Karla teve uma vida abundante, plena.. casou-se aos 17 anos, com Adolf. União baseada em um amor sublime, verdadeiro.

Durante toda a sua vida, jamais houve razão alguma, para que,   não pudesse confessar a abundante felicidade por ela vivida em família.

Mãe de três lindos filhos: Anne, Laura e Freud. Todos formados e independentes financeiramente. Porém, afetivamente  muito ligados aos pais. Uma família próspera e feliz. Todos adultos e com suas famílias formadas.

Karla vivia e via a multiplicação de sua família, três filhos e oito netos que, fazia os seus dias, mais felizes do que já vivera ao lado de Adolf... A doutora Karla, aos 76 anos de idade, sabia o que era paz, equilíbrio familiar e financeiro. Dedicou-se com esmero e  prazerosamente a família e a medicina, ao lado do seu amado esposo Adolf, também médico, e que, contava seus 84 anos, sem abrir mão do exercício profissional. Agora, se depara com  um diagnóstico, bem claro, para ambos, sobre uma enfermidade cruel, incurável que, estava desde então arrebatando-lhe a vida.

Começa então, a viver e conviver com as intempéries da vida. Ela não tinha esperanças e nem tampouco seu esposo.  Como médicos, conheciam bem cada estágio e o agravamento progressivo do mal que lhe acometera. O que Karla não queria e não só temia, porém, tremia de medo era de sofrer as dores terríveis que ela tão bem conhecia.. Passaram-se cinco meses. E, Adolf sentiu-se mal.

 Os filhos pensaram ser resultante das preocupações. Do estresse, por presenciar o desespero de sua esposa e às consequências pelo sofrimento mútuo.

Adolf foi medicado e, logo foram requisitados exames. O Dr.Harold, seu colega o atendeu e fez questão de continuar assistindo-o.

No dia seguinte, o Dr. Harold liga para o filho de Adolf e constrangido lhe expõe o quadro clínico de seu pai.. Um câncer, em estágio adiantado.

–Deus! Como pode? Por quê? Estamos a perder os nossos pais, de uma só vez?

Freud não conseguia entender. Reuniu os irmãos e, contou-lhes a terrível notícia. Grande desespero! A paz que, era peculiar, aquela família deixou de existir. Porém, diante dos seus princípios éticos, de total transparência familiar, não poderiam esconder dos pais, o cruel resultado.

Reuniram-se e choraram juntos.

Os doutores, porém, receberam a notícia pelos filhos, de uma forma muito estranha.. Eles – os filhos –  puderam presenciar, após um longo tempo de sofrimento, uma calma inquietante no semblante dos seus pais. Foi desconcertante para todos. Eles não entendiam as suas reações.. A doutora Karla trazia no rosto sofrido, uma espécie de riso calmo.. e, o doutor Adolf segurava às mãos da esposa, acariciando-as.., com àquele  mesmo sorriso de cumplicidade.  Sim, havia algo entre eles...

 Era como que, tivessem conversado sobre algo  e/ou resolvido alguma coisa que, até então, queriam  ocultar dos filhos, da família.  Mas, que não passou despercebido por  nenhum deles.

 

O doutor Adolf, que desde o diagnóstico da esposa, resolvera tirar licença,  durante toda a sua vida jamais fizera, vivia dia e noite ao lado de Karla. Naquela manhã, ensolarada, Karla e Adolf reuniram a família, para enfim, explicitar o desejo irredutível de ambos, concernente as suas vidas.

–  Meus filhos, meus netos, queremos que vocês nos ouçam, sem interrupções, sem histerismos, mas, com a mesma calma que, vocês tem presenciado em nós, nos últimos dias. Pois, precisamos que nos ajudem a concretizarmos o último desejo de nossas vidas. Somos médicos, e durante o longo tempo em que, exercemos a oncologia, medicina do câncer, vimos e sabemos de todo o sofrimento, pelo qual, passam os vitimados por esse horrendo mal. Vivemos uma vida plena; concretizamos em vida, quase tudo que sonhamos; temos uma família linda e, não queremos vê-los definhar com o nosso sofrimento futuro. Sabemos que, não haverá uma morte calma para nós. Portanto, tomamos uma decisão: ajude-nos! Iremos a Suíça, ou a Inglaterra. Queremos nos inscrever em uma “clínica de suicídio assistido”. Pesquisaremos onde melhor poderemos estar nos últimos momentos de nossas vidas. Não nos neguem o direito de escolher entre a dor e a paz. Pois, morrermos dignamente, sem dor, e sabermos que estamos a poupá-los dos  sofrimentos que, com certeza, todos vocês passarão assistindo ao nosso sofrer, é tudo quanto desejamos. Não nos obriguem a isso!

 Todos ficaram como que, em choque!

Jamais poderiam imaginar tal determinação dos seus pais. Tão cheios de vida... Felizes! E, de repente, tais diagnósticos sucessivos.. E, como se não bastassem, agora, vem esse discurso macabro, infernal, inaceitável...!

Karla era agnóstica, não acreditava em Deus, por Sua existência não ser cientificamente comprovada. Porém, não descria da existência de um ser supremo. Só nisso, havia discordância entre eles, e, essa de forma educada. Pois, o seu esposo Adolf,  sendo ateu, não cria na existência de Deus e, em nada, além da evolução natural das coisas.   

