Sobre Vampiros

Antes eram poucos. Não andavam juntos, havendo algumas raras exceções, algumas tribos nos círculos polares, no norte da Austrália, nas estepes russas e mongóis... a maioria, como muitos animais selvagens, somente saía à noite, para caçar, e entocava-se em esconderijos escuros, quando o sol surgia. Antigamente eram tidos como sobrenaturais – em algumas tradições considerados deuses, em outras, demônios – tentavam combatê-los com cruzes, água benta, alho, estacas de madeira, ou de prata maciça.

Após o século XIX, chamado o “século das luzes”, não eram mais tão lembrados. No século seguinte, só passaram a existir nos filmes, histórias em quadrinhos e desenhos animados. Os vampiros já não eram mais tão poucos. As raças consideradas tradicionais já não mais respondiam pela maior parte deles.

Sim, há mais de uma raça de vampiros, os que se alimentam de sangue e fogem da luz solar não são a única. Essa é, talvez, a mais antiga raça de que se tem notícia, mas definitivamente, não é a única. Esses são chamados notívagos, ou noturnos, alimentam-se de sangue, humano, ou de outros mamíferos – há uma tribo de notívagos, no norte da Groenlândia e extremo norte do Canadá, que alimenta-se de sangue de baleias – a luz solar lhes é altamente nociva, então devem esconder-se durante o dia. É a única raça que dorme, não como nos filmes, dentro de caixões, ou qualquer coisa assim, os notívagos hibernam de tempos em tempos, como ursos, moscas e outros animais hibernantes.

Há vampiros sugadores de sangue que não precisam esconder-se da luz do sol. Sua forma de alimentar-se é a mesma dos notívagos, mas não precisam restringir seu dia para depois do sol se pôr, fazendo isso por simples vontade própria. Não precisam hibernar, mas têm momentos de desligamento, semelhantes a apagões – raros, na verdade. Convencionou-se chamar essa raça, que é a de Evangelina, e os irmãos Dave, Edmonton (Eddie), (Jesse) James e Joseph (Joe) McCulling, por exemplo, como sanguessugas. Não se sabe ao certo, mas pode ter sido uma mutação, ou evolução, dos notívagos que teria originado os sanguessugas.

A princípio, os vampiros de energia sexual, incubus – os do sexo masculino – e succubus – os de sexo feminino, não eram considerados uma raça vampira, e sim demônios sexuais. Na verdade, os incubus/succubus são efetivamente vampiros sexuais, alimentam-se dos fluídos e energias dessa ordem.

Gabriel Youth, Ching Hong e os membros da Galera da Noite Preta, Boi da Estrela, Ticado, Braddock e Selminho são vampiros de uma raça, denominada parasita. São pessoas que antes de se tornarem vampirizadas, abusaram de entorpecentes e drogas, que agora não mais sentem sono, fome, nem sede, mas ainda são dependentes, e para saciar sua dependência, têm de conectar-se psiquicamente a outras pessoas, que consumam e/ou sejam dependentes químicas, daí vem o termo parasitar, e parasita.

Os notívagos e sanguessugas podem vampirizar humanos normais, através das mordidas, pelas quais uma espécie de vírus lhes passa a “doença”, os incubus/succubus podem vampirizar pelas energias sexuais, os parasitas, por sua vez, são a única raça que não pode vampirizar, nem é vampirizada – ao menos diretamente.

Há outras raças, ou evoluções, os destruidores de corações, os ladrões de energia, e os “dorian gray”, raça essa cuja referência é um romance de um escritor britânico, Oscar Wilde, sobre um homem que nunca envelhecia, no caso, essa raça envelhece, como nós, e pode tornar-se mortal, mas ao sugar o sangue, ou a energia de pessoas jovens, têm suas células renovadas, e ganham mais um tempo de vida.

Até os anos 1800, algumas dessas raças ainda não existiam, e a população vampira não era mais que algumas centenas. Após as duas Grandes Guerras mundiais, a população havia ultrapassado os 5 mil indivíduos. Agora, nos anos 2000, quando a população total terrestre ultrapassou os 6 bilhões, a população de vampiros saltou, a partir dos anos 1950, para mais de 6 milhões.

Antes à noite era mais fácil vampiros andarem livremente, buscar a escuridão para esconderem-se era preciso. Agora, o melhor esconderijo é à luz do sol e à vista de todos, misturando-se às pessoas. Alguns querem revelar-se, outros temem serem caçados, ou perseguidos, se isso acontecer.

Alguns ainda querem algo além de revelarem sua existência ao mundo. Algo bem maior. E outros ainda sequer perceberam a situação que se desenha para o futuro. Gabriel Youth nunca se preocupou em aparecer, desde que tornou-se vampiro, e há anos também não se importava se um dia viessem a descobrir. No momento, aliás, Gabriel estava lembrando a visão que tivera, enquanto fazia tai shi na beira da praia, ao nascer do sol, pensava se teria sido a filha adotiva mesmo a comunicar-se com ele, ou talvez a voz de sua própria consciência. Mas agora aparentemente ele não precisava procurar mais pelos assassinos de Ling Ly, eles inadvertidamente pareciam ter vindo até Gabriel... que não os encontrara nos últimos dias após o quarto crime cometido, nos mesmos moldes do cometido contra sua filha. Mas esperava que eles cometessem algum deslize, que ainda estivessem em Floripa, pois em 1932 eles sumiram sem deixar pistas. Gabriel queria se convencer que não era vingança, que as mortes daquelas quatro meninas também o haviam indignado e aviltado, quase tanto quanto a morte de Ling Ly...

Gabriel estava caminhando pelo centro histórico agora, e estacou de repente, no meio da praça da figueira, pensando. Realmente, tinha sentido algo quanto às mortes daquelas garotas. Não como se os McCulling soubessem que houvesse fixado residência ali, em Florianópolis, mas sim como se a gente daquela cidade, suas vidas... de alguma forma, fosse responsabilidade dele proteger suas vidas! Sentiu-se um pouco abalado, desde 1974, quando ali chegara, nunca havia tido esse sentimento. Mesmo durante a guerra, nunca sentiu como se estivesse lutando por sua cidade natal, pensava estar lutando por seu país. Pareceu ter estacado por horas, mas pouco menos de um minuto depois voltou a caminhar, observando as pessoas... menos uma, a quem pareceu familiar. A bela moça de pele clara, olhos e cabelos castanhos, lisos e compridos até as costas não esperava ser solenemente ignorada daquela forma e nem passou por sua cabeça que Gabriel não tivesse efetivamente percebido sua presença. Observou-o por mais uns momentos, não pensava que ele pudesse vestir-se tão mal: uma camisa sem mangas branca e vermelha com um boi zebu e índios numa floresta... calça jeans e os famigerados “sapatenis” que todos os homens usam hoje em dia... mas parecia ter adquirido a bela forma dos homens dos anos 2000, braços de quem levanta peso, abdome liso, etc. Pensou em abordá-lo, mas mudou de idéia, iria procurá-lo em outro momento, talvez ele andasse bastante por ali. Tinha certeza de que não seria ignorada daquela forma, da próxima vez!

Ayrton Mortimer
Enviado por Ayrton Mortimer em 28/10/2009
Reeditado em 30/10/2009
Código do texto: T1892400
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