Alergia
O diagnóstico deixou os pais do menino com cara de bobos.
- Mas, doutor, o que isso significa, perguntaram novamente.
- Infelizmente, é o que acabei de lhes dizer: o seu filho tem uma doença rara chamada urticária aquagênica, que traduzindo significa simplesmente alergia de água. Uma gota de água irá causar erupções na pele comparadas a queimaduras com fogo.
- Mas o que devemos fazer agora, doutor?
- Mantenham o garoto o mais longe possível do contato com a água. Banhos, somente com álcool em gel e uma toalhinha. Piscina, mar, chuva estão proibidas. Uma simples garoa pode matá-lo.
- Doutor, nem mesmo para beber?
- Infelizmente é impossível para qualquer ser humano viver sem beber água, mesmo o seu filho com esta doença. Para beber água será preciso usar um canudinho, pois o menor contato com a pele ou com os lábios do garoto causará erupções extremamente dolorosas. Procurem dar pequenas quantidades de água várias vezes por dia. Os sintomas que irão aparecer são falta de ar e inchaço na garganta, mas vou passar um anti-histamínico para que ele possa suportar a dor quando for beber água.
Os dois saíram do escritório imaginando estarem entrando em um filme de ficção científica.
- E agora, Antenor, como vai ser a vida desse menino?
- Calma, Lurdes, vamos criá-lo da melhor forma possível. O nosso filho vai ser uma criança normal, mesmo com estas limitações, isso eu te prometo. E não vou deixar ninguém olhar ele como alguém diferente, com dó ou nojo, mesmo que eu tenha de enfrentar o mundo todo no braço.
E assim foi. Com muito esforço e dedicação e carinho, criaram o menino com uma vida quase normal. Até o dia em que ele entrou correndo em casa, branco de susto.
- O que foi, meu filho?
- N-nada, mamãe. Foi só outro plano infalível do Cebolinha e da Mônica para me molharem na volta do colégio. Eu consegui escapar, mas desta vez foi por pouco. Ufa.
(texto publicado originalmente em www.jefferson.blog.br em 17.12.2010)