A PROFESSORA
Analice irradia felicidade. A espera por esse sonhado dia fora árdua, mas prazerosa. A concretização de um sonho compartilhado até mesmo pela natureza, os pássaros cantam, o vento baila por entre as folhas e flores. Tudo à sua volta é esplendoroso. Antes de sair deu um beijo demorado na bochecha da mãe e outro estalado na testa do pai os dois ficam sorrindo, a alegria da filha é o júbilo dos pais. Sai apressada para buscar o vestido de formatura, o mais lindo que já viu. É perfeito, porque perfeita é sua alegria.
O amor pelos livros, pelas letras e o desejo de transmitir para as crianças e jovens todos os ensinamentos que adquiriu impulsionam a bela jovem para estudar com afinco e assim conquistar o tão sonhado Diploma.
Aluna esforçada e assídua, para pagar a Comissão de Formatura, Analice passou muitas madrugadas debruçada em cima de livros e no computador, montando monografias e trabalhos para os colegas da faculdade e hoje ela exultante tem certeza que valeu a pena. Entrara na Universidade aos dezesseis anos de idade, foram três anos de dedicação sendo considerada a melhor aluna do Curso de Pedagogia.
Ela é estagiária em duas escolas estaduais e tudo o que ela almeja é passar logo no Concurso Público e seguir carreira, para isso vem preparando- se há bastante tempo.
Analice chegou deslumbrante na festa. Os cabelos castanhos brilhantes caindo em cascata pelas costas discretamente nuas. O belo vestido chama a atenção, mas os comentários a seu respeito são sobre sua inteligência e seu esforço, e a simpatia que cativa a todos que estão ao seu redor.
Os pais reconhecem as qualidades da única filha. Analice nasceu quando comemoravam dez anos de casados, foi uma longa espera que para eles é dádiva do céu. Resolveram fazer uma surpresa e compraram um lindo anel de formatura, que a filha nem sonha que vai ganhar, pois os pais não têm tanto dinheiro assim, já gastaram bastante e ela jamais cobraria deles uma jóia tão preciosa. A festa foi magnífica, a jovem professora está muito emocionada, recebeu homenagens dos alunos do estágio, inúmeros depoimentos no telão com mensagens de incentivo daqueles que foram seus professores e agora são colegas. Emocionou- se com o olhar de orgulho dos pais enquanto viam suas fotos desde criança até a fase adulta, estavam banhados de lágrimas de alegria. Sem dúvida nenhuma o dia mais feliz de sua vida. Analice e os pais decidem ir embora por volta das 4 horas, alguns colegas vão esperar pelo café da manhã. A jovem está satisfeita, quer somente chegar na sua casa e ficar lembrando das cenas queridas que viveu nessa noite. Ela sai da festa, sorrindo ostentando o anel que a identifica como educadora. Quando já estavam do lado de fora do Clube, Analice lembrou- se do DVD que conta a trajetória de sua vida pessoal e acadêmica, as homenagens recebidas e as dezenas de fotos. Ficara em cima da mesa. Ela pede para o pai parar no acostamento, porque o Clube fica afastado da cidade, troca a sandália de salto por uma rasteirinha, vai e volta rapidamente. Os pais avistam Analice vindo feliz abanando o DVD que trazia na mão. Está a uma curta distancia do veículo quando aparece ninguém viu de onde outro automóvel em alta velocidade que entra no acostamento. Os pais ouvem o horripilante grito da filha e o barulho de pneus comendo o asfalto. O belo sorriso, o lindo vestido, os longos cabelos castanhos, o amado anel de formatura, desapareceram na noite cheia de estrelas, misturam-se ao cascalho da estrada.
O tempo passa, os pais inconformados lamentam: “Nenhum filho deveria morrer antes dos pais.”
No lugar do anel que a filha amada não usou, prestam outra simbólica homenagem, erguem atrás do túmulo uma parede com a imagem de um quadro negro, e em alto relevo uma foto de Analice de perfil olhando para o quadro que está escrito: “ VOCE NASCEU PROFESSORA, E NA ETERNIDADE FOI ACOLHIDA COMO TAL.” E para completar mandaram chumbar a cadeira que durante muitos anos acompanhou a jovem em seus estudos.
Os vigias do cemitério não raramente, presenciam uma jovem de longos cabelos castanhos, usando um deslumbrante vestido de festa ficar por longas horas sentada naquela cadeira que durante o dia jaz solitária presa ao chão.