A lenda do lobisomem

Quando eu era criança, minha casa ficava próxima de um bosque, e na escola onde eu estudava as professoras costumavam nos levar para fazer piquenique lá. Esse lugar era muito bonito, tinha árvores enormes, cômoros maravilhosos dourados pelo sol nos quais rolávamos de cima a baixo e tudo isso tinha aos seus pés a beira da Lagoa dos Patos. Nesse local havia uma casa bem simples, constituida apenas de um cômodo que ficava bem longe, entre as árvores e nos provocava um misto de curiosidade e medo. Nessa casa diziam que morava um homem de aspecto muito sinistro, ele era alto, magro, com uma enorme barba e sempre usava roupas pretas. Dificilmente era visto no bosque e sua casa estava quase sempre fechada e deserta. Numa linda noite de lua cheia, muito calma, a lagoa estava tranquila e dizem que em noite de lua cheia a pescaria rende mais, pois os crustáceos e peixes saem para se reproduzir e como não deveria deixar de ser, um pescador das redondezas resolveu lançar sua rede por aquelas bandas.

Ele já havia ouvido falar do tal homem e de suas peripécias, mas não levava tão a sério essas histórias de quem não tem o que fazer, dizia ele. O pescador carregou o barco de peixes de todos os tipos e tamanhos, foi uma excelente pescaria para ele. Devido ao adiantado da hora ele resolveu parar e se dirigiu para a terra. Sua felicidade era imensa, pois há dias não tinha tanta sorte numa pescaria. O homem foi remando até a praia e de repente se lembrou do mistério do lobisomem, seu coração bateu mais forte, mas ele não deu bola e seguiu remando. Quando já avistava as árvores, pareceu-lhe que de repente um vulto se mexia por entre elas. Imediatamente parou de remar e aguçando todos os seus sentidos se pôs a observar o que acontecia naquela noite de lua cheia que se refletia na lagoa. O homem de imediato sentiu-se vulnerável, pois, onde estava com aquela luz toda sobre si, estava em desvantagem quanto ao inimigo. E agora, o que fazer? Resolveu esperar as coisas se acalmarem e continuou a observar. Enquanto isso, na margem, o vulto negro se retorcia e corria de um lado para o outro da praia, como se estivesse praticando um ritual em presença da lua. O pescador estava ficando apavorado com aquela cena. O vulto parecia um misto de homem e de animal, que minutos depois começou a uivar para a lua como se esta fosse um Deus ou coisa parecida. O pescador esfregava os olhos, tentando não se deixar levar por aquela cena tão apavorante e dizia para si mesmo: _ isso não está acontecendo comigo, é uma ilusão, vai passar logo, logo.

Esperou tanto que acabou adormecendo no barco. Algumas horas depois despertou com a luz do sol já raiando, numa manhã calma. Mal acordou e se pôs a observar a margem para ver se localizava o animal sinistro da noite passada. Qual não foi sua surpresa, o vulto havia desaparecido, e olhando em sua volta, constatou que as redes ainda estavam no barco conforme as havia trazido de casa. Sua mente estava muito confusa, pois o que aconteceu afinal? Onde estavam todos aqueles peixes maravilhosos que ele havia pescado? E o vulto meio homem, meio animal que avistara, onde estava? Nem a lua que era a sua única testemunha estava mais lá. Desse dia em diante a lenda do lobisomem se espalhou pelas redondezas, se falou nisso durante anos. Ninguém mais se aventurou a pescar em noite de lua cheia e aos poucos o bosque foi sendo desmatado e povoado. Nunca mais se ouviu falar do homem que morava lá e o nosso pescador conta até hoje essa história que todos duvidam que tenha acontecido. Mas é melhor prevenir, não é?

De passagem
Enviado por De passagem em 03/04/2010
Código do texto: T2175104
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.