao casamento). Também não viu o filho se formar no segundo grau. E não veio também na formatura do curso de engenharia da USP.
Do outro lado da mesa, seu pai está falando com o mesmo orgulho e brilho nos olhos, sobre seu trabalho na Empresa. Esperava que o pai lhe dissesse estar arrependido, mas percebe que isso jamais irá ocorrer. Percebe então que aquele homem à sua frente fez uma escolha, que pode não ter sido a melhor para ele – filho – e para a família, mas que foi a melhor para ele, pai – homem e profissional. Nesse momento lhe vem à mente algumas fotos do pai, soldando tubos de aço na selva amazônica, e se lembra em especial de uma foto, onde ele aparece recebendo o prêmio de melhor soldador do ano. Percebe então o quanto ama aquele cara na sua frente e quanto orgulho sente dele. Tira do bolso o telegrama e diz ao seu pai “fiz uma entrevista na Empresa. Fui chamado. Vou trabalhar na mesma empresa que você”. Percebe o brilho no olhar do pai, que logo vira o rosto para o lado.
Continuam a comer, falam de outros assuntos, conversam sobre o futuro.
Entraram separados no restaurante.
Saem juntos e abraçados.