Mariana à deriva
Já andando ela se recostou na janela e ficou ali observando as gotas da chuva escorrendo sobre o vido empoeirado. Não era a primeira vez que fazia essa viagem, mas como em sua memória não havia nenhum registro da primeira, esta é como se fosse.
Mariana se esqueceu como quem se esquece da infância. Se esqueceu da casa, do cheiro da comida, da cor da roupa das crianças, do cheiro do perfume do marido, Mariana se perdeu em si.
A chuva cansou de distrair aqueles olhos cansados, e o sol já inaugurava um clarão no céu, seus olhos semicerrados faziam o possível para enxergar o ponto mais distante da estrada, sem saber onde aquilo ia dar, apenas olhava e esperava.
Com a chegada ao destino o fim da estrada finalmente chegou. Ela olhava intrigada aquela fachada amarela, o telhado desgastado, a grama mal cuidada, tentando buscar em sua memória alguma vaga lembrança daquilo que lhe parecia familiar, em vão.
Não tardou e ela pôs-se a bater na porta. Uma moça cujos olhos molhados eram estranhamente iguais aos seus a recebeu com um sorriso emocionado e um abraço saudoso.
A moça a convidou para entrar, trouxe xícaras de chá e uma pequena caixa de madeira. Beberam o chá, e ficaram algum tempo em silêncio, apenas se olhando.
A moça perguntou como tinha sido a viagem, Mariana continuou em silêncio, talvez por não ter percebido a sua voz. A moça então caiu em prantos ali, na sua frente. Mariana sentiu seus olhos igualmente marejados e se juntou a ela, ambas ali derramando em lágrimas sobre o sofá.
A moça então pegou a caixinha e tirou algumas fotos lá de dentro:
- Olha aqui, mãe: Essa sou eu. Essa daqui é a senhora, de vestido vermelho.
Mariana ficou olhando aquilo, não desacretitava do que a moça dizia, mas também não podia acreditar, afinal, se aquela fosse ela, saberia. Mas mesmo não sabendo o motivo, sentia que um laço a ligava à moça. E então ficou ali, dias, semanas, meses, até o tempo que podia.
A moça que lhe chamava de mãe estava sempre ao seu dispor, passava todo o tempo ao seu lado, mesmo quando Mariana não estava presente.
Certa noite a moça acordou com o gritar de Mariana: – Luisa! Luisa!
A moça correu até seu quarto não cabendo em si de tanta felicidade, e se agarrou à mãe, que deu seu último sorriso e partiu.