O Pianinho Vermelho
Descobriu....Que o silêncio era gélido, mudo,duro...
Causava-lhe estranheza, mais não devia, pois era seu companheiro a muito tempo.
Ficou parada olhando, procurando onde se encaixar e tentando controlar o que pensava, mais o que sentia era claro para ela - Tristeza.
A luz da noite lhe cortava em pedaços e doía mais que o corte da navalha, que conhecia tão bem. O corte da noite não conseguia ver, só sentia que ia desfalecendo em sombras, as quais não conseguia identificar e isto lhe causava medo.
Olhou a cena:Ela... o caixão com seu pai.... e seus irmãos. Se olhavam e pediam em silêncio-"Deus nos ajude, termine logo com isso."
Naquele instante, buscou em sua memória algo bom para aliviar este estado de alerta. Teve receio de nada encontrar, pois a convivência com o pai havia sido repleta de sentimentos de desalento e solidão.
Fez força e uma lembrança distante veio, procurou identificar com cuidado se era verdade ou invenção de seu desespero.
Lembrou, que estava frio e devia ser bem cedo de uma manhã de natal, deveria ter aproximadamente uns 5 anos, e havia uma neblina. Estavam sentados, ela e o pai na beirado do poço, que tinha no quintal da casa, e no meio deles um pianinho vermelho que havia ganho na noite de natal. O pai gentilmente lhe ensinava como tocar e sorria. Ela sentia-se muito feliz e tentava não perder aquele momento. Olhava para o pai com atenção e disciplina, pois era como se soubesse que seria único aquele instante.
O sentimento de segurança, a fazia sentir-se tranquila e acolhida.
No velório percebeu que a vida toda corria atrás desta sensação, mais como não conseguia revive-la inventou uma outra forma de se aproximar deste sentimento.
Entendeu que era por causa daquele momento com seu pai, junto ao pianinho vermelho, que sempre levava a outras pessoas, palavras e gestos que lhe trouxessem tranquilidade e que elas se sentissem acolhidas.
Assim era seu caminho e sua escolha, com atenção e disciplina cumpria seu dever.