A noite de Jorge
Havia muito tempo Jorge não saía sozinho com a patroa. Os filhos pequenos tomavam conta do tempo do casal, que faziam sempre os mesmos programas, aqueles em que só as crianças se divertiam. Mas naquele dia não, aniversário de casamento, aquele era um dia programado para eles, a vó fora quase que convocada a dar sua participação na pequena lua-de-mel do casal.
Para impressionar Ana, Jorge, sabendo que tão cedo não teria outra oportunidade como aquela, pensou em levá-la num restaurante muito elegante que tinha um deck com vista para o mar, indicação do seu chefe, e em seguida, depois de uma romântica caminhada na praia ao luar, a levaria a um motel que pesquisara na internet.
Naquela noite lembrou-se de ser o homem perfeito a sua esposa, abriu-lhe a porta do carro, não usou expressões debochadas quando ela parava em frente às vitrines de lojas absurdamente caras, e ainda puxou-lhe a cadeira no restaurante. Elegantemente sentados, deslumbrados com a decoração aconchegante do ambiente, mas principalmente pela vista e sons vindos das ondas que batiam na areia, Jorge sentiu-se orgulhoso do seu plano, tudo estava perfeito.
Mais elegante que os dois pombinhos, um garçom, finamente apresentável, com um tom de voz impecável, avisa-os que ali fora no deck era necessário que se tivesse reserva. Olharam para os lados para terem certeza de que realmente estavam a sós, e ficaram intrigados com o anúncio. Sem ter o que fazer, já que ele não se atentara em fazer a reserva, não tiveram escolha a não ser aceitar o convite do garçom de jantarem dentro do restaurante. Outro garçom fora atendê-los e discretamente explicou-lhes que para desfrutar das mesas do lado de fora do restaurante era necessário um consumo mínimo de R$ 700,00. Lá dentro não tinha de perto o romantismo do deck com a vista maravilhosa, no entanto sua preocupação em não estragar a noite fez com que Jorge procurasse continuar com o ar de sorriso no rosto e dar continuidade ao assunto de suas memórias afetivas com a amada.
Assim que receberam o cardápio começaram uma busca tensa sobre qual o prato poderiam pedir sem que saíssem sem pagar. Ainda acreditando que era possível comer alguma coisa ali e salvar o jantar, Jorge convida Ana a beliscarem uns queijos com um vinho, o mais barato da carta de vinhos, diga-se de passagem. O que é fome diante de uma noite de luar, com as ondas lambendo seus pés quando se está de mãos dadas com o seu amor? Fingindo saciedade, os dois foram para o tal motel precisamente pesquisado por ele. Um daqueles, segundo as fotos do site, que cada quarto tinha um tema, um com selva em que se podia brincar de Tarzan e Jane; outro onde a pessoa se sente um verdadeiro romano; um que se podia jurar que estava no espaço e todo o tipo de loucura que se pode imaginar.
Chegando ao local determinado pelo mapa, já que era um local distante do centro da cidade, o lugar se apresenta um tanto esquisito. Tudo escuro e com ar de abandonado. Estava abandonado. O lugar fechara havia um ano. Olharam-se desanimados. Voltaram para casa. Comeram sobras frias de pizza e foram dormir. Na sala, pois a cama de Jorge já estava ocupada com a sogra.
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