AS DELICIAS DE UM POUCO D'ÁGUA

Esta imensa campina que se estende pelos horizontes, é o sertão nordestino Nesta época de julho, a terra parece ter sido queimada por fogo imenso, que devorou e consumiu toda a verdura que lá existia.

O sertanejo anda melancólico, olha para o céu em prece , murmurando algo. Nada de chuva!

Pela vasta planura que se estende a perder de vista, erguem-se troncos ermos e nus, deixando à mostra o vasto ossuário da antiga floresta.

O capim que outrora cobria a superfície da terra verde, não existe mais, comido até a raiz pelo dente faminto de algum animal, ficando reduzido a uma cinza espessa, que é levada pelo mínimo vento.

Novamente o sertanejo levanta os olhos para o céu. Não vê senão o sol ardentíssimo, que deixa a terra abrasada e envolve através do seu mormaço, um ou outro esqueleto ossadas do gado, que não aguentou.

A seca fora rigorosa. Dos rios, não se percebe senão os estanques que mostram vestígios de água, que lá tinha corrido.

O único verde ainda, que mostra as face, é o das carnaúbas, mesmo quando não cai uma gota de orvalho. É o símbolo destes sertões.

O sertanejo parado agora, pensativo e cansado, observa a vasta queimada e leva à boca o seu canil com água, e, certamente sente o quanto é precioso esse líquido que a natureza nos deu e que, nem sempre sabemos lhe dar o devido valor.

Assim, abandonado à própria sorte, o sertanejo preocupando com sua família pensa em abandonar sua terrinha, conseguida com tanto sacrifício, e, levar sua família para um outro local. Para onde? Para a capital? Para o sul do país? No entanto, seu coração dói. Está acostumado com a roça , com seus amigos, com seus costumes. Em outro lugar será um intruso, um estranho , um migrante.

O jeito é esperar que um milagre aconteça do “Padre Cícero”, do Nosso Senhor ou da Nossa Senhora Aparecida. E na sua simplicidade não sabe que, poderia ser ajudado por direito, como cidadão de um grande país.

A devastação incessante das florestas, que deu lugar ao plantio da cana-de-açúcar, ou para dar pastagem ao gado, foi acompanhada de grande erosão que levou o solo, as plantas, o verde, trazendo a caatinga, o deserto, simplesmente por culpa do próprio homem.

Tentar reflorestar o sertão, cavar poços artesianos, ou suar a tecnologia necessária poderia ser tentado pelos homens dirigentes do país. No entanto, não há interesse. E o sertanejo continuará a olhar esta imensa campina triste e seca a procura de um “milagre”. Até quando?...

Olhando, distraidamente pegou seu cantil e bebeu sua última gota d’água.

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Obs.:

Redação realizada a partir de uma frase que é o título "As delícias de um pouco d'água', durante o 2º Grau, na aula de Português; Jundiaí,SP

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Prêmio : ‘Destaque Especial’ do VI Concurso Nacional de Contos – 1993 – Revista Brasília.

Publicação:

KALMAN, Regina Dragiça - “As delícias de um Pouco d’Água’ in

“Contos do Brasil Contemporâneo”, Ed. Grupo Brasília de Brasília,

Brasília, 1993, Vol. XVI, p. 21.