O Pezinho de Tomate Milagroso


       Como ele nascera naquele lugar não sei. Só sei que nasceu, cresceu e se multiplicou!

Não era dos tomates grandes não, era dos pequenininhos... bem pequenininhos...

Acho que por isso escolheu aquele cantinho da casa, bem naquela gretinha da parede, lugar praticamente impossível para nascer qualquer outra plantinha.

Mas, como não era comum, talvez por isso tenha escolhido nascer naquele cantinho original.

Mas o fato nem foi o lugar. O fato foi o milagre da multiplicação.

Quanto mais tomatinhos colhíamos, mais tomatinhos apareciam!

Era um pezinho de tomate que ia se alastrando... alastrando... cada vez mais e mais...

Um pezinho de tomate milagroso!

Nunca me esquecerei do dia em que vendi um litro de tomatinhos para o mendigo Zé Berduega.

Eu tinha uns oito ou nove anos, mais ou menos, e o Zé Berduega nem sei quanto, só sei que era velho ou, pelo menos, a mim parecia.

Naquele dia eu estava brincando na porta de casa quando vi aparecer, lá no começo da rua, a carrocinha da fruta, era assim que todos chamavam à jabuticaba. O carroceiro vinha aos berros gritando:
       - Olha a fruta docinha! Olha a fruta graúda e docinha! Só quinhentos réis o litro! Aproveita freguesia!

As lombrigas saltaram dentro de mim e a vontade de comer jabuticabas aflorou com violência.

Éramos muito pobres, não tínhamos nenhum dinheiro em casa e como eu não tinha coragem de pedir nada a ninguém, entrei em desespero por não saber o que fazer para comprar as “benditas frutas”.

De repente, eis que surge, não sei de onde, o mendigo Zé Berduega.

Olhou para dentro de nosso quintal, através da cerca de bambu, e vendo o pé de tomatinho carregadinho, falou:

- Tomatinho gostoso, né?

Eu, mais que depressa, acreditando ser a Providência Divina que havia enviado o mendigo Zé Berduega bem aquela hora ali, não tive dúvidas e perguntei:

- O senhor não quer comprar um litro de tomatinhos? Só quinhentos réis.

Para minha alegria, Zé Berduega tirou do bolso uma moedinha e disse:

- Mi dá um litru!

Corri, apanhei os tomatinhos, enchi bem o litro e quando estava entregando a ele e recebendo o dinheiro, minha mãe chegou, viu-me com a moeda na mão e perguntou:

- Que dinheiro é esse, Irene?

- Do tomatinho que vendi pro Seu Zé Berduega.

- O quê??? Vendeu??? – perguntou-me ela surpresa.

E eu, no maior entusiasmo, confirmei:

- Vendi sim, mãe, e agora posso comprá um litro de fruta da carrocinha que vem ali ó...

Ela me pegou pelo braço um tanto irritada e quis que eu devolvesse o dinheiro ao Zé Berduega, mas ele, com a sabedoria dos mendigos que entendem as crianças, disse:

- Dexa, Dona Carme, criança é assim mému. Tadinha, é pra comprá fruta. E essi dinhêru era preu comprá mistura mému. Tá tudu cértu.

Minha mãe o agradeceu pela compreensão, deu-lhe outro litro de tomatinhos, enquanto me olhava com um misto de reprovação e pena.

Saí correndo em direção à carrocinha de jabuticabas, sentindo-me poderosa com aquele dinheirinho. Com ele comprei um litro de jabuticabas!

Com o litro de jabuticabas na mão, voltei para a frente de casa e enquanto me deliciava com elas, olhava para Zé Berduega que se afastava e para o pezinho de tomate milagroso.

Jamais me esquecerei daquele pezinho de tomate milagroso nem do mendigo Zé Berduega!

 

Fim

Do Livro: “Denúncias Poéticas, Contos e Crônicas” – Pág. 65 - Irene Coimbra