Mário entorpecido

Mário, ao introduzi-la sentiu o êxtase de sensações esparramar-se por seu organismo. Um misto de gozo e dor difundidos veias adentro penetraram-lhe a sanidade. Sua perna direita já não obedecia à ordem alguma. Fora ela o alvo de sua violência, sua pele reclamava-lhe a invasão de suas vias, cuspia-lhe soro, soro de vida. Por que não acima? Sentia-se confusa. Decidiu por si própria que governar-se-ia a partir de agora.

O pé direito, já suspeitava de sua fidelidade há algum tempo. Contara a Mário numa outra vez, dissera-lhe que a perna era anarquista e traiçoeira. - Cuidado era insuficiente, precário. Era necessário alerta. Entretanto Má, como dizia o polegar esquerdo, era inconsequente e não dera ouvidos ao órgão que já o sustentava ereto por 23 anos.

Track. Ouvi-se célula a célula em seu corpo. Lucy, a perna, girara ao redor de seu próprio eixo 3 vezes. Björk invadia seu pavilhão auditivo com Hunter, vibrando, perturbando seu inerte estado. A dor latente chegara ao cérebro, que a interpretou e respondeu. Disse – Foda-se. Mário fechou os olhos, aqueles malditos pássaros que rodeavam sua cabeça queriam sua pupila nos seus bicos pontiagudos, brancos e vermelhos do sangue que já haviam roubado de seus molares inferiores.

- Mary! Gritou. O cheiro do gás que o inseticida jorrou invadiu respectivamente seu nariz, vias respiratórias, pulmões, organismo, pulmões, nariz e ar. Os pássaros fugiram. Abriu os olhos. Sua perna estava como sempre estivera, seu corpo, apesar da dormência, continuava o mesmo. Não entendeu o que sucedera. Olhou para a agulha, seu conteúdo vazio.

Os olhos pretos de Tereza refletiam-no por inteiro. Seu corpo nu banhado em urina advinda de 450 mL de Bourbon ingeridas horas atrás começava a evaporar, virar chuva. Debruçou-se, a gata miou e pôs-se de barriga para cima com seu negro pêlo. Que o proporcionou um sonho no qual pessoas se transformavam em números complexos, sequências alfabéticas gregas e objetos de masturbação masculina.

Anos passaram-se e aquele sonho permanecia sonhado. Doutorado em complexidade numérica dedicou-se a iludir adolescentes. Mostrando-lhes o surreal amor matemático. Convencido de que viver nada tem haver com odiar. Enganado. Mário. Sempre Mário. Perdido.

Pedro Igor Bento
Enviado por Pedro Igor Bento em 02/07/2010
Código do texto: T2353056
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