O Discípulo e a Moça
O discípulo cansado de receber respostas evasivas de seu mestre o indaga com certa revolta no olhar:
Mestre, quando obterei respostas as minhas perguntas?
Quando você deixar de formulá-las – reponde o Mestre.
O discípulo sai desolado, tentando entender o que o Mestre quis dizer. Ele não consegue compreender como pode haver respostas a perguntas não formuladas.
Passando por um rio ele vê uma bela moça lavando roupas. Senta-se à margem - ainda com a resposta de seu mestre ressoando em sua mente - e começa observar a moça que lava as roupas sem preocupações. Toda atenção dela está dirigida para o momento presente, lavar roupas.
Ele a observa... E ela continua seu ofício sem notá-lo.
Ela passa o sabão no vestido molhado, bate na pedra, enxágua no rio, e volta a bater na pedra, formando um ritmo próprio. Quase se pode notar uma melodia saindo deste lavar de roupas.
O último vestido é enxaguado. Ela pega o cesto cheio, levanta, e estende as roupas, uma a uma, sobre as pedras e a grama. O sol brilha forte. E ainda falta um vestido a ser lavado, o seu.
Ela segura as barras do vestido e tira em um só movimento. Adentra o rio com o vestido e o sabão as mãos. Com o mesmo sabão ela ensaboa o vestido e a si mesma. Ela se banha calma e tranqüila, como se não houvesse o tempo. Estende o vestido e deita seu corpo nu sobre a pedra. Tamanha harmonia entre ela e seu habitat faz o discípulo pensar que ela é necessariamente filha do casamento entre os elementos mais nobres da natureza.
O discípulo volta até seu Mestre e não conta sobre a moça do rio. Mas sempre que pode ele volta ao rio para contemplar a harmonia que transforma um simples lavar de roupas em uma suave melodia.
O discípulo já não fala mais. Anda absorto, sem perguntas. A única imagem que habita sua mente é a da moça lavando roupas. Ele já distingue o som de bater a roupa para molhar, para ensaboar, para enxaguar. Para cada fase da lavagem se faz necessário uma batida diferente.
Começa a estação das chuvas e a moça pára de lavar suas roupas no rio. E isto abre um vazio no coração do discípulo, seu coração já pulsava no compasso daquele lavar de roupas. E sem o metrônomo, que ele estava acostumado, seu coração descompassa. E o descompasso do coração faz com que ele abandone, também, a razão.
O discípulo está apaixonado. E ele, como iniciado, sabe que isto significa o fim de sua caminhada junto ao Mestre.
Ele se despede do Mestre e vai até a aldeia aonde mora a moça com intuito de pedi-la em casamento. Chegando a aldeia, ele a reconhece lavando roupas em uma bacia d’água. Aproxima-se e pergunta:
- Hoje faz sol, por que você não vai lavar suas roupas no rio?
- A estação das chuvas chegou. Eu não preciso mais caminhar até o rio. Armazenamos água da chuva e a usamos para lavarmos as roupas, nos banhar, cozinhar...
- Mas você não gosta do rio?
- Claro que gosto! Mas ele não é necessário agora na estação das chuvas.
O discípulo volta para junto de seu Mestre, este o espera com a janta já pronta.
O discípulo intrigado diz:
- Mestre, como sabia que eu voltaria? Como sabia que eu e não a me casaria?
O Mestre sorri e responde:
- Você só precisava apreender a lavar as roupas nos lugares certos para cada estação.