A VELHA PISADEIRA - 22/10/2009 - LIA DE SÁ LEITÃO
( Em correção)
Ofereço essa historinha para uma pessoinha linda, amada e comilona, nascida em Anay, Paraná. vive prometendo uma dieta e quando pego de vero vero no pé, ou seja no garfo, ela inventa uma desculpa, me bota no bolso e continua bolinha.
Há muitos anos atrás acontecia algo muito estranho no Estado do Paraná, o episódio se repetia desde as crianças até o Padre, do Juiz até o Delegado, o médico enlouquecia sem saber qual o procedimento tomar quando a fila dobrava a esquina com as mães levando seus filhinhos para o posto de Saúde.
Tudo acontecia em Anay, uma cidadezinha agradabelíssima até parece um condomínio fechado, todos se conhecem. Um dia entrei em Anay para desvendar aquele mistério da Velha Pisadeira.
Estacionei o carro em frente a Praça da Matriz, tirei umas fotos interessantes daquela construção, não interessava o princípio básico da colonização mas sabia que não era tradicionalmente o estilo português.que eu tanto conhecia no Nordeste.
Tenho uma teoria, só se pode escrever sobre alguma cidade, seja lenda ou mito quando se analisa três fontes: arquitetura e urbanismo da cidade, a Igreja Matriz e o cemitério. Pois bem, não quero divagar com minhas teorias porque vôo alto, chego a analisar até as telhas dos sobrados mais antigos.
A Velha Pisadeira adora caminhar por cima dos telhados ainda não cheguei a explicar quem é essa horrenda senhora e muito menos os costumes assombrosos dela, daqui a uns parágrafos abaixo o leitor terá ciência sobre a tal mulher.
Voltando as fotografias da Matriz, passava um e outro, olhava a cena estranha, carro de fora, povo desconhecido, todos olhavam com ar desconfiado, e eu sentia um questionamento queimando as minhas orelhas, quem é aquela mulher com ares diferentes? As crianças ainda chegavam mais perto, eu ria para uma e outra mas ninguém retribuía o sorriso, apenas olhavam.
Finalmente o Padre saiu delicadamente pela porta lateral e caminhou até o local em que eu estava, manteve um breve diálogo, e eu disse; Padre estou em busca de uma lenda perdida há anos, andei pesquisando em Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo e grata foi a surpresa de uma fonte informativa assegurar que essa lenda da Pisadeira tem influência e social e cultural aqui nessa cidade, não tutubeei, vim numa só velocidade para cá.
O homem riu e delicadamente convidou-me a pousar uns momentos em sua casa, aceitei, sentamo-nos à varanda e ouvi tesouros da literatura oral, cada minuto mais apaixonada pela cultura dessa terra fria e bela, o celeiro do Brasil, o Paraná.
Ouvi histórias de pescadores do Rio Piquiri, sobre um porto ali perto, os nadadores de lado a lado, os índios, céus! Eu estava abarrotada de deliciosas histórias e também das compotas de doces de figo que uma amiga do Padre ofereceu, mas toda aquela riqueza ainda não era a Pisadeira.
Tomei um minuto das narrativas do amigo, mas, Padre e a velha Pisadeira? Percebi um certo pavor, ele passou a mão na barriga estufada de tantas guloseimas e desviou mais uma vez o assunto.
A essa altura estavam ali alguns homens e cada um contava a história mais eferverscente já vivida, mas, não era o que eu queria.
Eu tinha atravessado o Brasil em busca da Velha Pisadeira quase esqecida no imaginário popular e ninguém ali tocava na história, já estava quase desisitindo quando um piá, piá aqui no Paraná são os meninos, guris.
O piá puxou minha blusa e afirmou, eu vi a tal Velha Pisadeira, ela é feia, tem queixo de Lua virado pra cima. Mas, a exaustão de tantas falas deixou-me meio atabalhoada e não prestei total atenção ao loirinho de olhos azuis sentado ao meu lado. O menino voltou a insistir, eu vi a velha Pisadeira, ela tem as pernas finas e curtas, mas não é anã. Nesse momento alguém desviou a minha atenção e eu só segurei no braço da criança como quem diz, calma piá, deixa esse pessoal se livrar das experiências que ouço só você.
A tarde avançava.
O doce de figo nem tinha mais sabor na boca.
Estavam todos mais alegre, o papo mais caloroso com um churrasco improvisado, vinho colonial e uma cerveja especial para os adultos.
O piá sentou-se ao meu lado e falou em voz sumida, Professora eu conheço a Velha Pisadeira. Pedi licença aos adultos e sai com o menino para um pátio.
E assim a Velha Pisadeira tornou-se ainda mais curiosa porque ele falava em meio tom, como se fosse assustar ou despertar a assombração.
A Velha Pisadeira é horrível e malvada, disse-me ele com os olhos bem abertos, até parece a bruxa da históriha de João e Maria.
Ela vive caminhando em cima dos telhados, sempre com chi chi chinelos barulhentos, as casas que não possuem lages são as mais visadas pela medonhenta que aparece nas madrugadas frias da região.
A Velha Pisadeira é uma mulher magra e de pele amarelada, olhos vermelhos como brasas e as unhas longas e sujas tanto as das mãos quanto as dos pés que ultrapassam até a frente das chinelas, um nojo!.
Os cabelos da Velha Pisadeira são brancos e sempre assanhados. O rosto da Velha Pisadeira é todo enrrugado e com sinais de verrugas, quem vê, jamais esquece!
Os cabelos desgrenhados realçam o nariz de papagaio com uma verruga na ponta, a boca cheia de dentes pontiagudos e verdes que na noite piscam como se fossem pirilampos, não é fofoca, é um alerta! As orelhas da Velha parecem mais com as de um vampiro, são assustadoras.
Na verdade, tudo começou por causa das avós paranaenses que cuidam em alimentar as crianças com muita iguaria antes do anoitecer e sempre deixam as crianças comerem mais que a barriga agüenta para depois dormir.
A Velha Pisadeira está sempre alerta em seus vários esconderijos pelos telhados pronta para pular nas barriguinhas mais estufadas com saborosas comidas como:polenta, quirelinha, broa de milho e nata feita do leite de Mimosa. Salame e queijo colonial, bolo de milho e leite quente, sem contar o viradinho de feijão com couve em tirinhas.
As crianças mais comilonas devem ter cuidado depois do jantar, pois é o horário que a Velha Pisadeira pula do telhado da casa e cai direto na barriga do comilão, pulando, pisando e sentando na barriga daquele que está estufado com muita comida.
A Velha Pisadeira não perdoa aquele que vai dormir com o estômago cheio de guloseimas e de barriga para cima, quando encontra uma vítima, ela faz o maior salseiro, inventa sonhos perigosos, pesadelos e dá uma gargalhada assombrosa, daquelas que só as entidades do mal conhecem, segura com as mãos cadavéricas o pescoço do pançudo e pimba! A vítima fica sem ar, e a barriga fica fazendo blublublu como se algo estivesse revirando os intestinos.
A vítima fica sem ação, começa a crise de vômitos, dores de barriga e desmaios, um verdadeiro horror!
As malvadezas que a Velha Pisadeira faz com a pessoa não poupam a saúde nem os socorros médicos.
A melhor coisa que existe é comer o necessário sem extrapolar na alimentação antes de dormir.