Leonolra

Entoando-me ao partir e junto aos vocábulos que se obliteravam ficando além de meus ouvidos, rememoro-me de pouco, contudo do suficiente, falou-me: “Boa Noite tenha sonhos celestiais e durma leve como a pluma de teu leito”.

Elucubrei-me a refutar as palavras, que lhe serviriam para massagear o ego e a soberba orgulhosa. Lembraria de ser boa e fortuna e esquecer-se-ia de todo o passado, focando-se no presente ou no decorrido hodierno. O agravo não lhe era uma memória viva, como a dor que sentia a vergastar meus aforismos e caso eu viesse a fenecer, liber-taria de suas antigas ações e com o peso de suas últimas palavras livrar-se-ia do dolo de uma vida. Escusas dignas de quem dar-me um adeus infindável. Dissimulei-me de i-mediato, assim a deixando com a culpa e para que a mesma soubesse que não a escutei, olhando-a com um ar desentendido como quem não ouvira nada e com a mão esquerda apenas acessei, ausentando-me do perdão e a expondo que assim como veio e fora per-maneci o mesmo. Transformei-me em algo superior empós deflorar esta filosofia pecu-liar. Quem lhe deseja algo, deseja-te o inalcançável, pois de antemão sabe que não po-derá realizar. A voz da esperança pérfida e vocábulos a prescindir. Ainda que obstina-damente fecham-se meus olhos diante tua luz negra – vejo-a além da face que devora. Atroz, oculta, cuja palavra consista em parecer o que não é, e ser o que não foi. A carru-agem partira, um lenço despencara e ela se fora.

Leonolra tinha tanto a humildade de perguntar o que não sabia, quanto à arro-gância de esclarecer o que já sabe. Era como olhar para seu corpo, sua reflexão, suas juízas e ter tudo aquilo que se valoriza e admiraria, oferecendo somente a uma pessoa que vive em seu mesmo mundo. Uma mulher fabulosa como pessoa e linda como mu-lher. Apesar de falar muito e admitir conhecer muitos assuntos, acredito que o laconismo é tudo quando hipocritamente somos extensos, devo acrescentar que era uma heresia não apaixonar-se por tal mulher. Seus olhos embriagavam-me, seus toques não intencionais; segundo ela, deixavam-me tremendamente cálido e seus lábios despertavam-me sentidos ocultos e inefáveis.

Abster-se de fazer algo que lhe é agradável renunciando seu cerne e afloran-do o seu não ser, por razão a um amor que lhe foi apalavrado é de tudo a pior das perdi-ções. Demorei tempo por demais a perceber isto. Um tempo tão extenso que me fere, só de saber que no fundo talvez já o soubesse como o seria. Malditos são os pensamentos infortúnios, por diabos, como dói, como não cessa e como não me deixará esta dor.

Conhecê-la foi fácil, cativá-la talvez, entretanto não amá-la fora difícil. A pri-meira vez que a vi, estava com um vestido cetinoso, revestido com ornatos – nada ex-travagante. Era uma festa familiar em que os familiares comparecem com seus outros familiares e, portanto muitos desconhecidos apresentam-se e desfrutam do festim como um belo e verdadeiro sangue da família. Uma prima minha, deu-me a honra de apresen-tar-me como o primo mais astuto e bonito, afinal entre primos e primas há certa dispensa de nomes e reveste-se com adjetivos e predicativos. Tomei-a pela mão e osculei-a o assaz para demonstrar um respeito aliciador, convidei-a para inebriar algo e conversar; ela aceitou. À noite fora longa o suficiente para render-me um novo encontro em um novo lugar. Quando finalmente deitei-me no leito, refleti sobre o festim e a tal mulher encantadora e fabulosamente linda que estava cativando-me.

No dia seguinte decidi ir até a casa dela, assim como quem não quer o que deseja e não abre mão de seu desejo. Caminhava com um sorriso tolo em meu rosto, um dos melhores sorrisos a se dar, um sorriso sem motivo ou desígnio. Afinal gostar do desco-nhecido é paixão, continuar a gostar após conhecer é amor e ao fim – dor.

Acheguei à frente de sua casa e pedi que comunicassem minha presença, entre-tanto ela não estava presente. Fora até a casa de uma prima, enferma. Pensei vagamente em ir atrás e demonstrar um afeto altruísta com a intenção de comovê-la e promover-me como um ser distinto e complacente, mas não.

Diego Martins
Enviado por Diego Martins em 26/04/2010
Código do texto: T2221119
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