Recordações de um passado esquecido

Ainda sinto o cheiro da terra molhada cheiro este que penetra em meus pensamentos deixando florescer as mais íntimas lembranças de minha juventude. Quem nunca viveu um grande amor? Triste é aquele que nunca desfaleceu de gozo nos lábios do ser amado...

Apesar de tudo que me acontecera nesses últimos cinqüenta anos não me arrependo do que fiz. Eu era uma menina tornando-se mulher, de certo que nessa época fazemos coisas as quais temos vontade sem pensarmos nas conseqüências... Sinto-me confusa... Ainda não sei se eu devo abrir as páginas de minha alma tão bem guardadas no esquecimento...

Esquecimento.

Recordei-me agora que um dia nos meus ternos cinco anos, minha mãe me levara a uma biblioteca, eu conhecia familiarmente os livros eles sempre me fascinaram. Desejava conhecer uma biblioteca e esse desejo percorria as minhas veias como sangue. Tudo era mágico! Logo na entrada viera uma moça muito bonita de cintura fina e dentes grandes e com um sinal pintado no lado esquerdo da boca, ela nos levou a sessão de livros infantis e quando ela ia nos deixar, minha mãe pedira para eu agradecer, agradeci e ela me mostrou os seus dentes e com o sorriso os achei maiores ainda.

Tudo parecia belo aos meus olhos. Olhos de criança. Os olhos das crianças são bastante curiosos e criativos quando pequena também via pessoas que não existiam, minha tia Maria dizia que eu era médium, meu pai que era católico fervoroso odiava o que a tia Maria dizia e me proibia de falar nisso enquanto a tia Maria estivesse por perto. Os olhos das crianças fazem o mundo, o seu mundo particular, com pessoas legais, amigos, eu tive muitos amigos imaginários e ainda os tenho, à noite eles vêm, geralmente quando eu estou triste, quando eu penso em me jogar do 20º andar, coloco uma música e pronto, daí em diante é só diversão eles fazem tudo para me deixar feliz. Eu acho legal ter amigos imaginários eles são os nossos desejos mais profundos, nossos instintos, sem a tal sociedade, eles fazem e nós fazemos os que eles fazem, afinal de contas estamos em nosso quarto sem ter ninguém olhando.

Passei cinco anos de minha vida indo a biblioteca só para poder ficar mais perto da moça de dentes grandes. Ela foi o meu primeiro amor! O que será que leva uma pessoa a amar a outra do mesmo sexo?

Os anos passaram e o amor pela menina da biblioteca foi diminuindo, o interesse pelos meninos estava crescendo e a curiosidade sobre o universo masculino me fez esquecer as mulheres... Ou a mulher... Na realidade a moça de dentes brancos. Como é belo o corpo masculino.

André foi o meu segundo amor ele tinha a mesma idade que eu e éramos muito amigos, com o André eu dei o meu primeiro beijo. Às vezes me vem à boca o gosto do meu primeiro beijo.

*em continuação