Uma história quase nada



Uma história de nada, a canseira, a janela. Um vulto partindo, última lembrança. O pó da estrada ia longe e no longe, mais nada senão a serra e a mata de verde quase cinza. Os olhos arrastados de preguiça nadavam no cheiro da fumaça saída de trás da casa. O sol quente, o mato queimado e o céu limpinho como queria Deus. Ninguém passando àquela hora de silêncio, mais profundo se não fosse o rangir dos dentes de um serrote na madeira seca, mais para cima do bananal fechado em pencas.

A noite estrelada, o sono imprestável, a cama quente. Janela esticada para dentro da noite escura e ela pregada. Os olhos navegando a escuridão feito navio sem bússola. Cheiro de damas da noite galopeando para depois da terra. Amarradas pelos cipós, pequenos fantasmas inertes, que a lua aguçava. Afastada, uma faísca de luz parece acenar: só as ramas das árvores zombando na paisagem deserta.

Noite, dia, dia, noite, a janela no vento, os olhos nas cercas e no abandono dos quintais. Mais olhos, derramados, por vezes, na imensidão do chão de barro batido, no espelhinho redondo, caixinha de segredo guardado a sete chaves. Conversa nenhuma, a voz perdida no tempo que foi. Pior silêncio, o que não tinha mundo. Pior silêncio, o que era, em silêncio.

Era por nada não. Noite assim, só no verão que ia acabando. Mais um pouco esfriava. Quase hora de Tonho voltar...
Eliana Schueler
Enviado por Eliana Schueler em 10/03/2010
Código do texto: T2130460
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