A Rua Das Árvores

Passos lentos. Coração pulsava, latejava, quase explodindo dentro do peito. Respiração ofegava, delirante, por segundos parecia lhe faltar o oxigênio. Mas para ela nada importava, nem mesmo o ar, somente a presença dele, tão próxima, era o suficiente para que a mantivesse viva. Ali ao seu lado.

Aquele finalzinho de tarde estava perfeito, o céu aos poucos escurecia e as estrelas já começavam a aparecer, reluzentes e, a lua estonteante. Vaidosa. Bem sorrateiramente, o frio veio repentino e tocava a pele dela, como se ele adivinhasse ou pudesse ler seus pensamentos mais íntimos, aproximou-se como quem não quer nada e passando sua mão pela cintura daquele corpo esguio, a puxou para perto. Perto demais. O calor que emanava do corpo dele fazia qualquer brisa se tornar insignificante e o frio, dissipar-se.

Ele parou em frente á ela com um olhar intenso e fixo, castanho profundo e hipnotizador, estava imóvel e sério. Ela não gostava de vê-lo tão sério, não combinava com seu jeito 'moleque atrevido'. A face dela trazia um semblante assustado.

-Que foi?

-Nada, só preciso te olhar...

-Tem algo errado comigo?

Ele sorriu.

-Não...Só quero guardar sua imagem, linda, na memória, eu preciso ...

-Ora... falando assim, até parece que você vai embora...

O menino calou-se, desviou os olhos daquele olhar fácil, calmo, abaixou a cabeça e se afastou.

-Espera... você não vai embora, ou vai?

Ela tentava de todas as formas, conter aquela emoção que sempre a fazia chorar, ela não queria chorar, não na frente dele.

-Responde, por favor!

Aquele silêncio era torturante, como uma chiabata em sua face, era pior do que escutar o que, de fato, ela não queria ouvir daqueles lábios que ela desejava tanto. Mais do que deveria desejar. Seria pecado? Eles eram próximos, mais que amigos, mais que um simples casal, eram primos. Mais aquela paixão enlouquecedora era maior, eles não suportaram, suas bocas eram como ímãs, se atraiam, se buscavam, se saciavam. Mas naquele momento, no silêncio, tudo se desfez dos seus pensamentos tentadores e ela apenas calou-se também.

-Eu tenho que ir, você sabe...

-Tem? Sei? ...

-É.

-Não, eu não sei... por que? Por que tem que ir?

Ele tentava procurar palavras, algo que pudesse explicar a ela sem faze-la chorar, sem ferí-la.

-A minha mãe ... é o sonho dela, e ...

-..e os seus sonhos? Onde ficam?

-É o melhor que eu tenho que fazer...

-Se é o que você quer...

-Não é o que eu quero!

-O que você quer então? O que?

-Eu quero você...

-Então fica!

-Eu não posso...

As lágrimas começaram a rolar dos olhos dela, ele não queria vê-la assim, mas sabia que aquilo iria acontecer.

-Não chora...

-Como não chorar... Você não pode ir embora ... Não pode me deixar assim...

-Acredite, está doendo em mim também, mas eu tenho que fazer isso, um dia você vai entender...

-Quando?

Ele aproximou-se novamente e a abraçou, ela agarrou sua camiseta querendo nunca mais soltá-lo, pois, sabia que quando fizesse isso, ele iria embora mesmo. Ele passou a mão pelo rosto molhado dela, olhou no fundo daqueles olhos, suspirou, deslizou suas mãos até envolvê-la e num súbito movimento, lhe deu um beijo, contornando seus lábios com precisão. Um beijo que ardia. Um beijo de adeus.

-Não vá, não me deixe...

-Desculpa...

Ele foi se afastando, sua expressão estava vazia. Ela não sabia se aquele coração inseguro doía, ela jamais soube desvendá-lo. Ele era um mistério tentador. Naquele momento, vendo ele se afastar cada vez mais, ela não soube o que se passava naquele coração e nunca saberia, pois ele já não lhe pertencia, ou, nunca tenha realmente pertencido.

Talvez, durante aquele beijo, o coração dele pertencera a ela por alguns poucos instantes, mas ele lhe tomou, tão bruscamente, tão cruelmente quando entrou no carro e fechou o vidro escuro, sem olhar para a menina no meio da rua vazia e emoldurada por árvores, árvores que escondiam o céu.

Tudo ficou escuro, sem estrelas.

Tudo ficou frio, sem ele.

Ela queria correr atrás do carro, mas não correu, apenas olhou seu coração indo embora junto com o seu dono. Ela permaneceu ali, imóvel, na esperança de apenas mais uma brincadeira de mau gosto, Esperou. Mas ele não voltou.

E a dor já havia tomado conta do seu corpo, a matando pouco a pouco, no chão frio da rua das árvores que chacoalhavam suas folhas imensas, compondo a triste sinfonia daquele adeus.

Ana Luisa Ricardo
Enviado por Ana Luisa Ricardo em 28/08/2010
Reeditado em 31/08/2010
Código do texto: T2463901