O MURO

Repentinamente, sem esperar a estrada acaba. Um muro cinzento e gasto pelo tempo se interpõe no caminho dando a impressão de que não há mais nada a fazer. Alto demais para escalar. Sólido demais para derrubar. Extenso demais para contornar.

Hermético não há como devassar. Nenhuma pequena fenda, uma brecha na superfície dura e áspera que permita ver o que há além. Nenhuma porta, nenhum portão que quebre a sua aparente intransponibilidade.

E o pessimismo aponta como o fim de tudo. Nada há nada que faça crer na possibilidade de uma mudança de rota que leve a algo promissor.

Tudo sugere sentar na primeira pedra do caminho e chorar. Lamentar o futuro. Recordar o que passou. E aceitar como inevitável o fim da estrada que leva ao nada. Nada parece haver além.

E o muro cego à frente consegue hipnotizar a mente que, cega, não consegue enxergar o que está tão evidente.

Mas o pouquinho de lucidez que ainda resta faz com que, enfim, perceba a realidade que se mostra de forma tão evidente e que sua mente embotada não conseguira captar e deixara escapar por tanto tempo.

E quem não fora capaz de encontrar uma saída anda agora às voltas com duas estradas, que partindo de um mesmo ponto, levam a mundos diferentes, diametralmente opostos, mas que, igualmente, atraem e chamam a atenção e nos quais quer se emaranhar para descobrir o que há depois daquele muro - um obstáculo intransponível que tanto aterroriza e ao mesmo tempo fascina e atrai.

Sem olhar para os lados, focada num mundo mais além no tempo que está por vir, sem chances de voltar, não nota que, na verdade, a estrada de mão única que parece acabar ali, apenas se bifurca.

E percebe então, com espanto, que enquanto uma leva de volta ao encontro de si mesma num tempo qualquer do passado, a outra sugere o compartilhamento das flores e dos espinhos na marcha lenta e inexorável que leva inevitavelmente ao fim do caminho.

A escolha da primeira opção é partir para uma jornada desigual na qual tanto pode ir até o fim como ficar pelo caminho, defasada enquanto a estrada, que se mostra lúdica e prazerosa, segue seu curso e abre-se para outros horizontes mais promissores. E então talvez não haja mais volta. Nenhuma chance de retomar, de recomeçar do ponto onde parara.

Um lugar aparentemente lúdico, como se fora um parque de diversão, cheio de alegres folguedos. No entanto, para que a brincadeira possa prosseguir será preciso transpor e vencer obstáculos que demandam muita paciência e aceitação. Provas de resistência e obstinação, determinação, vontade.

É optar pela pressa desenfreada dos que têm fome de viver tudo de uma só vez. Um tempo que urge, atropelando o bom senso para não ter que pensar. Na irreverência dos que se acham imortais, pegando atalhos, encurtando caminhos na ânsia de chegar não importa onde esse caminho possa levar.

Como conciliar o “ser urgente” em viver tudo na pressa do hoje que num segundo já virou ontem para dar lugar a um novo amanhã com a calma advinda da certeza que as coisas têm um tempo próprio que não adianta atropelar?

Enquanto a estrada se mostra em toda a sua ambigüidade o muro à frente lhe dá a conhecer um pouquinho dessa realidade da qual não há como fugir. Há muitos caminhos, são muitas as possibilidades de escolhas. Cada um leva a um lugar diferente cujos horizontes se mostram em sua aparência mais externa com as cores do arco-íris enfeitando e dando um colorido multifacetado à paisagem. Como um fruto que se apresenta na forma, nas cores, na textura e na aparência da sua externalidade, mas se preserva na essência só para quem ousar arriscar tudo para provar da sua integralidade.

E por mais que se queira chegar ao âmago, sempre há um muro que se interpõe e vai dosando a entrada até onde é permito ir. Fiel cão tricéfalo, verdadeiro Cérbero guardião da porta do céu ou dos infernos, dependendo do ângulo de visão, dificultando o acesso..

E é nessa ambiguidade que se apresenta a grande dificuldade das escolhas. E são elas que estão sempre presentes.

O destino a quem tanto se imputa a responsabilidade pelas desditas malditas que se apresentam na vida, não é outro senão um sinônimo de escolha.

Desde o sorvete que, diante da enorme variedade acaba-se escolhendo o de sempre, que é mais seguro, são mais certos os resultados, há menos perigo de não gostar do sabor, mesmo que os outros façam o seu apelo.

É o medo das mudanças, do desconhecido. Provar o gosto do desconhecido atrai, mas ao mesmo tempo aterroriza. Feliz de quem tem a coragem de arriscar. Escolher uma estrada e seguir por ela até o fim ou mudar de rumo, corrigir o curso sempre que for preciso, mas nunca desistir.

Como seria bom poder se amparar na imaturidade das crianças que batem o pé até conseguir ter tudo ao mesmo tempo. Não ter que escolher entre coisas diferentes mas igualmente queridas e desejadas. Não precisar viver a incerteza da opção feita entre pegar um atalho para chegar logo ou ir pelo caminho mais longo, porém de rota conhecida que garanta a chegada em segurança.

Não ter que imaginar pela vida afora o que teria sido se outra tivesse sido a escolha. O que teria acontecido? O que teria vivido? Como estaria agora?

Mas aquele muro não deixa ir além do caminho que vinha trilhando sempre. Quando ele se interpõe a única solução é traçar nova rota, escolher outra direção.

Na contramão da história ou seguindo o fluxo natural que foi indicado como o mais sensato.

Nesse instante entra um outro elemento na escolha. A sensatez. O bom senso. Frutos da razão que sempre está em rota de colisão com o coração.

Da introdução desses dois elementos historicamente antagônicos percebe-se que essa escolha não é assim tão fria quanto aparenta. Esses caminhos levam direto ao coração que está falando alto tentando se sobrepor à razão que não quer e nem pode negar a sua origem.

Adivinhar o futuro, prever o que virá...quem há de conseguir essa proeza nessa vida!

Essa história não acaba aqui. Ela fica pelo meio do caminho...dos caminhos que estão sendo trilhados ao mesmo tempo. Um pouco nesse...um caminho que sabe de antemão não vai dar em nada...brincando de viver o hoje...carpe diem sem pensar no depois

Um pouco no outro...tentando construir uma ponte para o futuro, um futuro que nem sabe se há de vir. Um agasalho para proteger o corpo do vento frio do outono. Mas aqui não há outono. Um calor para trocar e aquecer do frio do inverno. Uma sombra pára refrescar nas tardes modorrentas sob o sol inclemente do verão. Uma alegria pra dividir nas frescas e perfumadas manhãs de primavera em flor. Um abrigo para a chuva que vai cair sobre as nossas cabeças.

Antes que anoiteça e se aborreça. Não esqueça. Pode ser que nada disso aconteça.

No meio do caminho tem uma pedra!

Uma pedra no meio do caminho.

Como bem disse o poeta.

Alertas

Despertas

As estradas também ficam desertas!

Alena Ajira
Enviado por Alena Ajira em 08/06/2010
Reeditado em 24/06/2015
Código do texto: T2308578
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