Dona Corina e suas janelas
Dona Corina vivia se queixando: boca seca, falta de apetite, insônia, barulhos estranhos na casa. Vizinhos suspiravam quando os visitava. Entrava pelos fundos e sentava pela cozinha. E ia ficando com seus queixumes. Dona Oscarina, vizinha de frente , conhecida pela sua saborosa comida alemã, já colocava um prato a mais na mesa comprida.
Cada dia, Dona Corina almoçava em uma vizinha diferente, porém Dona Oscarina era premiada com essa visita estratégica, duas vezes por semana. Comentava-se que Dona Corina não tinha dinheiro para se alimentar direito. Outros juravam que era preguiçosa. Até suas janelas permaneciam fechadas.
Era o começo de junho, quinta-feira, feriado religioso. A vizinhança surpreendeu-se ao perceber suas janelas abertas: Dona Corina não só escancarara suas janelas, como as ornamentara com toalhas de linho e bordados, castiçais e flores. A casa, no entanto, parecia vazia.
Dona Oscarina ficou preocupada: seria sinal de um velório típico da fronteira, lugar de origem da vizinha? Foi até lá. Chamou e nada.
Meia hora depois, havia, na rua, outras janelas enfeitadas. Mas Dona Corina nunca demonstrara interesse ou reverência à procissão de Corpus Christi...
Mais uns minutos e a procissão dobrava a esquina da rua principal e entrava , jogando pétalas coloridas, pelos paralelepípedos da rua da vizinhança.
Eram anjinhos e mais anjinhos brancos e azuis, de asas de algodão ou penas de ganso. As mulheres foram para frente de suas casas olhar a procissão—eram protestantes ou católicas não-praticantes.
Dali a pouco, grita Seu Herbert:
"Olhem , lá, na terceira fila dos anjos! Olhem! Lá vai Dona Corina, vestida de rosa e asas de papel crepom! Dona Corina de anjo, no meio da gurizada! Enlouqueceu!”
Todas olharam e, boquiabertas, fitavam a vizinha que seguia alheia a tudo. De repente, sentiram um sopro leve. Ouviram farfalhar de borboleta. Olharam a procissão. Quando essa passou pelas janelas de Dona Corina, a anja rosa, de asas de papel crepom, alçou voo. Dona Corina voava!
As vizinhas observaram que as janelas de sua casa fechavam-se. Voltaram seus olhos para o céu: longe, muito longe, a vizinha, daqueles perpétuos lamentos e da cozinha fria, furava nuvens com suas penas de papel crepom.
Imagem: Google
Dona Corina vivia se queixando: boca seca, falta de apetite, insônia, barulhos estranhos na casa. Vizinhos suspiravam quando os visitava. Entrava pelos fundos e sentava pela cozinha. E ia ficando com seus queixumes. Dona Oscarina, vizinha de frente , conhecida pela sua saborosa comida alemã, já colocava um prato a mais na mesa comprida.
Cada dia, Dona Corina almoçava em uma vizinha diferente, porém Dona Oscarina era premiada com essa visita estratégica, duas vezes por semana. Comentava-se que Dona Corina não tinha dinheiro para se alimentar direito. Outros juravam que era preguiçosa. Até suas janelas permaneciam fechadas.
Era o começo de junho, quinta-feira, feriado religioso. A vizinhança surpreendeu-se ao perceber suas janelas abertas: Dona Corina não só escancarara suas janelas, como as ornamentara com toalhas de linho e bordados, castiçais e flores. A casa, no entanto, parecia vazia.
Dona Oscarina ficou preocupada: seria sinal de um velório típico da fronteira, lugar de origem da vizinha? Foi até lá. Chamou e nada.
Meia hora depois, havia, na rua, outras janelas enfeitadas. Mas Dona Corina nunca demonstrara interesse ou reverência à procissão de Corpus Christi...
Mais uns minutos e a procissão dobrava a esquina da rua principal e entrava , jogando pétalas coloridas, pelos paralelepípedos da rua da vizinhança.
Eram anjinhos e mais anjinhos brancos e azuis, de asas de algodão ou penas de ganso. As mulheres foram para frente de suas casas olhar a procissão—eram protestantes ou católicas não-praticantes.
Dali a pouco, grita Seu Herbert:
"Olhem , lá, na terceira fila dos anjos! Olhem! Lá vai Dona Corina, vestida de rosa e asas de papel crepom! Dona Corina de anjo, no meio da gurizada! Enlouqueceu!”
Todas olharam e, boquiabertas, fitavam a vizinha que seguia alheia a tudo. De repente, sentiram um sopro leve. Ouviram farfalhar de borboleta. Olharam a procissão. Quando essa passou pelas janelas de Dona Corina, a anja rosa, de asas de papel crepom, alçou voo. Dona Corina voava!
As vizinhas observaram que as janelas de sua casa fechavam-se. Voltaram seus olhos para o céu: longe, muito longe, a vizinha, daqueles perpétuos lamentos e da cozinha fria, furava nuvens com suas penas de papel crepom.
Imagem: Google