fora de área
Rosa Pena
Quase ninguém sabe o número do meu celular. Ele é usado apenas para rápidos recados, busca de onde está a dona ou a dona tentando buscar a filha. A família sabia onde eu estava e minha filha aqui estava. Estranhei ele tocar de repente na sala de espera do meu dentista.
Uma deliciosa voz masculina falou baixinho:
— Vanda, tô te esperando.
Respondi:
— Onde?
— No lugar de sempre. Onde você está?
— Tô no Nunca.
Ele sorriu e sacou o engano.
— Desculpe, vozes e números parecidos.
— Nada a perdoar.
— Adorei essa de estar no Nunca.
— Antítese do sempre.
— Bem-humorada!
— Tenho que ter senso de humor pra me olhar diariamente no espelho.
— Se acha feia?
— Acho que já fui bonita.
— Crise de idade?
— De dente, de corno, de saudade, de vontade, de grana.
— Vai fazer o que agora?
— Um canal.
— Engenheira?
— Professora.
— Canal no papel?
— Na boca.
— Ah, tá no dentista! Estou atrapalhando?
— Não, está gastando seus pulsos nos seus impulsos.
— Não importa, a espera estava desgastante.
— Vanda te deu um bolo?
— Acho que ela me deu mesmo foi uma festa completa.
— Tem cajuzinho aí?
— Você me fez sorrir como não faço há muito.
— Você me fez não chorar como não faço há muito.
— Quem tá deprimida não tem esse seu espírito esportivo!
— Disfarce. Sou mentirosa, sabia?
— Mentirosa loura ou morena?
— Morena.
— Casada ou solteira?
— Viúva.
— Posso ligar de novo, outro dia?
— Não.
— Quer saber pelo menos o meu nome?
— Apelidei-o de Wando.
— Por causa da Vandinha?
— Não, por causa da calcinha!
— Não entendi!
— Com esse seu H, deve colecionar.
— Virei rubro-negro.
— Como?
— Rosto vermelho em corpo moreno.
Ele não fez por menos. Fiquei em silêncio. Tesão é remédio pra dor de dente! Vou ganhar o Prêmio Nobel em odontologia. Acordei da premiação com ele perguntando:
— Seu nome?
— Sou Vasco, sou Vanda, sou Volúpia, sou Veneno.
— Deixa, por favor, eu ligar novamente. Só pra dar um olá!
— Não e não.
—Devo desligar já?
Quem desligou fui eu, ofegante pra dedéu. Entrei no consultório de boca aberta, facilitando o trabalho do doutor. Fujo do OI. Meu coração teima em permanecer VIVO, e é CLARO que com um cara assim, vai fazer TIM. Mais um engano e eu entro pelo cano! Prefiro me manter à distância. Sua chamada, meu iaiá, meu ioiô, não poderá ser completada.
A loura casada já está fora de área há um tempão.
LIVRO UI!
Rosa Pena
Quase ninguém sabe o número do meu celular. Ele é usado apenas para rápidos recados, busca de onde está a dona ou a dona tentando buscar a filha. A família sabia onde eu estava e minha filha aqui estava. Estranhei ele tocar de repente na sala de espera do meu dentista.
Uma deliciosa voz masculina falou baixinho:
— Vanda, tô te esperando.
Respondi:
— Onde?
— No lugar de sempre. Onde você está?
— Tô no Nunca.
Ele sorriu e sacou o engano.
— Desculpe, vozes e números parecidos.
— Nada a perdoar.
— Adorei essa de estar no Nunca.
— Antítese do sempre.
— Bem-humorada!
— Tenho que ter senso de humor pra me olhar diariamente no espelho.
— Se acha feia?
— Acho que já fui bonita.
— Crise de idade?
— De dente, de corno, de saudade, de vontade, de grana.
— Vai fazer o que agora?
— Um canal.
— Engenheira?
— Professora.
— Canal no papel?
— Na boca.
— Ah, tá no dentista! Estou atrapalhando?
— Não, está gastando seus pulsos nos seus impulsos.
— Não importa, a espera estava desgastante.
— Vanda te deu um bolo?
— Acho que ela me deu mesmo foi uma festa completa.
— Tem cajuzinho aí?
— Você me fez sorrir como não faço há muito.
— Você me fez não chorar como não faço há muito.
— Quem tá deprimida não tem esse seu espírito esportivo!
— Disfarce. Sou mentirosa, sabia?
— Mentirosa loura ou morena?
— Morena.
— Casada ou solteira?
— Viúva.
— Posso ligar de novo, outro dia?
— Não.
— Quer saber pelo menos o meu nome?
— Apelidei-o de Wando.
— Por causa da Vandinha?
— Não, por causa da calcinha!
— Não entendi!
— Com esse seu H, deve colecionar.
— Virei rubro-negro.
— Como?
— Rosto vermelho em corpo moreno.
Ele não fez por menos. Fiquei em silêncio. Tesão é remédio pra dor de dente! Vou ganhar o Prêmio Nobel em odontologia. Acordei da premiação com ele perguntando:
— Seu nome?
— Sou Vasco, sou Vanda, sou Volúpia, sou Veneno.
— Deixa, por favor, eu ligar novamente. Só pra dar um olá!
— Não e não.
—Devo desligar já?
Quem desligou fui eu, ofegante pra dedéu. Entrei no consultório de boca aberta, facilitando o trabalho do doutor. Fujo do OI. Meu coração teima em permanecer VIVO, e é CLARO que com um cara assim, vai fazer TIM. Mais um engano e eu entro pelo cano! Prefiro me manter à distância. Sua chamada, meu iaiá, meu ioiô, não poderá ser completada.
A loura casada já está fora de área há um tempão.
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