DIA CHUVOSO

A chuva chuviscadamente vai caindo de mansinho. O dia escuro e a atmosfera densa deixam também densa a alma daquele homem ali em sua cama deitado lembrando na mulher amada que a essas horas deve estar nos braços quentes de um outro homem. Dos seus olhos também vão brotando lágrimas que vai deixando seu rosto com cara de chuva. Seu corpo inerte juntamente com seu ânimo não o deixa escapar daquela aura repleta de inércia.

Nunca amara ninguém como Anita. Nunca vira em outro rosto a razão da vida e nem ouvira em outra voz um tom tão vivaz e ardente. Nunca sentira tão digno da existência ao estar naquela presença e nem tão real ao se localizar no mesmo espaço em que a dama.

O que lhe faltava para que o reconhecesse? O que não tinha para que ela não o amasse? Aquele corpo e aqueles olhos tinham que ser dele. Não admitia que pudesse perder aquela raridade de criatura. Não admitia que fosse de alguém e que pudesse causar prazer a outro homem.

Sentia uma dor irrefutável no peito e na alma. Na existência.

Nem quando o sol sair, a chuva de seu mundo irá passar.

Enquanto vivenciar esse sentimento em suas lacunas interiores sentirá-se indefeso, sentirá-se sempre em meio à tempestade.

Trabalha, come, viaja e faz tudo em meio à chuva. Seus dias sempre estão chuvosos. Sempre está molhado e com frio. Toda a vida estará com o tédio trazido pela chuva. O tédio de se ler jornal e não achar graça, de se ligar a tevê e nada para assistir. De ver as crianças correndo e bagunçando a casa. De ver a esposa reclamando. O tédio do trânsito caótico. O tédio de uma semana chuviscadamente triste passando. O tédio de tentar dormir e o sono não vir. O tédio de uma praia molhada.

O peito aperta. O riso não sai. Se sai, sai falso.

E assim a vida segue, triste, tediosa e molhada. E a mulher amada longe, distante, rindo e flutuando em outros braços quentes e ensolarados.

Antonio Fabiano Pereira
Enviado por Antonio Fabiano Pereira em 14/07/2010
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