Contos de uma Gueixa- Eike

Chego ao endereço combinado. Uma construção de dois andares com pintura gasta e uma porta de madeira talhada com desenhos de dragões e adagas, quando levo a mão para tocar a campainha noto que a porta está entreaberta.

Entro e mergulho num outro mundo. A escada que leva aos corredores superiores tem uma atmosfera misteriosa e ar abafado, cheirando a incenso de canela e aromas de chá.

Lanternas vermelhas, pequeninas e brilhantes estão por toda parte como olhos brilhantes que me conduzem a algo que ainda não sei, mas sinto algo excitando meus instintos misturados ao medo e a curiosidade.

Imagino que vou encontrar na sala ali em cima uma senhora gorda, com um vestido largo cobrindo tudo até os pés, com bijuterias extravagantes, maquiagem meio borrada e lenço na cabeça como uma faixa e aquele olhar morno que tem as pessoas entediadas da vida e de tudo mais, sem vigor.

Um gato siamês desliza elegantemente pelo meu caminho sem dar por mim, alheio a tudo vagueia pela casa como uma alma presa aquele lugar.

Vejo a única sala com uma luz fraca sinalizando que ela pode estar ali. Não sei o que mais me surpreendeu os olhos dela, a roupa, o jeito languido com que se movimenta e os lábios, apenas os lábios muito vermelhos e delineados. Um roupão branco cobre seu corpo contrastando com os cabelos negros que descem displicentes e elegantes por seus ombros.

Como um imã, como um servo, como um escravo de tanta beleza e mistério fiz a única coisa que consegui que foi sentar-me na cadeira de couro em frente à mesa onde ela está e esperar que ela tome a iniciativa e me tire do transe em que estou. Ela certamente sabe que me fascina, deve ver isso nos olhos de todos os homens que tem a sorte de estar diante dela.

Sem dizer nada ela faz um gesto e pede que eu lhe entregue minha mão direita, aberta assim sobre as mãos delas que parecem ser de veludo, dedos longos e brancos, unhas longas e brilhantes como uma adaga afiada. Sinto o toque quente e o olhar dela pousado sobre a grossa palma da minha mão, que rude diferença.

A voz dela é enigmática e sensual. Tem um sotaque indefinido, as palavras parecem música, mas num tom baixo e suave. Quase um sussurro.

Olhou pela primeira vez nos meus olhos e senti como um vento louco me trespassar e um calor de 40º estremecer meu corpo ao mesmo tempo, quente e excitante, rápido e incerto.

Ela toca a palma da minha mão num ponto central e fala sobre um envelope, código. Quase não percebo o que ela fala, estou hipnotizado.

-Não vá embora, ajude-me.

A voz doce e sensual adquire um tom melancólico e sofrido, um pedido de socorro e eu aturdido apenas respondo:

-Sim.

Ela me conduz para outro quarto onde as paredes brancas são iluminadas apenas por um raio de luz vermelha que vem da língua de um dragão preso na parede como um espião do que acontece ali naquele quarto.

A cama de ferro antigo e negro coberta por lençóis de seda brancos e um espelho cobrindo a parede lateral a cama. Olho para um grande espelho que cobre toda a parede ao lado da cama e através do espelho a vejo. Ela simplesmente tira o roupão branco e nua vem em minha direção, me abraça, envolve meu corpo com seu perfume doce e suave, me oferece os lábios sedentos e me desfaz e me refaz apenas em um corpo que queima por um toque das mãos dela.

Não sei o que fazer a não ser confessar que nunca estive antes com uma mulher.

Ela surpresa diz que posso fazer o que sentir vontade e assim deixo meu corpo finalmente deixar fluir todo o fogo do desejo que ela me inspira e sinto o êxtase do meu corpo se confundir com o olhar dela sempre ligado ao meu. Ela se deixa dominar, se entrega aos meus delírios, quase perco os sentidos quando ela ergue o corpo e oferece a prenda dos deuses, o pecado, o tabu de todas as mulheres. Louca e linda.

Acordo sozinho. Meu corpo está coberto de manchas vermelhas do batom dela e dos raios de luz daquele quarto surreal. Saio apressado e vou até a sala onde falamos na noite anterior, ela não está.

A porta está fechada, desço as escadas e quando vejo a rua é como se de repente me visse novamente num mundo diferente. Como se transpusesse uma porta no tempo.

Volto pra casa e vou para o chuveiro tomar um banho, nu dentro da banheira percebo as marcas deixadas pelas unhas dela no meu corpo uma letra apenas "G" e arranhões que agora me fazem ter a certeza de que não foi um sonho.

À noite vou à procura dela, mas quando chego ao prédio o que vejo são restos do que sobrou de um prédio estraçalhado por uma explosão...

continua...........