A Pedra
Inerte, meio que atrapalhada. Cândida e fosca, robusta e não lapidada. Pedra po-lida, pedra preciosa, pedra de toque, pedra filosofal – não. Quebrada estupidamente, era pedra lascada mesmo, sem valor ou ornato. Não tinha um nome próprio, seu.
Despencada entre outras tantas (a maioria como ela), ainda estava no mesmo lu-gar, pois não passava de cinco e vinte da manhã. As pessoas iniciavam sua caminhada em torno das seis horas em diante. Correndo, levando seus animais de estimação; que defecavam e urinavam por onde transitassem, andando em pares ou apenas sentadas em bancos a orla do lago.
Sua visão era fascinante, de frente para o lago, em um daqueles dias primaveril, em que chove folhas das árvores, nascem flores na terra e peixes saltam da água. Era o melhor dos presentes aquela tal paisagem, levando em consideração, que nunca na vida tivera escolha de onde ficara ou para onde iria, nunca sabia, nunca desejava. Tinha a pior e mais atroz concepção, não era dependente de si mesma, dependia de outrem, outrem que lhe olhava como pedra e com o pé esquerdo ou direito a colocaria distante de qualquer lugar assim, ou com a mão a pegasse entre os dedos e arremessa-se o mais longe possível de si.
O sol brilha mais forte que dantes – seis horas. O ambiente começa a se encher do calor frigido humano. Tudo ocorre como o descrito. Um cachorrinho põe-se a urinar sobre os cantos e as pedras. Os humanos correm, riem, falam, blasonam, sentam. Um deles se aproxima e chuta uma das pedras com o pé esquerdo, colocando-a distante das outras e da paisagem – sozinha, quem sabe para tentar sanar a solidão que sempre carregará consigo...