OBA! CHOCOLATE DIET!

OBA! CHOCOLATE DIET!

– Oba! chocolate diet! Tomara que seja uma delícia! – falei com o entusiasmo de um chocólatra frustrado pela sanha de médicos opressores. – Esse acho que posso comer!

Comprei logo 5 barrinhas e meti imediatamente uma boca adentro! Bom sabor! Fiquei satisfeito. Dei duas para um amigo.

Mais tarde, peguei outra barra e resolvi ler os ingredientes! Eu não devia ter feito isso! Não devia mesmo. Comecei a ler e, não sei por que, comecei a sentir algo estranho no estômago. Um peso, uma revolução lá dentro, ácidos gritando e querendo expelir tudo que lá havia! Revolução declarada e mancomunada entre cérebro e estômago! O primeiro afirmou peremptório:

– Xiii, num sei nada dessa porra que estou lendo aqui não!

– Então vou jogar tudo fora, vou me livrar dessa merda toda – retrucou o estômago, sem qualquer comando de quem quer que fosse.

– Espera, idiota, me deixa terminar de ler, quem sabe surge uma luz, fica calado aí e não tome nenhuma atitude, entendeu! – falou o cérebro nervoso com a insubordinação do outro.

– Vá à merda, quem tá agüentando essa bosta a fermentar aqui dentro sou eu, você está bem distante, cuide dos outros, porque de mim cuido eu! – retrucou o estômago, julgando-se órgão voluntário, roncando, ronronando, revolto, querendo jogar por cima o que, depois de processado, deveria sair por baixo!

E eu, com o resto do meu corpo, agüentando essa discussão entre os dois e com um mal-estar filho da puta, com ânsia, mole, indisposto. Maldita a hora em que fui ler os ingredientes daquele chocolate! Tão saboroso e...

Claro, era um tablete de chocolate diet com castanha de caju! Então, castanha de caju tinha mesmo. Eu mesmo percebi na boca o gosto dela. Soro de leite também tinha. Mas... aí começou uma enxurrada de coisas esquisitas. Vem logo a gordura (meu organismo acha gordura algo estranho, qualquer que seja ela) vegetal hidrogenada. O que será uma gordura vegetal hidrogenada? Não é de animal! Menos mal! E deve ter água!

Até aí, vá lá. Mas o que seria esse próximo ingrediente: maliodextrina? Coisa boa não pode ter esse nome! E já começa com “mal”. Se já tem mal, imagina o efeito que o “iodextrina” pode causar! Iodo na comida!!! Fiquei apavorado e meu estômago roncou grosso! Mas não era só! Tinha também um xarope de “maltiol”! De novo o “mal” veio antes da coisa! O que será isso, meu Deus!? Quem ficou xarope fui eu!

Seja lá o que for, paciência, porque aí veio massa de cacau e, como chocólatra, adoro cacau, minha fruta predileta. Mas o ingrediente seguinte fez meu estômago jogar seu conteúdo até parte do esôfago, que, nervoso, jogou de volta pro estômago: polidextrose. Caraca, diacho, que será esse troço!? E vem, pelo jeitão, em grande quantidade, é “poli”! Poli aqui é uma grande quantidade de dextrose! O que será dextrose? É dose! Quanto mais eu lia, mais o estômago queria se livrar da coisa, tentando expeli-la por cima ou por baixo. O intestino se fechou e a coisa não descia. O esôfago, mais fraco que o estômago, mas em posição superior, forçava pra baixo. Puta briga e eu me ferrando!

Me ferrando mas... burro, em vez de parar de ler aquela merda, a curiosidade masoquista me impelia a continuar. Aí vem glicerina! Meu Deus! Isso não! Eu sei que glicerina tem a ver com sabão! O que estão metendo no meu estômago, oh! não, aí já é demais. Corri pro Houaiss e lá estava: glicerina: substância (C3H8O3) obtida como subproduto da fabricação de sabão e ácidos graxos; glicerol [Us. como emoliente, solvente, plastificante e na fabricação da nitroglicerina.!

– Nitroglicerina! Caraaaaaaalhooooo! Eu vou explodir, gritou o estômago, apavorado! Vou pôr essa merda toda pra fora e é já! Tá vendo! Engula um negócio desses!

Aí me concentrei e li o troço todo: glicerina branca farmacêutica! Xiiii, eles já põem a glicerina acompanhada de remédios, só assim pode ser farmacêutica!

– Isso é tentativa de assassinato, o cérebro gritou impiedoso. E o estômago reagiu de pronto e tentou jogar pra cima toda aquela perigosa indigestão! O esôfago ainda agüentou firme e devolveu o quimo para seu devido lugar. E eu fiquei mais tonto ainda! Não era nem produto do sabão! Era um mero subproduto do sabão! Quer dizer: lixo mesmo! Pobre de mim! Tudo por uma barrinha de chocolate!

Tá na chuva é pra se molhar. Continue lendo até o fim agora.

– Veja o que você ingeriu, sua besta! – cutucou o cérebro! Mas lá fui eu ler o resto: emulsificantes mono e diglicerídios! Xiiii, agora fodeu de vez! O troço, além de “ficante”, isto é, veio pra ficar mesmo, é mono, quer dizer um, e di, quer dizer dois. Um puta contrassenso instalado dentro do meu estômago. O que será um emulsificante? E o pior que veio no plural! Não resisti: dicionário de novo. E me fodi de novo! Uma emulsão é “dispersão coloidal de um líqüido em outro”! Ah! bom! Menos mal! Então é só isso! Coloidal é?! Ótimo! Fiquei tranqüilo agora. Entendi tudinho. Dispersão coloidal! Ah! tá! Mas eram no mínimo dois emulsificantes! Pobre do meu estômago! Agora eu compreendia o seu desespero!

Continuo a ler ou paro!? A curiosidade falou mais alto. Aí veio um tal de “éster de poliglicerol”! Agora sim, agora está tudo tranqüilo. Malemá sei o que é éter! Mas “éster”. Minha amiga Ester não ia gostar de saber que o nome dela se prestava a essas barbaridades! Eu juro, ela é invocadíssima! E o tal do éster ainda vinha com poliglicerol, quer dizer mais subproduto do sabão no meu estômago! Deve ser brincadeira, uma barrinha saborosa como essa não pode ter esses inconvenientes, digo, ingredientes esquisitos assim. Fiquei na mesma!

Mas.. de novo a frase: tá na chuva é pra se queimar. Vamos em frente! Havia algo que eu conhecia de nome, como lecitina de soja. Isso deve fazer bem! Senti o estômago mais calmo com isso! Aí vieram uns edulcorantes artificiais aspartame! Tudo bem, deve ter algo a ver com cor! E aspartame é meu açúcar predileto, isto é, pelo menos vem em alguns adoçantes que uso!

Mas... quando li um tal de “acesutame K”, não houve jeito. Foi insulto demais para o estômago e ele, numa violência até então desconhecida por mim, expeliu a barrinha, com todos os seus ácidos estomacais, que meu esôfago e garganta estão até agora doridos!

– Oba! Chocolate diet!

Leo Ricino

Agosto de 2006 – última mexida: 29-12-08

Leo Ricino
Enviado por Leo Ricino em 07/12/2010
Reeditado em 19/05/2012
Código do texto: T2658589