UMA NOITE NO HAITI *
O general jogou o quepe sobre a cama.
O cão corria pelo jardim.
Pela janela avistava-se o mar.
Fazia muito calor naquele quarto.
Na manhã seguinte haveria uma cerimônia para troca de comando.
A camareira do hotel trouxe toalhas limpas.
O general debruçou na janela e aspirou o ar da brisa marinha.
Já não sentia saudades nem deixaria saudades
Anoitecia
Podia-se ouvir ao longe o som de tambores
Negros estariam dançando. Em algum lugar uma feiticeira estaria preparando seus feitiços
O general serviu-se de uma dose de uísque. Sem gelo. A bebida aqueceu sua alma gelada.
Descalçou as botas e olhou seus pés brancos
E lembrou-se de tantas marchas feitas, mas os pés estavam descansados. A alma estava cansada e os olhos também.
Não desceria para o jantar.
Não jogaria cartas.
Caminhou até o banheiro e olhou-se no espelho
Despediu-se da imagem de um general em final de carreira
II
No saguão do hotel as pessoas se entreolhavam.
Oficiais fardados acompanharam o translado do corpo
A troca de comando foi cancelada.
Outra cerimônia ocuparia aquela manhã.
* em homenagem a Urano Bacellar, general brasileiro que comandava as forças de paz das Nações Unidas, achado morto no Haiti