Vida de Menina II
Venho contando algumas histórias bem singelas vividas por mim ou por alguém bem próximo.É que ultimamente, para ocupar o meu tempo ou para desanuviar o pensamento, tenho recorrido às minhas lembranças.E, como todo mundo, tenho muitas bem guardadas em minha mente como um precioso relicário.Sei que algumas pessoas costumam negar suas reminiscências, dizem que “quem vive de passado é museu” e outras coisas mais, mas não acredito que as pessoas não recorram pelo menos de vez em quando às suas vivências, sejam elas boas ou más.O que faço diferentemente da maioria (o que me dá muito prazer) é compartilhar a minha rotina com os meus leitores.Pois não é que eu também os tenho e o fato de tê-los é também um sonho de menina?
Sempre tive um fascínio por livros.E não foi na escola que o adquiri.Tampouco em casa.Se muito,recebi dos meus irmãos mais velhos um encantamento pelos gibis.Quando os via escondendo em vários e insólitos lugares as suas coleções , saía atrás deles feito uma sombra .E se percebiam que eu descobrira o esconderijo, tratavam de encontrar outro, ainda mais oculto.Achava isso uma grande maldade,mas não brigava, apenas procurava apurar minhas estratégias de detive, passando a segui-los como um gato (ou melhor, uma gatinha rsrsr).Daí talvez tenha adquirido essa minha tendência à observação, o apego aos detalhes.
Quando ouvia o barulho dos passos ligeiros de um deles pela casa, tratava de espreitá-los à sorrelfa, para lograr saber onde colocariam o tesouro tão cobiçado.Que alegria indefinível quando conseguia saber o local escolhido.Era a glória.Ficava escondidinha atrás de uma porta à espera do final da empreitada.Aí dava uma despistada, ia fazer alguma tarefa doméstica até poder cair de boca no monte de gibis.
Meus irmãos se achavam espertíssimos, mas acho que eu era mais! Como eu sabia o horário de cada um deles, aproveitava cada minutinho para devorar uma revista por vez.E o legal era que o monte de revistas era renovado a cada semana, para deleite dos meus olhos, que se especializaram em leitura dinâmica muito antes de se falar dessa técnica.
Muitas vezes cheguei a chorar, implorando aos meus irmãos o livre acesso aos gibis, mas nada.Eles eram duros na queda.Não aceitavam nenhum tipo de negociação.O máximo que me permitiam era ler um que eles escolhiam para mim enquanto trocavam com os colegas alguns gibis por outros ou vendiam. Lembro-me que algumas revistas do Super-homem, do Fantasma, do Cavalheiro Negro e do Zorro valiam mais.Nunca cheguei a entender esse mercado, mas ficava irritada quando via um exemplar que não conseguira ler sendo negociado.
Fato é que os meus irmãos eram pragmáticos, eram homens com objetividade.Conheciam mais a Lei da Selva.Para eles, mais que entretenimento, os gibis eram moeda de troca. Dez por seis rodinhas de rolimã; três por um pacote de biscoito, duas por uma figurinha da seleção.E o comércio corria solto.E o que eu queria era só me misturar com os meus super-heróis, virar personagem dos quadrinhos, viver minhas fantasias de menina. O engraçado era que ninguém de minha turma gostava de gibis.Minhas coleguinhas só brincavam de casinha, de boneca... As meninas mais velhas já suspiravam pelos garotos e eu....um tanto quanto alienígena, só queria ler e sonhar.E como livro era coisa rara, os gibis foram por um bom tempo meu maior deleite.
Um dia fui a passeio com minha tia na casa de uns parentes mais distantes ( de moradia e de grau de parentesco). Fomos de trem. A viagem foi uma delícia.Quando chegamos à casa dos primos, tal não foi a minha surpresa ao deparar com uma estante enorme repleta de livros.Meu Deus! Que emoção senti naquele momento! Recordo-me da alegria ao me sentir conduzida pelos priminhos (eram dois) para um cantinho da sala, onde começaram a espalhar os livros pelo chão para que eu pudesse folheá-los à vontade.Ainda me lembro da sensação daquele instante.Era como se o tempo tivesse parado.Fiquei totalmente absorta pela leitura.Os meus olhos passavam de um a outro vorazmente, devorando o que me era possível, tentando apreender cada detalhe daquelas belas ilustrações coloridas em minhas retinas tão habituadas aos desenhos em preto e branco dos gibis.
Só despertei do meu mundo mágico quando minha tia me chamou para o lanche que nos aguardava numa mesa repleta de coisas gostosas, quitandas de todos os tipos, além do bule com um café recém-coado e outro de leite ainda fumegante. Eu sentia todos aqueles aromas e voltava os olhos já saudosos, espichados em direção aos livros ainda esparramados ao chão.Felizmente, a minha priminha foi sensível ao meu olhar, entendeu o meu desejo tão intenso e, gentilmente, escolheu alguns livros e me ofereceu dizendo:-Tome.Leve pra você! Ah, essa ternura infantil!
Depois de guardar o meu presente na sacola da tia, sentei-me à mesa e me fartei de tantas guloseimas.Na saída, me despedi acanhadamente de todos da casa e abracei com vontade a priminha.E antes que ganhássemos a rua, perguntei à tia:
-Quer que eu leve sua sacola?
