Sem Saída!!
O apartamento espaçoso dava a impressão de ser assim por não ter quase nada dentro, apenas o suficiente, a campainha não parava de tocar e foram chegando homens, garotos, meninos.
O apartamento de repente ficou pequeno, todos conversam e bebem, outros se trancam na cozinha o que me deixa muito curiosa.
Raquel, mora comigo no apartamento, eternamente apaixonada pelo Mário, está fazendo este encontro para despedida dele.
Vai morar na França.
O Brasil ficou pequeno demais para ele, não o Brasil, a mente das pessoas do Brasil.
Ele é o que posso chamar de artista, nasceu para ser estrela, famoso, diferente, charmoso, sedutor e gay ou bissexual, não sei.
Tenho as minhas dúvidas quando a ele.
Raquel dorme com ele e nada acontece.
Um tempo atrás eu estava na cozinha preparando um lanche, ele chegou por trás e me agarrou me deu um beijo tão louco e bom, me envolveu com aqueles braços finos e longos, os cabelos loiros cobrindo parte do rosto e um cheiro de menino que me tiraram o fôlego.
Depois voltou para a sala com os olhos mais inocentes do mundo.
Ah! Os homens!
Como eu não conhecia ninguém na festa fiquei no meu quarto lendo por algum tempo. Um deles veio me chamar. Léo, loiro, alto e muito engraçado, não resisti ao convite e me juntei ao pessoal na festa.
Vi que a cozinha estava fechada e quando abri a porta me surpreendi com uns quatro homens ao redor de um prato com várias carreirinhas de um pó branco, claro que percebi que era cocaína.
-Você quer?
-Não , obrigada. Só vim procurar um copo.
Nunca usei drogas, as não ser aquelas coisas secretas e inocentes que as adolescentes fazem junto com as amigas.
Escondidas no quarto eu e Raquel fumamos um cigarro de maconha.
Eu dei uma tragada e não parei mais de rir...achava graça de tudo. O quarto dela passou a ser engraçado, o rosto de Raquel ficou torto e sorria sem parar.
Nunca mais quis ficar sorrindo como um palhaço movido a pilha. Muito menos quero pagar o mico de ficar sorrindo sem parar na frente das pessoas. Lembrei do Coringa do filme Batman.
Num outro dia uma amiga que morava no mesmo prédio que eu veio me visitar, véspera de carnaval. Ela me deu um pouquinho de lança-perfume. Disse que eu só sentiria algo bom, que ninguém veria.
Experimentei. E Experimentei o gozo mais forte que já senti em toda a minha vida.
E nunca mais usei, ficava imaginando eu tendo um gozo no meio de um salão no meio da multidão no carnaval. Achava tudo engraçado. Mas sabia dos riscos e sabia que se entrasse no mundo das drogas e definhasse ninguém iria na sarjeta me salvar. A minha vida depois que saí da casa dos meus pais era eu e mais eu...e só.
Mas vendo toda aquela droga circulando no meio do meu apartamento me senti mal. Léo percebeu meu desconforto e me chamou para conversar na janela do apartamento.
Outras pessoas se juntaram a nós para ver a "máquina" que é o carro dele.
Um Landau azul piscina, todo equipado, lindo, estacionado na rua em frente ao prédio.
-Carro do meu pai, peguei escondido para sair hoje. Ele foi dormir cedo, quando acordar o carro já vai estar na garagem como ele deixou.
Aquele homem parecia um menino arteiro e eterno filhinho de papai.
Raquel chegou na sala com o tradicional bolo de aniversário com uma velinha em cima, um bolo simples que foi recebido como um banquete.
Mário apagou a velinha, cortou o bolo, distribuiu champanhe, olhares sorrisos.
A estrela da noite.
Fui para janela olhar a noite, a rua, pensar. Não me sentia muito confortável.
Mário veio me dar um abraço apertado.
-Vou sentir saudades, não esqueça de mim.
Eu sabia que nunca mais o veria.
Léo se juntou a nós na janela do apartamento e olhou para baixo. O carro dele estava lá. Continuamos os três conversando de repente Léo aponta o dedo para a rua em frente o prédio e aos pulos começa a gritar:
-Meu carro, meu carro, levaram o meu carro! Meu Deus, meu pai vai me matar. Chamem a polícia, me ajudem. O cara está levando meu carro.
Todos correram para a janela e olhavam incrédulos o carro azul deslizar suavemente pela rua que fica em frente ao prédio num terreno mais alto.
Léo não gritava mais. Só apontava o dedo desesperado imaginando já ver o carro desaparecer na curva no final da rua.
Rua sem saída.
O ladrão não conhecia o local, fez a volta com aquela banheira difícil de manobrar e voltou pela mesma rua.
-Olhem, ele voltou, o que faço? Me ajudem?
Mas todos continuavam incrédulos com a cena. O ladrão roubou o carro e não sabia que aquela rua não tinha saída, fez a volta e sumiu na noite escura.
Chamaram a polícia.
Era o que me faltava, quero distância da polícia e ver um policial na minha porta numa situação daquelas com drogas dentro do apartamento não era uma situação agradável.
O policial tocou a campainha, atendi, séria, ele também.
Perguntou quem é o responsável pelo apartamento. Respondi que sou eu. Ele fez mais algumas perguntas e mandou que Léo fosse a delegacia mais próxima fazer um boletim de ocorrências e foi embora para meu alívio.
Só me faltava ser presa por porte de drogas. Ou ser envolvida em algo desse tipo se nem uso nada disso.
A festa acabou. Todos foram embora.
Na hora de dormir Mário fez um pedido inesperado:
-Posso dormir no meio de vocês duas?
E assim dormimos os três juntos.
Mário no meio, mais parecia um menino indefeso do que um homem com segundas intenções.
No outro dia Léo ligou, o carro foi encontrado num bairro da periferia, com drogas e bebidas no porta-malas.
Mário foi embora.
Foi para Paris.
Nunca mais o vi, nunca o esqueci.
Na manhã do outro dia após a partida de Mário a vida voltou ao normal. Trabalho, academia, casa.
Abro a porta do apartamento. Um objeto prateado no chão brilha e chama minha atenção.
Uma das chaves do apartamento.
A chave de Raquel.
Entrei no quarto, procurei por todo o apartamento. Tudo vazio, as poucas coisas dela não estavam, procurei um bilhete, algo.
Nada
Ela sumiu.
Sem se despedir, sem dizer para onde foi, sem um obrigada, sem um desculpa não deixei dinheiro para as despesas, desculpa sair assim depois de tudo o que você fez por mim.
Simplesmente sumiu.