TALENTO
Pobres palavras presas no dicionário empoeirado que religiosamente guardado no canto da mesa, desbotava ao prazer do tempo. Pobre escritor que, tão novo e já cansado, desistiu do sonho de voar entre as palavras. Os sonhos lhe roubaram todos, a felicidade, esta já lhe havia fugido há muito muito tempo, e foi pelos becos de sua vida que, tentando recuperá-la, conheceu as palavras.
Apaixonava-se com freqüência e muito intensamente. Paixão esta que culminava entre personagens e entre linhas, dizeres vagos e olhares, prolixidade e simplicidade. Tudo, logicamente, maquiado por uma simpática história de ares juvenis. Afinal quem viria a desconfiar do simpático José Eduardo dos olhos de hefésto, ou da tímida e problemática Catherine.
A escrita é definitivamente isso, devaneio, simulação de possibilidades. Quem sabe seja tentar prever a atitude de alguém ou simplesmente ludibriar-se com algo e criar, por que não, um novo mundo onde se pode tudo. Pobres palavras presas no dicionário empoeirado. Voltariam a sair de lá um dia, mas desta vez para mãos destras e habilidosas? Talvez não, afinal perdera o talento, ou nunca o tivera. Fora apenas um entusiasta que ainda sonha em escrever.