Buscando o amanhã IX - capítulo VIII

CAPÍTULO VIII:

Lore o encarou, sabendo que ele tinha razão.

Felipe ergueu a lâmina no ar e preparou-se para crava-la na moça, quando uma outra espada cruzou-se com a sua e forçou-o a ir para trás.

-Você?! – Disse Felipe espantado. – Vai trair seu próprio sangue?

Lore logo pôde ver que se tratava de William. O cavaleiro fez um movimento e foi colocando o primo contra a parede.

-Vai me matar? – Perguntou Felipe. – Não teria coragem...

Como resposta, recebeu um soco no meio da face e desmaiou. William voltou-se para Lore.

-Você está bem? – Perguntou ele estendendo a mão para ajuda-la a se erguer.

-Sim. – Ela respondeu. – O que tu fazes aqui?

-Imaginei que meu tio iria tentar algo contra ti. – Disse ele. – Acho que é melhor que você vá embora daqui imediatamente.

-Só eu? – Ela perguntou sarcástica. – Duvido que ele lhe deixe ficar aqui depois de ter me ajudado.

-Eu sei. – Também irei embora. Vou voltar para a minha família. Você pode voltar para as terras da Marquesa.

-Não acho que eu possa fazer isso. – Disse ela. – Agora seu tio irá me procurar lá.

Lore apanhou a bolsa de viagem, e os dois saíram sorrateiros por entre os corredores. Quando já estavam no último patamar, encontraram a última pessoa que queriam ver: o conde.

-Aonde pensam em ir? – Perguntou ele.

-Não lhe diz respeito. – Disse William.

-Seu menino insolente! Quando permiti que aprendesse a arte de ser um cavaleiro em minhas terras, esperava que tu se tornasse um cavaleiro de palavra, que segue seus juramentos e honra seu nome.Vejo que me enganei! Você é igual a seu pai: um tolo sentimental, disposto a morrer por uma amizade estúpida!

Nesse momento, William encarou o tio com faíscas nos olhos. Apertou o punho de sua espada e investiu a lâmina contra o tio, que se defendeu com maestria.

Os próximos ocorridos se passaram em uma fração de minutos. Logo William e o Conde duelavam ferozmente, enquanto Lore olhava embasbacada para os dois. Segurando firmemente suas adagas, ela pensou por alguns momentos no que podia fazer para ajudar William.

Viu que os dois travavam um duelo feroz e que ambos duelavam com maestria, equiparando-se. Porém, após alguns minutos, o conde finalmente desarmou seu sobrinho, fazendo um corte no pulso do rapaz.

Apontando a lâmina para o peito de William, ele sorriu malignamente.

Nesse momento, Lore agiu.

O conde estava prestes a perfurar o corpo do sobrinho com a espada, quando sentiu a fria lâmina das adagas de Lore contra seu pescoço.

-Solte a espada. – Disse ela.

Ele assim o fez.

-Vá em frente, faça aquilo que quer fazer. Mate-me. – Disse o conde.

Aquele era o momento: podia vingar-se ali, agora. Vingar a morte de seus pais, vingar o tempo em que tivera de se esconder como um animal acuado... Com um movimento, ela podia levar aquele homem a morte.

Mas então, ela soltou o pescoço dele, guardando as adagas.

-Eu não sou igual a você. – Disse ela. – É verdade que passei muito tempo esperando o dia em que mataria e vingaria tudo o que o senhor me fez passar. Mas agora que o vejo, tenho nojo de sujar minhas mãos, e pena da sua mediocridade. Por causa de seus interesses, foi capaz de tirar a vida de pessoas inocentes e de destruir sua própria família. Não, sua punição não virá da ponta de uma espada. Ela virá como um veneno lento a corroer sua alma até a insanidade completa.

O conde apenas a observou, sem prestar grande atenção à suas palavras.

Ela seguiu para o estábulo, e logo depois foi seguida por William, que agora levava sua espada e a de seu tio.

Chegaram ao estábulo e passaram algum tempo em silêncio. Ela então se voltou para seu cavalo e começou a sela-lo.

-Você sabe que ele irá atrás de você. – Disse William.

-Sim. – Disse ela.

-Agora ele irá querer vingança por você não o ter matado. – Disse ele. – Vai se considerar ofendido, talvez, ou humilhado por suas palavras.

-Eu sei. – Ela disse. – Mas não me importo mais com isso. Acho que nem sei mais se ainda resta algo da Irene em mim. Eu deixei de ser a filha do Duque de Áquila e passei a ser uma andarilha perdida nas estradas da vida. E agora é isso o que sou, Lore Lindberg, uma barda, uma viajante. Não mais Irene de Áquila, a nobre filha do Duque.

-Compreendo. – Disse ele.

-Entretanto, meu coração ainda é o mesmo e há muito tempo eu preciso partir em uma busca. – Disse ela.

-Uma busca? – Ele perguntou.

-Sim... – Disse ela. – Meu pai. Irei procura-lo. Sei que há grandes chances de que esteja morto, mas é o que o meu coração deseja.

Ele sorriu para ela, colocando as mãos sobre seus ombros.

-Então eu lhe desejo boa sorte em sua busca. – Disse.

Ela o abraçou.

-Que você também tenha sorte em sua vida, meu amigo. – Disse.

Ele também selou seu cavalo e ambos montaram.

Seguiram juntos por algum tempo na estrada, até uma bifurcação, onde ela dobrou para a esquerda.

Ele passou algum tempo parado, observando-a partir. Mal havia a conhecido e já sabia que ela era um enigma a ser decifrado, alguém buscando por respostas em meio a um mundo atribulado, uma revolução em forma humana. Sorriu para o vazio. Tinha a vaga sensação de que voltaria a encontra-la antes de deixar esse mundo.

E foi com esse sorriso que seguiu para sua casa, pelo caminho tantas vezes percorrido, mas que agora tinha um sabor inconfundível de liberdade.