O Escorpião e o Sapo
-Foi você que fez isso?
-Foi!
-Por que você fez isso?
-Sei lá...aconteceu!
-Você sabe que, já não é menor de idade? A coisa vai ficar preta pra você!
Foi quando tive acesso a ficha pregressa do meu cliente. Até os 17 anos, viveu em fundações assistenciais de menores, antiga FEBEM, hoje Fundação Casa.
Desconfio que mudaram o nome por causa das barbaridades que se cometiam, nestes centros educacionais/correcionais. Não vou ser hipócrita, a ponto de condenar os funcionários que lá se encontram, nem tampouco pensar que os menores internos são santos.
Também não sou dono da verdade, já que toda uma sociedade arca com o prejuízo de seus atos, quando escolhe e apóia, um Estado ausente e ineficiente, o qual, além de não nos proporcionar, os mínimos subsídios sociais (educação/saúde/segurança) subtraem-nos até mesmo nossa dignidade.
O Fato é que, teria que defender uma pessoa que, passou sua infância e adolescência praticando os mais variados atos ilícitos. Na escola do crime, concluíra o curso com excepcional acuidade, e parecia que agora, iria para uma penitenciária, ou seja, concluiria sua graduação em delitos.
Embora muitos acreditem que a pena privativa de liberdade (cadeia) irá corrigir comportamentos criminosos, recuperando delinquentes novamente para sociedade. Enganam-se, a grande maioria que lá se encontram, só esperam a chance de voltarem para o seio da sociedade, para fazerem o que melhor sabem.
É aptidão inata e latente dos seres vivos, falando mais alto! Por outro lado, resta-nos a esperança inexorável de confiarmos uns aos outros. Acreditamos simplesmente pelo fato inerente à nossa bendita natureza humana.
Ao que tudo indica esse jovem não teve infância, e pelos seus documentos, verifiquei que nem o pai ele conheceu, a mãe o abandonou aos cuidados dos avós, e pelo que pude observar seu crime de latrocínio só configurou, porque ele tirou a vida de uma pessoa que se assustou na hora do roubo.
Segundo os registros do inquérito, ao passar por determinada rua, verificou que este senhor de idade avançada, estava saindo de sua casa, ao abordá-lo, em busca de trocados, o velho disse que não tinha dinheiro naquele momento, porque estava saindo para fazer uma caminhada, mas que poderia buscar em sua casa.
Que infeliz idéia ele teve!
Foi quando o jovem acompanhou-o até sua casa, no caminho, o velho contou-lhe que era viúvo e morava sozinho, pediu para que o jovem levasse o que quisesse, mas que não lhe fizesse mal algum.
Já dentro da casa o rapaz pegou uma sacola plástica, onde colocava objetos pequenos, fáceis de carregar. Foi quando o velho abriu uma gaveta e pegou uma caixa, derrepente uma porta se abriu.
Era um empregado que cuidava do jardim, o rapaz assustado, empurrou o velho que, caiu e bateu a cabeça num móvel da sala. Na tentativa de fuga, tropeçou numa mesa de centro e feriu-se, o jardineiro começou a gritar por socorro, os vizinhos escutaram os gritos e chamaram a polícia.
Como o rapaz estava com a perna machucada, não conseguiu lograr êxito em sua fuga, sendo logo imobilizado pelo jardineiro e um jornaleiro, que sempre conversava com o velhinho ao deixar o jornal.
Para quem não conhece a fábula do "Escorpião e o Sapo", segue aqui a moral da estória:
O Sapo encontrou seu fim, porque acreditou e confiou no Escorpião, mesmo conhecendo sua natureza rude e nociva, o que não o impediu de ajudá-lo.
Paralelamente estórias como esta, vivem se repetindo, não porque a força física dos maus prevaleçam sobre a fraqueza da benevolência dos bons! Mas pelo motivo de todos os seres carregarem consigo esperança, solidariedade e fé, ainda que, muitas vezes latente e inconsciente. Essa reciprocidade de obrigações e interesses permanecem indeléveis, como dogmas inerentes à própria natureza humana.