DE OLHOS ABERTOS, AO PÉ DA ESCADA

Dia após dia, a menina vizinha olhava aquelas cortinas cerradas como a vida do lado de dentro: casulo que não se abria, não tecia fios de seda, não desvelava asas finas, transparentes, coloridas a voejarem livres em direção do horizonte.

No arremate de cada tarde, a sombra de uma pequena silhueta espreitava através da janela o vento que se espargia lá fora. Os cabelos da jovem sentada ao pé da escada esvoaçavam emaranhando os fios, enquanto apanhava folhas secas que se desprendiam do tronco mãe, na terna despedida do verão.

Guardava-as uma a uma, numa caixa de madeira talhada com mãos de artista. Uma cena ímpar e melancólica.

As folhas não alcançavam o alto daquela janela, os sonhos passavam distante, o sorriso era estreito, sem a mínima chance de se alargar.

Já era quase noite, quando a campainha anunciou sua presença em meio à ausência de qualquer outro som.

Envolta em laço de cetim bege, adentrou a caixa de folhas secas. A caixa que outrora havia acolhido objetos preciosos de sua avó.

Numa mão, a doce menina vizinha fazia reverência aos retalhos do esplendor da natureza, na diversidade de formas e tons de marrom. Na outra, a vida, representada por um vaso de minúsculas violetas aveludadas para serem apreciadas e cuidadas a cada amanhecer.

A cor da vida do lado de fora, nos primeiros passos do lado de dentro...

heleida nobrega
Enviado por heleida nobrega em 28/05/2010
Código do texto: T2285122
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.