No Ponto do Ônibus
Medeiros, um grande amigo no radioamadorismo e fora dele, organizador de diversos eventos científicos relacionados a essa atividade, inclusive as duas primeiras Expedições Radioamadorísticas ao Pico da Bandeira, tendo eu a felicidade de participar da segunda, ocasião do feito inédito de promover a comunicação através de um satélite de órbita não estacionária, é também um amante da língua portuguesa, respeitando-a tanto, que às vezes conseguia irritar a quem corrigia nessas ocasiões, mesmo a quase três mil metros de altitude.
Extremamente meticuloso, apanhava uma pedra no chão e explicava que aquilo era uma pedra e para qual finalidade a usaria !
Ocasionalmente nos encontrávamos no ponto do ônibus, próximo as nossas casas, e num dia que me sentia inspirado, resolvi fazer com o meu amigo e vizinho aquilo que ele praticava a todo instante:
- Bom dia, Medeiros ! Disse eu entusiasmado, naquela manhã de sol.
- Como tem passado, Alexandre ? Indagou o Medeiros.
Após uma breve pausa, respondi ironicamente:
- Com “FAET”, é claro ! Passa muito bem e economiza tempo, energia ...
Com um ar desconsertado, ele se traiu, com outra pergunta:
- Vai pegar este próximo ônibus ?
- Não, ainda não, pois continuo com sérios problemas na coluna vertebral.
Então ele inspirou profundamente e, retrucou pacientemente:
- Você vai utilizar os serviços, concedidos pelo Poder Público Municipal, a esta Empresa de transporte ?
- Desculpe, eu estava distraído, observando aquele “despacho” ali na esquina. Deve ter custado uma “grana”. Fingindo não tê-lo ouvido.
Já no interior da “cristaleira”, os assuntos foram colocados em dia, até que se aproximou o primeiro ponto no centro da cidade.
- Você vai saltar aí ? Perguntou Medeiros com uma ingenuidade normal, na popular forma de se expressar.
- De forma alguma ! Respondi já de pé e com um semblante bastante sério.
- Mas, por que não ? Deixou escapar inocentemente.
- Eu não trouxe o pára-quedas, portanto, irei apenas descer do veículo. Falei mansamente, com um sorriso maroto e me despedi.
Enquanto me alinhava junto aos outros passageiros em direção à porta de saída, dei uma olhadela para trás e vi o meu amigo segurando-se no encosto do banco dianteiro, nervosamente, e, rangendo os dentes, finalizou quase gritando:
- Eu não vou falar mais nada !!! Entendeu ? MAIS NADA !!!
E, cada um seguiu o seu destino... até o próximo reencontro.
Por Alexandre Boechat.