A Diretora, a escola e o Sistema.

Na ponte do Barreiro, em meados de outubro, dona Graça seguia nas pontes, como de costume, com aquele blusa vermelha surrada, um short lilás e a sua pasta de papel azul com material para tirar xérox ou a procura dos alunos que faltavam a aula.

Quando menos se dava conta, lá ia a pequena dona Graça de novo, agora se virava para comprar gás, logo depois a procura de alguém para consertar o telhado...

Aquela senhora não parava. Sempre em dia com os seus afazeres. Ia e vinha da SEDUC,

Brigava por melhores condições, tirava do seu dinheiro para que a escolinha não parasse.

Preocupava-se com as reuniões de pais, que em maioria não compareciam, lamentava o atraso no fundo, a entrega quase vencida da merenda escolar e vez por outra, substituía professores, que não apareciam para dar aula.

Administrando sempre com alegria, não se reclamava, era uma mulher de luta. Fazia suas reuniões e um a um funcionário corrigia; categoricamente se expressava e todos entendiam.

A escola em madeira, com a cor acentuada de amarelo queimado, com bordas marrom, bem pequena, com uma cozinha, duas salas, um banheiro, uma dispensa, poucos janelas e dois ventiladores, ficava ali na rua Boca do Acre.

E de tudo que fazia prestava contas e se sobressaia de tal forma, que vez por outra, tinha que enfrentar aproveitadores querendo ganhar cartaz no trabalho que desenvolvia.

Enquanto os presidentes diziam que o analfabetismo no Brasil reduzia, ela em pessoa contestava, na comunidade mostrava a situação da escola, que só não parava porque todos se esforçavam. Na realidade, sempre afirmava a Educação para ser educação precisa dar condições estruturais aos alunos, precisa qualificar melhor os seus professores, o governo precisa entender que não se acaba com o analfabetismo coletando números para os ingleses veem; que não se segura meninos da periferia nas escolas com merendas vencidas.

Sempre insistia na necessidade de se ter os pés no chão. O Brasil não precisa vencer eleição, o Brasil precisa cuidar melhor do seu povo.

Em vinte e tantos anos como contrato, viu serem mandadas embora as suas merendeiras, algumas professoras e serventes. E teve que se submeter a ser de tudo um pouco para que a escola chegasse até o final daquele ano letivo. Vivia mais na escola do que em casa... Lá tomava café, que ela mesma fazia, lá almoçava, lá merendava... Pintava e bordava.

Como brasileira, encorpava o slogam do governo, não desistia nunca...

Por outro ângulo, era também gente que faz. Pois, quando não tratava de crianças que eram molestadas pelos padrastos, conversava com os bandidos alunos e pais, para não assaltarem os professores; tirava das mãos dos seus alunos, crianças de sete a onze anos revolveres e muitos maus costumes. Até que a brasileira demais foi mandada embora e a escolinha daquela rua fechou, se mudou para um local mais apreciável...