"Gooool do Uruguai"

Nos idos de 1950, com meus 12 pra 13 anos, lá estava eu descendo do ônibus em plena Praça da Sé, em São Paulo, com o intuito de comprar um livro qualquer, em uma grande livraria do Centro, que ficava perto da Rua Benjamin Constant, onde meu genitor tinha seu escritório de advocacia; minha intenção era depois, na volta, passar por lá e voltarmos juntos para casa. Eu nunca havia visto tanta gente, aglomerada em grupos, todos ouvindo a irradiação, em grandes alto-falantes espalhados pela Praça e ruas adjacentes, do jogo decisivo da Copa do Mundo de Futebol, que estava se desenrolando em pleno Estádio do Maracanã, entre as seleções do Brasil e do Uruguai. Lembro-me bem do otimismo ufanista que pairava por todo o País, com a certeza de que a taça viria para as nossas mãos, mesmo porque o nosso adversário não tinha como vencer a força da seleção canarinho. Pois é, todo esse excesso de confiança do “já ganhou” foi castigado no momento em que eu ainda não tinha me afastado do ponto de ônibus – Gooool do Uruguai!!! – a mesma bomba de Hiroshima havia sido lançada no meio da Praça da Sé, no coração da Capital Paulista! Em minutos tudo se tornou um pandemônio, com brigas, impropérios, discussões acaloradas e, principalmente, muita choradeira até de homens engravatados – o Mundo havia acabado! – confesso que fiquei apavorado.

Soube-se, mais tarde, que pessoas passaram a se embebedar, outras tornaram-se violentas até com familiares, inclusive vindo a perder emprego e, o que é pior, algumas vieram a sofrer enfarte do miocárdio, mesmo em plena praça pública, tudo por causa daquele fatídico gol, que definiu o ganho da Copa para o país vizinho, em pleno Rio de Janeiro. Agora, vamos ter de rir, porque o mesmo aconteceu com eles, os vencedores, que tiveram as mesmas atitudes insanas dos brasileiros, porém para extravasar a alegria pelo “grande” acontecimento que, pelo que tudo indicou, não melhorou “nadica de nada” a qualidade de vida do povo uruguaio (com exceção dos jogadores), assim como a vida dos brasileiros também ficou na mesmice, sem tirar nem pôr. Aí vem a pergunta: _Por que toda essa demonstração de estupidez e de fanatismo idiota? Fica impossível de se entender essa incongruência, porque não tem qualquer explicação racional!

Hoje dá pra se compreender o porquê das guerras entre clubes rivais, com pancadaria, correria, depredações e mortes, porque as pessoas estão cada vez mais ignorantes, alheias aos acontecimentos à sua volta, mantendo-se cegas e surdas com relação aos sinais do pedido de socorro que a natureza está emitindo e que uma pequena minoria de sensatos e responsáveis tem se esforçado para transmitir e demonstrar. O alto valor dado a coisas, pessoas e eventos absolutamente inúteis, inócuos e infelizes, não tem cobertura por meio de argumentos racionais, razão pela qual o homem age como perfeito animal desvairado, gastando energias e tempo em negatividades autodestrutivas, tanto espiritual como material, julgando-se ainda ser uma personalidade importante para o progresso da civilização. O hilário disso é que todo mundo está à procura da felicidade para si e seus familiares, andando na contramão!

Será que ninguém está vendo que o futebol deixou de ser um esporte até para os jogadores? O profissionalismo cria mercenários e ídolos de barro, que servem de pano de fundo para o desenvolvimento de máfias manipuladoras de resultados, com fins políticos e comerciais, principalmente para a formação de quadrilhas especializadas em apostas, tudo em nível internacional. Então por que continuarmos por esse caminho infeliz de “torcer” por um clube ou uma seleção, se tudo não passa de cartas marcadas? Vejam que não há o mínimo interesse em se usar a avançada tecnologia computadorizada do século XXI para se dirimir supostos erros de arbitragem ou dúvidas de ações tendenciosas – por quê? Isso tudo só não está evidente para quem quiser continuar na alienação do “me engana que eu gosto”. Qual a razão de acharmos “gostoso” servirmos de palhaços, de massa de manobras e de supridores de uma estrutura voltada para o crime organizado, sem que isso se converta em qualquer tipo de compensação feliz ou útil para nós, os torcedores?

O meu recado está dado.

Moacyr de Lima e Silva
Enviado por Moacyr de Lima e Silva em 05/12/2009
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