Travessia

A minhoca

Tentou dar uma escapulida da rotina

E saiu do torrão.

Aventurou-se no asfalto.

Para desespero dela

A pedra preta

Estava quente do sol.

E era muito grande.

A terra úmida do outro lado

Ainda estava muito longe.

E não havia fôlego

Nem umidade

Para suportar

Todo o caminho de volta.

Já era possível se ver

Algumas formigas pequeninas

Andando sobre a pobre minhoca.

Só lhe restava

Se debater.

Com isso chamou a atenção

Do bem-te-vi,

Que num vôo rasante

A apanhou.

Não,

Não era um resgate...

Pra sorte da minhoca

Outro bem-te-vi

Tentou arrancá-la

Do bico do rival.

E ela despencou lá de cima

Na terra macia e úmida.

No meio do matagal.

Agora ela já sabe

Do que tomar cuidado

Na próxima travessia.

Restabelecida

Do susto e da queda

Da primeira tentativa

De atravessar a grande pedra negra

A minhoca volta a se aventurar na travessia.

Agora ela já sabe do que se proteger

E partiu durante a madrugada

Para evitar o calor do sol

E o ataque do bem-te-vi.

Mas que luz forte seria aquela

Deslocando-se em sua direção

fazendo até tremer o chão.

Seria o sol nascendo antes da hora?

Seria um raio, um trovão?

Não,

Eram os faróis de um caminhão.

Vvrrruuummmmm!!!

Aquele Caminhão

Vinha de uma Estrada de terra

E trazia

Nos frisos dos pneus

Muita lama.

Pra sorte da minhoca

A maior parte do seu corpo

Encaixou-se em um daqueles frisos,

Cheios de lama.

E alí,

Ainda com vida

Foi transportada.

Percorreu um bom trecho do asfalto,

Até entrar em uma outra estrada de terra,

Parando um pouco adiante,

Próximo a um estábulo.

Aquele lugar,

Onde a minhoca desembarcou

Era o Paraíso.

E lá ela passou a viver.

E com o seu dom de regeneração,

Recompôs o pedacinho do seu corpo

Que havia perdido na viagem.

E foi feliz...