Um silêncio oriundo da perplexidade de todos invadiu o aposento. E, um por um, saíram sem dizer palavra. Desceram as escadas do andar superior da casa dos pais e adentraram a biblioteca, como que, planejado. E, a portas fechadas, se abraçaram.. choraram, até que, Freud quebrou o silêncio.

 – Como podemos concordar com tal atitude, com tal decisão? É assassinato!

Art 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos;  Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de dois a seis anos..

Infelizmente, existem essas clínicas de suicídio assistido, porém, a eutanásia é e sempre será assassinato! E, os que se dizem médicos, assistentes de tal ato, não passam de cúmplices nesses assassinatos.. Sou contra a eutanásia  -  se encontra disposto no caput do art.13 do CC/02, in verbis:

Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes -,

tanto quanto, da distanásia, pois, não podemos terminar uma vida antes do tempo, nem tampouco prolongá-la, como em casos  que, foi comprovada a morte cerebral do paciente, porém, ele é mantido vivo, através de o “ventilador mecânico”. Prolongando-lhe o sofrimento!  

–  Eu sei, Freud.. mas, como proceder, diante da serenidade e decisão de ambos? Lembremos da argumentação deles..

– Anne.. lembremos de Deus; lembremos da Lei dos homens.. Eu sou advogado, como trair a minha crença na Lei e em Deus?

Art 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos;  Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de dois a seis anos...

Você não diz nada Laura?

Ó Freud! Estou petrificada com os últimos acontecimentos da nossa família.. Porém, estou meditando em um artigo que li há pouco tempo na Net. O artigo fala a respeito da Dignitas. Uma clínica de suicídio assistido inglesa. Tal artigo chamou-me a atenção tal absurdo, postado em um artigo da Web.

“O Times fala a respeito de mais de 100 britânicos  terem colocado fim em suas vidas na popular clínica britânica Dignitas.

Que, não foge às inúmeras críticas por suas atividades. Existem denúncias de que, nem todos que procuram os seus serviços são doentes terminais. Estas são informações do jornal “Guardian” 21/06. O dito jornal obteve uma lista de 114 pessoas do Reino Unido que concretizaram  o suicídio assistido nessa clínica.

 Entre esses, fatos absurdos, tal qual, o de um casal, que tinha apenas problemas intestinais, três pessoas com problemas renais e outra que sofria de artrite. Tudo isso causou espanto e horror no professor Steve Field, do Royal College of General Pactitioners.

Uma antiga  funcionária da Dignitas de nome: Soraya Wernli de 51 anos de idade, criticou certas práticas da clínica, em um artigo no dia 19/07. Wernli disse ao “Sunday Times” que, a Dignitas era uma máquina de fazer dinheiro para o seu proprietário Ludwing Minelli. Conta ainda que, persuadiu com êxito, a uma paciente com câncer, a desistir de cometer o suicídio assistido. Encorajou-a dizendo da possibilidade de ela ter uma vida digna e de enfrentar a enfermidade, através de medicamentos. Tempos após, a mulher escreveu agradecendo-lhe a vida”.

 

Bem, diante de todos esses fatos, não posso concordar com a eutanásia, sou da mesma opinião de Freud.. E, você Anne?

 – Eu... penso neles. No que estão esperando de nós... Eles não percebem o que, estão a fazer conosco. Estão colocando às suas próprias vidas em nossas mãos! Não consigo entender.. Como podem, são médicos, fizeram o juramento de Hipócrates, como fugir?

 –  Você conhece o procedimento dessas clínicas, Freud?

Perguntou-lhe Anne.

– Sim! Já debatemos a respeito na faculdade... 

Bem, os pacientes, por vontade própria e de pleno acordo com a família, são levados a essas clínicas, tem o direito de desistir até o último momento, de praticar o ato. Assinam a documentação se responsabilizando pelo ato, assim como,os que, lhes  acompanham. Instalam-se em um quarto bonito, bem decorado e alegre, com cama de solteiro,  mesa com cadeira, janela que geralmente mostra uma linda paisagem e/ou jardim. Tudo é filmado. O médico que assiste ao ato mortal prepara a dose de barbitúrico que, é deixado à mesa, para que o paciente o ingira. Jamais alguém escapou a tal receita.
Finalizado o ato, a polícia é chamada, depois da verificação dos fatos, de posse da filmagem, se tem a “receita da morte” legalizada.

– Assim, Freud...?

– Dessa forma... Laura!

Enfim, decidiram. Não permitiriam tal absurdo! Amenizariam o sofrimento dos seus queridos, através de medicamentos; estariam com eles até o fim. Sem que, assim, praticassem a eutanásia, ou, ortotanásia –o não prolongamento do processo natural de morte, posição diametralmente oposta à distanásia –. E, assim, aconteceu naturalmente, sem dor.. Só a da família.

 

 

EstherRogessi. Conto: DOLOROSA ESCOLHA. Categoria:Narrativa. Imagem: Web. Fonte: Agência Câmara e pesquisa Web. Filed Under (Uncategorized, Eutanásia) by Dra. Tania Leimig on 25-10-2009. 22/05/10

EstherRogessi
Enviado por EstherRogessi em 21/05/2010
Código do texto: T2270526
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