A mulher sábia

João e Maria eram casados há mais de dez anos. Nunca tiveram filhos, assim como nunca tiveram desavenças. Era um casal tranquilo. E isso, por vezes, causava inveja em algumas pessoas. Principalmente naquelas desiludidas matrimonialmente.
José era o novo colega de serviço de João. Era divorciado. Teve três casamentos e nenhum vingou. Se o assunto era casamento, sua opinião era ríspida e invariável:
– Isso é sinônimo de confusão...
José descobriu que João era casado a esse tanto de tempo sem ter passado por nenhum desentendimento sequer com a esposa, por mais simples que fosse. Cético, inquiriu a João sobre a veracidade das informações, mas a resposta também era invariável:
– Em ocasião alguma brigamos.
José não se deu por satisfeito. Tentou de todos os modos ouvir de João que o casal já havia discutido.
– Já disse. Nunca! – garantiu João.
Ainda assim, José se recusava a aceitar a felicidade de seu colega. E depois de tantos outros questionamentos, descobriu que Maria conhecia claramente os gostos e intentos do marido, e vice-versa. Procuravam, dessa maneira, respeitar a opinião do outro e lhe satisfazer as vontades, dentro do possível.
Dono de um desdém peculiar, José se propôs a experimentar a João. Chamou-lhe para uma conversa em particular e expôs suas experiências conjugais e, de maneira geral, com as mulheres. Dessa forma, tentava mostrar ao colega como as mulheres realmente eram. José disse, inclusive, que João era muito passivo. Não se impunha diante da mulher. Tudo tinha que ser conversado, tudo tinha que ser bom para os dois, e isso nem sempre poderia ser o melhor para o marido. Privar-se-ia sempre de suas vontades em detrimento às da mulher? João, resignado, meneava a cabeça, contestando as afirmações de José.
Depois de certo tempo tendo de aturar o chato colega, João aceitou um desafio proposto por José, na tentativa de se ver livre de tanto infortúnio. José havia requerido de João que provasse para todos daquela empresa que ainda não havia encontrado desentendimentos na vida a dois por causa dele mesmo. Precisava provar que a mulher era mesmo compreensiva. Segundo José, bastaria um leve contragosto da parte de João e logo sua mulher mostraria sua verdadeira cara. João aceitou a proposta.
Assim, naquele mesmo dia, João passou no mercado para comprar peixe. Comprou um tucunaré, mas apenas um. Na manhã seguinte, antes de sair para o serviço, deixou um bilhete pedindo que Maria preparasse o peixe no almoço. Apenas um bilhete, sem informações adicionais. Caso a mulher fizesse o peixe cozido, o marido deveria dizer que o queria frito, e então brigariam. Caso o peixe fosse frito, João diria querer peixe cozido, e brigariam da mesma forma. Ele deveria exigir sempre o contrário.
Meio-dia. Pela primeira vez João sentiu a tensão da possibilidade de contender com a mulher. No fundo estava confiante, mas por via das dúvidas, desejava não almoçar em casa naquele dia. José, por sua vez, preparava o sorriso sarcástico.
João chegou em casa para o almoço.
– Fez o peixe, Maria? – perguntou sem olhar em seus olhos.
– Sim, amor. Fiz. Mas...
– Fez frito? – interrompeu-a, mirando seu olhar ao vazio.
– Sim, fiz frito.
João sentiu um calafrio. Respirou profundamente.
– Maria, eu queria era peixe cozido... – foi falando e virando em direção à mulher.
– Mas eu também fiz cozido, amor – emendou Maria, com um leve sorriso e preparando a mesa.
João lançou um olhar penetrante à mulher. Nessa altura ele já não sabia o que fazer com as mãos. Não sabia nem o que deveria fazer caso essas mãos alcançassem sua esposa. Ele nunca agiu dessa maneira.
– Você errou de novo, Maria. Eu estava mesmo era com vontade de comer peixe assado! – falou João, já aumentando o tom da voz.
E antes que o marido pudesse fazer mais alguma objeção, Maria disse:
– Amor, eu também fiz um pedaço desse peixe assado. Você saiu e não disse como queria o peixe, então eu cortei o peixe em partes e preparei uma parte frita, uma cozida e outra assada. Mas ainda tem um pedaço na geladeira. Cru. Se você quiser de alguma outra forma, eu preparo...
João não disse mais nada. Seus olhos brilharam de satisfação. Deu um abraço forte e gostoso na esposa e agradeceu a Deus pela mulher que tinha.
Não só vive só de amor (em todos os seus sentidos): o alicerce para o bem-estar matrimonial consiste na clareza da comunicação, na compreensão, na sinceridade e principalmente na sabedoria.

“Toda mulher sábia edifica a sua casa, mas a tola a derruba com suas próprias mãos”.
(Provérbios 14:1)

U-Dan
Udan Atikun
Enviado por Udan Atikun em 10/11/2010
Código do texto: T2607912
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