Venho contando algumas histórias bem singelas vividas por mim ou por alguém bem próximo.É que ultimamente, para ocupar o meu tempo ou para desanuviar o pensamento, tenho recorrido às minhas lembranças.E, como todo mundo, tenho muitas bem guardadas em minha mente como um precioso relicário.Sei que algumas pessoas costumam negar suas reminiscências, dizem que “quem vive de passado é museu” e outras coisas mais, mas não acredito que as pessoas não recorram pelo menos de vez em quando às suas vivências, sejam elas boas ou más.O que faço diferentemente da maioria (o que me dá muito prazer) é compartilhar a minha rotina com os meus leitores.Pois não é que eu também os tenho e o fato de tê-los é também um sonho de menina?
Sempre tive um fascínio por livros.E não foi na escola que o adquiri.Tampouco em casa.Se muito,recebi dos meus irmãos mais velhos um encantamento pelos gibis.Quando os via escondendo em vários e insólitos lugares as suas coleções , saía atrás deles feito uma sombra .E se percebiam que eu descobrira o esconderijo, tratavam de encontrar outro, ainda mais oculto.Achava isso uma grande maldade,mas não brigava, apenas procurava apurar minhas estratégias de detive, passando a segui-los como um gato (ou melhor, uma gatinha rsrsr).Daí talvez tenha adquirido essa minha tendência à observação, o apego aos detalhes.
Quando ouvia o barulho dos passos ligeiros de um deles pela casa, tratava de espreitá-los à sorrelfa, para lograr saber onde colocariam o tesouro tão cobiçado.Que alegria indefinível quando conseguia saber o local escolhido.Era a glória.Ficava escondidinha atrás de uma porta à espera do final da empreitada.Aí dava uma despistada, ia fazer alguma tarefa doméstica até poder cair de boca no monte de gibis.
Meus irmãos se achavam espertíssimos, mas acho que eu era mais! Como eu sabia o horário de cada um deles, aproveitava cada minutinho para devorar uma revista por vez.E o legal era que o monte de revistas era renovado a cada semana, para deleite dos meus olhos, que se especializaram em leitura dinâmica muito antes de se falar dessa técnica.
Muitas vezes cheguei a chorar, implorando aos meus irmãos o livre acesso aos gibis, mas nada.Eles eram duros na queda.Não aceitavam nenhum tipo de negociação.O máximo que me permitiam era ler um que eles escolhiam para mim enquanto trocavam com os colegas alguns gibis por outros ou vendiam. Lembro-me que algumas revistas do Super-homem, do Fantasma, do Cavalheiro Negro e do Zorro valiam mais.Nunca cheguei a entender esse mercado, mas ficava irritada quando via um exemplar que não conseguira ler sendo negociado.
Fato é que os meus irmãos eram pragmáticos, eram homens com objetividade.Conheciam mais a Lei da Selva.Para eles, mais que entretenimento, os gibis eram moeda de troca. Dez por seis rodinhas de rolimã; três por um pacote de biscoito, duas por uma figurinha da seleção.E o comércio corria solto.E o que eu queria era só me misturar com os meus super-heróis, virar personagem dos quadrinhos, viver minhas fantasias de menina. O engraçado era que ninguém de minha turma gostava de gibis.Minhas coleguinhas só brincavam de casinha, de boneca... As meninas mais velhas já suspiravam pelos garotos e eu....um tanto quanto alienígena, só queria ler e sonhar.E como livro era coisa rara, os gibis foram por um bom tempo meu maior deleite.
Um dia fui a passeio com minha tia na casa de uns parentes mais distantes ( de moradia e de grau de parentesco). Fomos de trem. A viagem foi uma delícia.Quando chegamos à casa dos primos, tal não foi a minha surpresa ao deparar com uma estante enorme repleta de livros.Meu Deus! Que emoção senti naquele momento! Recordo-me da alegria ao me sentir conduzida pelos priminhos (eram dois) para um cantinho da sala, onde começaram a espalhar os livros pelo chão para que eu pudesse folheá-los à vontade.Ainda me lembro da sensação daquele instante.Era como se o tempo tivesse parado.Fiquei totalmente absorta pela leitura.Os meus olhos passavam de um a outro vorazmente, devorando o que me era possível, tentando apreender cada detalhe daquelas belas ilustrações coloridas em minhas retinas tão habituadas aos desenhos em preto e branco dos gibis.
Só despertei do meu mundo mágico quando minha tia me chamou para o lanche que nos aguardava numa mesa repleta de coisas gostosas, quitandas de todos os tipos, além do bule com um café recém-coado e outro de leite ainda fumegante. Eu sentia todos aqueles aromas e voltava os olhos já saudosos, espichados em direção aos livros ainda esparramados ao chão.Felizmente, a minha priminha foi sensível ao meu olhar, entendeu o meu desejo tão intenso e, gentilmente, escolheu alguns livros e me ofereceu dizendo:-Tome.Leve pra você! Ah, essa ternura infantil!
Depois de guardar o meu presente na sacola da tia, sentei-me à mesa e me fartei de tantas guloseimas.Na saída, me despedi acanhadamente de todos da casa e abracei com vontade a priminha.E antes que ganhássemos a rua, perguntei à tia:
-Quer que eu leve sua sacola?